Mundo

Egito recorda a revolução de 2011 entre a indiferença e o medo

O alvo principal da revolta era a polícia, que detinha e torturava com total impunidade. Mas também exigiam "pão, liberdade e dignidade"

Agência France-Presse
postado em 25/01/2016 11:10
O alvo principal da revolta era a polícia, que detinha e torturava com total impunidade. Mas também exigiam

A revolução egípcia de 2011 completa seu quinto aniversário entre a indiferença de muitos e o medo de outros, sob um regime autoritário que realizou muitas detenções nos últimos dias e proibiu qualquer manifestação nesta segunda-feira. O paradoxo é evidente: 25 de janeiro é desde 2012 o "Dia da Revolução", mas nesta segunda-feira não está prevista nenhuma cerimônia. O poder fez de tudo para impedir manifestações dos jovens, que consideram que sua revolução foi confiscada.

No centro do Cairo havia apenas dez policiais vigiando a praça Tahrir, epicentro da revolução que tirou do poder o presidente Hosni Mubarak no dia 11 de fevereiro de 2011, depois de três décadas no poder. Nas ruas adjacentes era possível ver veículos blindados, policiais e militares fortemente armados. Há exatamente cinco anos, a praça se encheu de milhares de manifestantes que, encorajados pela queda de Ben Ali na Tunísia onze dias antes, se concentraram para exigir a saída de Mubarak.

[SAIBAMAIS]O alvo principal de sua revolta era a polícia, que detinha e torturava com total impunidade. Mas também exigiam "pão, liberdade e dignidade". O parênteses democrático aberto em 2011 foi fechado em 2013 pelos militares, acostumados a dirigir o Egito desde que se converteu em república, em 1953.

Leia mais notícias em Mundo

Em 3 de julho de 2013, o chefe do Exército, o general Abdel Fattah ao Sissi, depôs e ordenou a detenção do presidente islamita Mohamed Mursi, primeiro presidente eleito democraticamente, no poder há um ano. Com este golpe colocou fim ao governo da Irmandade Muçulmana, acusado de incompetência e insultado por centenas de milhares de manifestantes que saíram às ruas contra ele.

O poder iniciou então uma repressão implacável nas ruas contra os partidários de Mursi, que terminou com 1.400 mortos e 15.000 detidos, e depois tomou como alvo a oposição laica e de esquerda. Sem se esconder, o próprio Sissi disse na campanha presidencial de 2014, conquistada por ele sem problemas, que "serão necessários entre 20 e 25 anos para instaurar uma verdadeira democracia no Egito".

"Depois de ter sido confiscada, a revolução ficou enterrada", constata Karim Bitar, pesquisador do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (IRIS) em Paris.

"Estado policial"

No domingo, o presidente Sissi pronunciou um curto discurso no qual elogiou a juventude como "pilar fundamental da sociedade", dias depois de advertir contra a tentação de "uma nova revolução". Dentre os milhares de detidos na repressão posterior ao golpe, centenas, incluindo o próprio Mursi, foram condenados à morte em julgamentos sumários condenados pela ONU.

A organização Irmandade Muçulmana, considerada terrorista pelo poder, convocou no domingo "um novo ciclo revolucionário contra o golpe de Estado militar". No entanto, ao meio-dia local não havia sido observada nenhuma manifestação.

O Movimento de 6 de abril, na liderança da revolução de 2011, foi proibido e muitos de seus dirigentes estão atrás das grades por terem descumprido uma controversa lei que limita o direito de manifestação.

Mustafa Maher, de 28 anos, que é um dos fundadores do movimento, já não dorme em sua casa e limita ao máximo seus movimentos. Segundo conta à AFP, teme que o acusem e matem na prisão.

Nos últimos dias, a polícia realizou muitas inspeções em apartamentos de opositores e jornalistas, e deteve suspeitos de incitar manifestações nesta segunda-feira.

"Os egípcios acompanham, obrigados, o retorno de seu país a um Estado policial", lamentou a Anistia Internacional.

"Dezenas de milhares de pessoas foram detidas, e as prisões do país estão superlotadas. Há informações de torturas, e centenas de pessoas detidas sem acusação ou julgamento", acrescentou a AI.

Para o governo de Sissi, que segundo seus muitos partidários colocou fim a quase três anos de caos, os membros da Irmandade Muçulmana são terroristas que estão por trás da maioria dos atentados sofridos pelo país.

No entanto, quase todos eles são reivindicados pelo braço egípcio da organização Estado Islâmico, especialmente ativa na península do Sinai.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação