Trabalho e Formacao

Orgulho de ser um trabalhador

postado em 21/01/2013 12:32
Para muitos, o processo é natural.Encontrar um bom emprego após terminar a faculdade faz parte do caminho trilhado desde o jardim da infância. No entanto, obter independência na vida adulta é uma tarefa difícil para pessoas como Michele Santos. Ela nasceu com deficiência intelectual (DI), o que dificulta o aprendizado. Aos 32 anos, cursa o 3; ano do ensino básico, mas nem por isso desistiu do que chama da;vida de gente grande;. Michele faz parte de uma turma de oito pessoas com DI que trabalham na higienização de documentos antigos da Coordenação de Preservação de Bens Culturais da Câmara dos Deputados. A chance é resultado de uma parceria de órgãos federais com a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais do Distrito Federal (Apae-DF).

O projeto Emprego Competitivo Apoiado inseriu, desde 2007, 26 portadores de DI no mercado de trabalho. Eles atuam na área de conservação dos volumes, por meio de higienização de livros e documentos. Os oito alunos na Câmara dos Deputados conseguem, por ano, limpar e conservar mais de 540 mil folhas. ;Trabalhar me animou para estudar. Quero fazer faculdade e chamar os meus amigos para a formatura;, conta Michelle, que conseguiu viajar para o parque da Disney, nos Estados Unidos, com o próprio salário. ;Eu ajudo meus familiares e pretendo levar meus pais para viajar em Manaus;, planeja a moradora de Sobradinho.

Outro caso de sucesso é o de Rafael Barbosa Viana, 36 anos. Ele sofreu um acidente e possui uma bala alojada na cabeça. Perdeu a visão do olho esquerdo e esqueceu-se de parte dos acontecimentos da maior parte de sua vida. No entanto, é ele quem paga o aluguel da casa e arca com as despesa de alimentação.

Para enfrentar o mercado de trabalho, os estudantes especiais passaram por treinamento na Biblioteca Central da Universidade de Brasília e também no Arquivo Público Nacional, comapoio de restauradores e conservadores profissionais durante mais de um ano. ;Nunca pensei que fosse trabalharcomisso na minha vida.Nunca me passou pela cabeça que estaria na Câmara;, entusiasma-se Urbano Neiva de Aguiar, 39 anos.

Antes de trabalhar com higienização,Urbano foi repositor de uma loja de departamentos e assistente de escritório. É com a conservação que ele se identifica. Não se incomoda em trabalhar sentado durante todo o dia e sente-se orgulhosocomo título de profissional.Após realizar o curso, recebeu certificado daUnB de higienizador. ;Isso quer dizer que posso trabalhar em qualquer outro lugar;, conclui.

O psicólogo Rodolfo Ambiel, mestre e doutorando em psicologia da Universidade São Francisco, em São Paulo, explica a evolução da inclusão de portadores de DI no mercado, que começou em oficinas: ;Eram locais dentro das instituições. Lá, as pessoas com deficiência aprendiam um ofício, mas não é possível considerar aquilo, de fato, comoumtrabalho nem tampouco como inclusão, pois eles ainda estavam escondidos dentro das instituições. Era meio que brincar de trabalhar;.

Segundo ele, trabalhar em um ambiente competitivo ensina as pessoascom DI a respeitar em horário de trabalho, regras e a lidar com dinheiro.Rodolfo ressalta também que não existem trabalhos exclusivos para pessoas com essa deficiência.; Eu não teria o menor talento para fazer o que eles fazem, pois requer paciência para ficar sentado durante longas horas. O trabalho que desenvolvem não é por causa de uma limitação, mas porque eles têm aptidão para isso;, esclarece.

Concentração

A restauradora Lídia Miller, 57 anos, reconhece: ;É preciso ter muita paciência para limpar página por página, além de delicadeza e concentração.A conservação de todo o acervo depende disso;. Lídia conta que, no início, a equipe ficou preocupada com a forma como deveriam lidar com os alunos: ;Como tempo, percebemos que não há diferença.Hoje Em dia,nem lembramos que portam uma deficiência;.

O psicólogo ressalta que os pais não devem temer a inserção dos filhos especiais no mundo adulto. ;Não é incomum que as crianças com DI se tornem adolescentes e adultos que não aprenderam a confiar na própria capacidade.Mas, quando começam a ganhar o próprio dinheiro e até a sustentar a família, eles percebem sua capacidade e sentem-se produtivos. Isso certamente tem repercussões emocionais muito importantes;, analisa.

O convênio da Apae (veja O que diz a lei) está firmado, hoje, com a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, o Palácio do Itamaraty e o Supremo Tribunal Federal. No último ano, um novo acordo foi assinado com o Ministério da Educação.

O que diz a lei

Em 24 de julho de 1991, entrou em vigor no Brasil a Lei 8.213. Também conhecida como Lei de Cotas, obriga toda empresa a ter em seu quadro de funcionários 2% portadores de necessidades especiais quando atingir o número de 100 empregados; 3%, de 201 a 500; 4%, de 501 a 1.000; e, a partir daí, 5%. No caso de descumprimento, a empresa será multada em R$ 1.105,00 para cada funcionário não contratado.

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