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Adoção de conteúdo digital em escola preocupa pais

Transição para a tecnologia é um processo demorado e exige participação de todos os envolvidos. Confira dicas sobre como avaliar a metodologia

postado em 28/01/2014 20:34
Em meio à tendência de adoção de tablets em sala de aula, muitos pais se mostram inseguros com o uso de equipamentos eletrônicos e material digital nas escolas. As críticas vão desde a qualidade do conteúdo e a dificuldade para comprar e baixar os livros on-line até o custo do material. Na última semana, pais de alunos do colégio Sigma reclamaram do acesso ao material didático digital adotado pela escola. Quem tentou comprá-lo na primeira semana de aula enfrentou problemas e demorou até três dias para receber a senha de acesso. De acordo com o colégio, o download estava disponível desde 16 de dezembro, mas o sistema ficou sobrecarregado quando muitas pessoas tentaram fazer o processo nos mesmos dias ; 22 e 23 de janeiro. Apesar de o problema técnico já ter sido resolvido, ele deu início a um debate mais amplo e que evidencia preocupações dos pais.

O empresário Luiz Cláudio Mesquita, 51 anos, comprou os livros no início da primeira semana de aula e não recebeu o e-mail com o login e a senha para baixar o conteúdo no tablet. Em função do problema, demorou três dias para receber o material. A filha dele cursa o 3; ano do ensino médio no colégio e se adaptou bem aos tablets em sala de aula. Mesmo assim, ele acredita que o uso da tecnologia poderia ser aperfeiçoado e que o debate com a escola deve ser mais profundo. ;Acho que vale discutir a verdadeira modernização do ensino com o uso de tablet. Na minha opinião, o uso do equipamento com o livro digitalizado não moderniza nada. Para mim, seria modernização se minha filha pudesse, por meio desse dispositivo, compartilhar conhecimentos com alunos de outras escolas ou do Sigma pela internet;, exemplifica Mesquita. Ele acredita que esse deve ser o centro da discussão, e não eventuais problemas de download do material didático. ;É uma boa oportunidade de pais, alunos e escolas conversarem e buscarem um caminho melhor, e não um confronto de pais e escola;, destaca.

De acordo com o colégio, o download do conteúdo foi disponibilizado no site da Editora Geração Digital desde 16 de dezembro do ano passado, quando todo o conteúdo do 1; e 2; anos do ensino médio e do primeiro período do 3; ano foram liberados. O professor Eli Carlos Gonçalves, que participa do núcleo de produção da editora, explica que as aulas começaram em 20 de janeiro e, entre os dias 22 e 23, o número de acessos ao portal para fazer o download foi muito grande, o que sobrecarregou o sistema. Por isso, alguns pais tiveram dificuldade para acessar e comprar o material. Segundo ele, quase 100% dos alunos do 1; ano e mais de 80% dos estudantes do 2; e 3; anos já adquiriram o conteúdo. Gonçalves afirma que os professores, apesar de darem aula normalmente, não utilizarão o material nas duas primeiras semanas, portanto, o aluno que ainda não teve acesso ao conteúdo, não deverá ser prejudicado.

O professor diz ainda que a editora está aberta às opiniões dos pais e que são feitas reuniões com os alunos para ouvir críticas e sugestões. ;Estamos extremamente receptivos;, diz. Gonçalves destaca que o conteúdo é aprimorado constantemente e que o compartilhamento de informações entre os estudantes é feito em sala de aula. ;A construção do conhecimento compartilhado não precisa necessariamente ter relação com o material didático. É a metodologia que diz respeito a cada professor.;

Custo
A principal reclamação do servidor público José Nilton de Souza Vieira, 43 anos, pai de uma aluna do 3; ano, é a respeito do custo da adoção do material digital e dos tablets. ;Nosso primeiro problema foi que, quando a escola fez a adoção do tablet, não deu uma noção de quanto custaria o livro digital em relação ao convencional;, relata. Ele afirma que gastou entre R$ 1,5 mil e R$ 1,6 mil com os livros impressos dos três anos do ensino médio do filho mais velho, e que, hoje, desembolsa cerca de R$ 1,1 mil por ano com o material digital da filha, que participou da primeira turma a adotar os tablets. O Sigma informou, no entanto, que o preço do conteúdo digital é de R$ 1.155,72, enquanto o valor dos livros impressos do 9; ano do ensino fundamental, por exemplo, é de R$ 1.210,61.

Na opinião do pai, é natural que a adaptação às novas tecnologias seja um processo demorado, mas Vieira acredita que o custo financeiro foi mais alto do que deveria. ;Evoluiu menos rapidamente do que esperávamos e, no meu caso, provavelmente não usufruiremos do benefício do uso da tecnologia na sala de aula. Já que a turma da minha filha é pioneira, eu queria que não fosse tão oneroso;, detalha.

A diretora pedagógica do Sigma, Marli Pinheiro, explica que o colégio fez a transição do conteúdo impresso para o digital em 2012, com a turma do 1; ano do ensino médio. Antes disso, os próprios professores do colégio desenvolveram, durante mais de dois anos, o material didático adotado pela instituição hoje. Segundo ela, o conteúdo é interativo ; traz vídeos, imagens, músicas e ilustrações animadas ; e tem atualizações constantes. Marli diz que os alunos também opinam no processo e alguns estão ajudando a produzir parte do conteúdo da disciplina de espanhol. Além disso, como os próprios professores desenvolveram o conteúdo, temas ligados ao Distrito Federal, como a vegetação do Cerrado, têm mais destaque do que em materiais didáticos impressos. ;Nós vimos que poderíamos possibilitar ao nosso aluno o uso de um material que faz parte do dia a dia dele, que é o tablet, com um conteúdo adaptado para a realidade e as necessidades de Brasília. É um material interativo e que passa por atualizações. Percebemos o aumento do interesse e da motivação dos estudantes;, relata.

Tendência
Dilermando Piva Jr., autor do livro Sala de aula digital (Saraiva; 152 páginas; R$ 34,90), explica que a adoção de tablets é um processo natural, como foram vários outros na história da educação ; da oralidade para a escrita na Grécia Antiga, do livro para o vídeo e, finalmente, para o computador. ;Mas todas essas tecnologias potencializaram o processo sem esquecer as anteriores;, lembra. Com os tablets não deve ser diferente, e o primeiro passo é a preparação dos docentes para essa nova forma de ensinar.

;Os professores devem perceber que não se trata apenas de modismo, e, sim, de uma nova ferramenta;, observa o autor. ;E a mudança mais importante é entender que a posição dele de ;centro das atenções; ou de ;centro do conhecimento; muda ou é deslocada para ;facilitador do processo de aprendizagem;. Ele vai ajudar os estudantes nesse processo;, completa. Pesquisa divulgada em 2013 pelo Pew Research Center, dos Estados Unidos, entrevistou 2.462 professores e mostrou que 67% deles acreditam que a internet tem grande impacto na habilidade de interagir com os pais e 57% dizem que ela tem o mesmo impacto para melhorar a interação com os estudantes.

Para que os pais consigam avaliar se o método utilizado nas escolas vai ajudar na formação dos filhos, o especialista sugere que eles acessem o conteúdo e façam uma análise, de maneira a ter certeza que não é apenas uma reprodução dos livros impressos. A inclusão de conteúdos em múltiplas mídias ; escrita, vídeo, animações, podcasts, etc ; é um sinal positivo. ;Dessa forma, a mensagem chega por diversos canais. Isso, por si só, já potencializa o processo de aprendizagem;, afirma. ;Além disso, as novas tecnologias estão sendo utilizadas para motivar a capacidade dos estudantes para resolução de problemas e tomada de decisão, na melhoria da comunicação e na disposição para o trabalho colaborativo;, acrescenta.

Segundo ele, há outra forte tendência na educação além da utilização de tablets em sala de aula, que é a coleta de dados sobre os estudantes por meio da utilização que ele faz dos conteúdos digitais. ;Com base nas informações coletadas e num histórico (por estudante), consegue-se intervir no processo de forma mais efetiva, e em tempo de proceder uma recuperação ao longo do semestre ou ano letivo. O professor não precisa esperar o resultado da prova para verificar o desempenho dos estudantes.;

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