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Sanaa, capital do Iêmen, torna-se campo de batalha entre forças rivais

Sanaa, capital do Iêmen, torna-se campo de batalha entre forças do regime e seguidores de um líder tribal. Explosão em paiol de armas e sucessão de combates matam 52, e presidente acusa a oposição de querer a guerra civil

postado em 27/05/2011 08:11
Milicianos patrulham a casa de Sadiq Al-Ahmar, chefe da tribo Hashed e organizador dos protestosFaizah Al-Sulimani, 25 anos, se vê como prisioneira em sua casa desde terça-feira. Ela sabe que uma simples ida ao supermercado pode lhe custar a própria vida. As ruas de Sanaa, capital do Iêmen, transformaram-se em armadilhas até mesmo para os civis. Na manhã de ontem, Faizah, as cinco irmãs e os três irmãos tiveram que se refugiar no porão da residência, situada no bairro de Al-Hasaba, próximo ao quartel-general das forças de segurança do governo. ;Os tiroteios com armas pesadas têm sido frequentes. Na quarta-feira, os confrontos começaram às 4h (hora local) e só se encerraram no fim da manhã;, relatou ao Correio, por telefone, a ex-voluntária do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV). ;Nos últimos dois dias, os combates entre as tropas do presidente Ali Abdullah Saleh e do líder tribal xeque Sadiq Al-Ahmar mataram 52 pessoas e deixaram ao menos 100 feridas. Lá fora, há atiradores de elite disparando a esmo;, acrescentou a iemenita, que atua como porta-voz do Conselho Coordenador da Juventude pela Revolução da Mudança (CCYRC, pela sigla em inglês). Chefe da influente tribo Hashed ; que inclui o clã do próprio Saleh ;, Al-Ahmar é um dos principais rivais do presidente.

O médico Hamza Al-Shargabi, 30 anos, mora no bairro de Hadda, a 15km de Faizah. Na quarta-feira, ele escutou o tiroteio intermitente e tentou correr até o hospital de campanha, a fim de socorrer os feridos. ;Não pude chegar lá por conta de bloqueios nas ruas;, afirmou à reportagem, por meio da internet. Enquanto as forças do presidente e do rival se matavam, nove médicos mantinham plantão 24 horas por dia no local. Após acusar Al-Ahmar de empurrar o país para a guerra civil, Saleh ordenou a prisão do xeque e de seus irmãos ;para que sejam julgados por rebelião armada;. Por sua vez, Al-Ahmar concedeu entrevista à rede de tevê Al-Jazeera, por meio da qual ordenou a saída do mandatário. ;Peço aos nossos irmãos árabes, principalmente aos países do Golfo, assim como aos Estados Unidos, ao Reino Unido e à União Europeia, que exerçam pressão sobre Saleh para que pare suas guerras;, disse.

Exigência
O apelo parece ter surtido efeito. A secretária de Estado americana, Hillary Clinton, afirmou que os EUA apoiam a saída de Saleh. ;Exigimos de todas as partes o fim imediato da violência;, declarou. ;Estamos muito preocupado com os confrontos entre várias facções no Iêmen.;

A preocupação do Ocidente com a instabilidade no país tem explicações estratégica e econômica. Situado no Golfo de Áden, o Iêmen dá acesso ao Mar Vermelho, uma importante via do petróleo. Foi também em território iemenita que a organização Al-Qaeda na Península Arábica (AQAP) montou sua base e conspirou para explodir aviões dos EUA em pleno ar. Na quarta-feira, Saleh alertou que sua saída representaria a vitória do terror. ;O Iêmen não será um Estado falido. Não viraremos refúgio da Al-Qaeda.;

Para o opositor Ali Zabebah, estudante de farmárcia, 25 anos, morador de Sanaa (Iêmen), disse (em inglês) que é Saleh quem deseja arrastar a população para a guerra civil. ;Nossa revolução é pacífica. O presidente tenta atacar as pessoas, mesmo sabendo que não usamos armas;, criticou, em entrevista ao Correio, por telefone, de Sanaa. ;Quando saímos às ruas, eles (soldados) usam canhões d;água, bombas e munição real. Meu irmão caçula, de 17 anos, foi atingido por uma bala na perna, passou por uma cirurgia e está no hospital;, emendou o estudante.

De acordo com ele, os combates se concentram na Rua 60 Metros, a mais importante da capital iemenita. ;Muitos civis, incluindo crianças, estavam ali e foram mortos pela explosão de um depósito de munição;, relatou Zabebah. O incidente ocorreu durante a madrugada e, segundo o regime de Saleh, o paiol pertencia à família de Al-Ahmar. Centenas de pessoas começaram a abandonar Sanaa, com o receio do agravamento da violência. Muitos dos que decidiriam ficar na cidade se preparavam ontem para invadir o centro hoje, durante a tradicional sexta-feira de orações e protestos. Zabebah considera a Al-Qaeda ;uma mentira;. ;Não existe Al-Qaeda no Iêmen, mas algumas poucas pessoas que causam problemas, em troca de dinheiro;, comentou. ;Nâo nos importamos com Al-Qaeda. Só queremos dirigir nosso próprio país, com uma justiça civilizada.;

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