Economia

Aos poucos, a camisaria Dudalina se despede de Santa Catarina

Enquanto reformula o negócio da camisaria, a Restoque, dona da marca, procura comprador para a maior unidade da empresa, por R$ 28,5 milhões. O fechamento sacrifica Blumenau

Paula Pacheco/Estado de Minas
postado em 01/02/2018 06:00

Política da Restoque é reduzir o número de lojas do grupo, entre elas as da Dudalina, e aumentar sua rentabilidade


São Paulo ; O vínculo entre a Dudalina e seu estado de origem, Santa Catarina, está com os dias contados. O principal prédio da fabricante de camisas, de Blumenau, foi colocado à venda no mês passado. O valor pedido pelas instalações é de R$ 28,5 milhões. Por enquanto, segundo uma das corretoras da Orbi Imóveis, responsável pela comercialização, apenas uma pessoa se interessou por visitar as instalações, às margens da BR-470. O visitante, que ainda não agendou o dia para conhecer o local, deve chegar de helicóptero, conta a corretora Adriana Salmento.


Era nesse endereço que funcionavam as áreas administrativa, de criação e desenvolvimento e de distribuição da Dudalina. A empresa foi comprada em dezembro de 2013 por duas gestoras de fundos americanos, a Advent e a Warbug Pincus (WP), por valor estimado à época de cerca de R$ 800 milhões. Em outubro de 2014, foi a vez de a Restoque, dona de marcas como John John e Le Lis Blanc, adquirir o controle da fabricante de camisas, fundada em maio de 1957 pelo casal Adelina Clara Hess de Souza e Rodolfo Francisco de Souza Filho.

Em 2017, a direção da Restoque decidiu reduzir a operação da Dudalina em Santa Catarina, berço da marca, e iniciar a transferência de parte das atividades para Goiás. Em meados do ano passado, foram fechadas duas unidades de produção, em Benedito Novo e Presidente Getúlio. Mais tarde, foi a vez do fechamento da unidade de Blumenau, que agora está à venda. Ainda estão em funcionamento a Fábrica 54, também em Blumenau, a de Luís Alves (SC) e de Terra Boa (PR).

Em setembro de 2016, o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), se encontrou com o então presidente da Restoque, Paulo José Marques Soares, quando foi anunciado que seriam investidos R$ 3 milhões na implantação de um centro de distribuição em Aparecida de Goiânia. Numa segunda etapa, seria construída uma fábrica.

A corretora Adriana Salmento lembra o impacto sentido na cidade quando a Restoque começou a desativar suas operações em Blumenau. ;Na época, comercializávamos imóveis do programa Minha Casa Minha Vida (de subsídio do governo federal às moradias populares). Da noite para o dia, alguns funcionários da Dudalina tiveram de suspender o processo de compra porque foram demitidos. Foi muito triste aquela situação;, conta. Naquela ocasião, foram cortados cerca de 430 funcionários.

;Os salários pagos pela Dudalina não eram os mais altos, mas o clima na empresa sempre foi muito bom. Hoje, os trabalhadores da Fábrica 54 estão muito angustiados, apreensivos, com medo de as portas fecharem de uma hora para outra;, diz Júlio José Rodrigues, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias do Vestuário de Blumenau (Sindivest).

O sindicalista se recorda de que, à época dos cortes de pessoal da unidade instalada na BR-470, houve a intervenção da Procuradoria do Trabalho, que caracterizou demissão em massa. Ficou decidido pela Justiça que a empresa teria de pagar multa de dois salários adicionais a cada um dos cerca de 100 funcionários desligados daquela divisão, o que teria totalizado adicional estimado em cerca de R$ 1 milhão aos custos com a rescisão.

Para o diretor executivo do Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário de Blumenau (Sintex), Renato Valim, o maior impacto com o encerramento paulatino das operações da Dudalina na região é emocional. ;Os funcionários da empresa representam parcela muito pequena da nossa base de trabalhadores na região, que engloba 18 municípios do Vale do Itajaí. Certamente, eles foram absorvidos por outras empresas. Mas é claro que existe um reflexo na queda de arrecadação do município. Sem contar a tristeza por ser uma marca tão tradicional, que era um orgulho para a região;, afirma.

Casa em ordem


Agora, além de se desfazer de ativos, a Restoque tenta encontrar rumo para sua marca de camisas. Em dezembro do ano passado, durante reunião da direção da empresa e dos acionistas, ficou decidido que a Dudalina deixará de existir como uma empresa, ou seja, ficará apenas a marca. Por meio de uma reestruturação societária, conduzida pela consultoria Apsis Consultoria e Avaliações, do Rio de Janeiro, será levantado o patrimônio líquido contábil da Dudalina para que seus bens, direitos e obrigações sejam absorvidos pela Restoque, que já detém 100% do capital social da marca de camisas. Se a unificação for efetivada, a companhia pretende ;racionalizar operações, otimizar a administração e minimizar despesas mediante economia de escala;. É uma forma também de reduzir os custos para manter duas estruturas societárias, além da possibilidade de obter ganhos fiscais.

Paralelamente a essa manobra para incorporar a Dudalina, a Restoque vem colocando em prática, no último ano, uma política de enxugamento da rede de lojas do grupo. Segundo balanço do terceiro trimestre de 2017, a companhia reduziu o número de pontos de 327 ao fim de 2016 para 293 em setembro do ano passado. O objetivo, segundo a empresa, é ;conferir maior eficiência ao varejo, com foco em maior produtividade da base existente de lojas, no ganho de rentabilidade e na geração de caixa;, informou em comunicado emitido ao mercado.

Com esse plano, a Restoque conseguiu aumento de 18,6% da produtividade por metro quadrado da companhia no terceiro trimestre de 2017 e de 25,9% no acumulado nos nove primeiros meses do ano. Em outras palavras, o objetivo é aumentar a rentabilidade das lojas instaladas. A Restoque foi procurada pela reportagem, mas informou, por meio da assessoria de imprensa, que não comentaria a situação. Sônia Hess, última presidente da Dudalina antes da venda da empresa e uma dos 16 filhos dos fundadores, preferiu não comentar o assunto.


  • Quem é
    Raios X da Restoque

    Marcas que detém
    ; Dudalina
    ; Bo.Bô
    ; Rosa Chá
    ; John John
    ; Le Lis Blanc
    ; Individual
    ; Base Jeans

    Faturamento
    R$ 408,3 milhões*

    Faturamento bruto da Dudalina
    R$ 108,3 milhões*

    Os destaques

    • 9,5%
      Foi o aumento do faturamento da marca
      Dudalina no terceiro trimestre de 2017,
      frente a igual período do ano anterior

    • 10,4%
      É quanto da Restoque reduziu
      seu número de lojas de janeiro
      a setembro de 2017

    • 13,2%
      Evolução das vendas da Dudalina
      entre o terceiro trimestre de 2017
      e o mesmo período de de 2016


    Os sócios (Restoque)

    • Marcelo Faria de Lima (sócio da Artesia)
      24,2%


    • Marcio da Rocha Camargo (sócio da Artesia)
      24%


    • Fundos sob gestão da Warbug Pincus
      23,9%

    • Fundos sob gestão da Advent International
      23,7%

    • Outros
      4,1%

    Fonte: Site da empresa
    (*) Cifra referente ao terceiro trimestre de 2017

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