postado em 07/10/2015 12:17
Com os atuais investimentos na educação, o governo condena o cumprimento de metas do Plano Nacional de Educação (PNE), mesmo nove anos antes de 2024, prazo para se atingir os objetivos. A conclusão consta no Mapa do Ensino Superior no Brasil, realizado pelo Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior (Semesp). O estudo será apresentado hoje (7), na Comissão de Educação do Senado, e pretende ajudar na formulação de políticas públicas para o setor. O Correio teve acesso ao documento com exclusividade.A previsão negativa ocorre ao se analisar a meta 12 do PNE, que tem como alvo matricular, até 2024, 33% dos brasileiros entre 18 e 24 anos no ensino superior. Hoje, o índice alcança apenas 16%. De acordo com cálculos do Semesp, após os cortes de verbas sofridos pela educação no arrocho fiscal do governo, o objetivo seria alcançado apenas em 2034. ;Nos últimos três anos, com investimentos a todo vapor, tivemos crescimento de 1,5 pontos percentuais por ano. Era o caminho certo. Hoje, é completamente impossível bater as metas estipuladas;, afirmou Rodrigo Capelato, diretor executivo do Semesp.
O problema é como voltar aos trilhos e atingir a sonhada meta 12. Representante das instituições de ensino particulares, Capelato não tem dúvidas: ;A melhor ferramenta é o Fies, o financiamento estudantil;. O lobby faz sentido. Apenas em 2014, o governo injetou R$ 13,75 bilhões nas faculdades privadas por meio do programa, montante que financia 44% das vagas do setor.
Para Capelato, o investimento se justifica porque o setor privado é a rápida opção para se universalizar o estudo no Brasil. ;O Fies mostrou à classe C o caminho do ensino superior. É a única opção para os menos favorecidos que não têm condição de enfrentrar o vestibular que privilegia as elites;, declarou. Desde 2010, 80% dos alunos que firmaram contratos com o Fies tinham renda de até 1,5 salário mínimo.
Além disso, o diretor do Semesp avalia que o financiamento do setor privado se mostra alternativa mais barata para os cofres públicos, por não se dedicar a pesquisas e programas de doutorado, iniciativas com exigência de maior investimento. ;A universidade pública no modelo atual é cara e lenta, se gasta muito para manter acesso a poucos. A faculdade particular não tem obrigação de fazer pesquisa, nem de corpo docente em tempo integral. Fica um modelo mais barato;, finaliza Capelato.
Segundo o Ministério da Educação, os números apresentado pelo estudo são divergentes. A pasta informou que, atualmente, o Brasil tem 20,6% dos jovens entre 18 e 24 anos cursando ou que já concluíram o ensino superior, ou seja, foram atendidos na idade correta. O órgão reforçou ainda que tem políticas efetivas para garantir que as metas propostas para a educação superior no Plano Nacional de Educação sejam atendidas, como o fortalecimento de programas como o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), o Programa Universidade para Todos (Prouni), o Financiamento Estudantil (Fies) e interiorização das universidades.
Ainda segundo a pasta, somente em 2015, por exemplo, o ministério garantiu mais de 900 mil novas oportunidades na educação superior, com crescimento de 85,5% nas matrículas, passando de 3,9 milhões, em 2003, para 7,3 milhões, em 2013, de acordo com dados do Censo da Educação Superior.
Terceira via
Especialistas concordam em parte com a visão do Semesp. Segundo eles, o sistema de universidades públicas no Brasil é caro e deveria se modernizar, mas isso não justifica os maciços investimentos do governo no setor privado. A alternativa seria manter universidades para pesquisas que demandam tempo e dinheiro, mas também trazer o modelo das faculdades particulares, cursos de menor duração, com mais alunos em sala. E sem exigência de tantos laboratórios e pesquisas de ponta.
;Até agora, os governos tendem a financiar o ensino privado porque é muito mais barato. A solução é trazer o modelo de gestão das empresas particulares. Formar também profissionais voltados para o mercado de trabalho, e não só para a pesquisa. Manter as duas frentes;, sugeriu Leandro Mendes, professor da faculdade de educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Para Mendes, o financiamento do ensino superior privado pode ser útil. Mas há necessidade de reduzir o investimento, para a áreas estratégicas para o governo. ;Temos alta demanda por engenheiros hoje, mas pode ser sazonal e depois não precisarmos tanto. Financia as estruturas do setor privado já existentes, e evita de construir prédios para o setor público que ficariam inutilizados depois que a demanda acabasse;, sugere.
Com ou sem aumento do Fies para a iniciativa privada, como pretende o Semesp, é importante lembrar que de qualquer forma o investimento no setor público terá de aumentar. O próprio Plano Nacional de Educação define como objetivo a oferta de 40% das vagas do ensino superior no Brasil pelo sistema de educação pública. Segundo cálculos de Mendes, o atual modelo das universidades brasileiras se mostra tão oneroso, que seriam necessários 3% do PIB brasileiro - ou 30% do orçamento total para a educação em 2024 - apenas para atingir essa única meta.
A outra vantagem citada por Capelato, da iniciativa privada abrir as portas do ensino superior para a população de menor poder aquisitivo, também encontra críticos do setor público. Luiz Dourado, professor de politica educacional UFG e membro do Conselho Nacional de Educação, afirma que até 2016, 50% dos ingressos nas universidades federais serão de escolas públicas. ;O Fies é importante, mas não pode deixar as instituições privadas dependentes do poder público;, opinou Dourado.
Ajuda extra
O Mapa do Ensino Superior no Brasil pretende auxiliar na determinação das políticas públicas para o setor. Bem detalhado, revela números e estatísticas do ensino superior em cada estado do Brasil. O levantamento traz, por exemplo, as regiões do país com maior demanda por faculdades. ;Facilita para indicar onde investir o dinheiro público. Atender não só os grandes centros, mas entender a necessidade de cada município do país;, esclarece Capelato.
Segundo o estudo, nos últimos 13 anos, ocorreu aumento de 129% nas matrículas em universidades públicas e particulares do Brasil. O ensino a distância (EAD) ganhou destaque, com 37,5% de crescimento de alunos entre 2009 e 2013. Para Capelato, o estímulo ao EAD é uma das bandeiras que o governo pode adotar, ;para levar educação para milhões de pessoas a baixo custo.;