Mundo

Foto de bebê encontrado morto no Mar Mediterrâneo comove o mundo

ONG alemã, que divulgou a imagem, cobra passagem segura a refugiados

Rodrigo Craveiro
postado em 31/05/2016 07:15
Martin, voluntário da organização Sea-Watch, segura o corpo da criança: gesto instintivo de proteção

Quase nada se conhece sobre o bebê, inerte, aninhado nos braços de Martin. ;Ele foi encontrado na última sexta-feira. Quando a nossa tripulação chegou, 350 pessoas estavam dentro da água e havia um número desconhecido de imigrantes presos sob o convés da embarcação de madeira, na costa da Líbia, no Mar Mediterrâneo. Ao recuperarmos os corpos, mais tarde, encontramos a criança flutuando na água, sem sinais de vida. Não sabemos se os pais sobreviveram ou não;, contou ao Correio Ruben Neugebaper, porta-voz da Sea-Watch. Para que a morte do pequeno não fosse em vão, a organização não-governamental alemã decidiu fotografá-lo e espalhar a imagem pelos quatro cantos do planeta.

;Nós decidimos pela publicação porque pensamos que a gravidade da situação exige que o mundo conheça a foto;, explicou Ruben. ;A União Europeia (UE) utiliza o Mar Mediterrâneo como uma vala, enchendo-o de cadáveres, a fim de assustar os imigrantes e dissuadi-los de virem;, acrescentou. O ativista alerta que, enquanto não houver uma passagem segura e legal para os refugiados, tragédias como a de sexta-feira tornarão a ocorrer. ;Vários barcos viraram na costa da Líbia, deixando centenas de mortos, como resultado da política externa europeia;, criticou o porta-voz. Em nota, a entidade privada assegurou ser ;bastante cautelosa; em relação à utilização ética de informação e filmagens da missão.

[SAIBAMAIS]Martin, o homem que aparece na foto segurando o cadáver do bebê, atua como piloto de bote rápido da ONG e é pai de três crianças. Ele preferiu não ter o sobrenome divulgado. Por e-mail enviado a agências de notícias, ele contou ter identificado a criança na água ;como se fosse um boneco, com os braços estendidos;. ;Segurei o braço dele e puxei o corpo leve, de forma protetora, para os meus braços, como se ele estivesse vivo. (...) O sol refletiu em seus olhos brilhantes e amigáveis, mas sem qualquer movimento;, lamentou. ;Eu comecei a cantar para confortar a mim mesmo e para dar algum tipo de expressão àquele momento incompreensível e de cortar o coração. Apenas seis horas antes, aquela criança estava viva.;

De acordo com Ruben, a Sea Watch mantém entre 10 e 15 tripulantes em dois barcos. ;Nós temos realizado esforços de busca e de resgate na costa da Líbia e no Mar Egeu;, relatou o ativista. Fundador da Sea-Watch, Harald H;ppner também cobrou que os países da União Europeia forneçam passagem segura aos barcos com imigrantes. ;Se não queremos ver tais imagens, então temos de parar de produzi-las;, desabafou. ;Na sequência desses acontecimentos desastrosos, torna-se óbvio que os apelos de políticos da UE para se evitar mais mortes no mar soma-se a nada mais do que retórica vazia.; A imagem do bebê se soma à do garoto sírio Aylan, 3 anos, encontrado morto em uma praia da Turquia. Desde o início de 2014, mais de 8 mil pessoas morreram afogadas no Mediterrâneo.



Brasil expressa ;tristeza;
Em nota, o Ministério das Relações Exteriores brasileiro afirma que o governo recebeu com ;profunda tristeza e consternação; a notícia sobre as mortes de centenas de imigrantes no Mar Mediterrâneo, na semana passada. ;Esses trágicos acidentes devem tocar a consciência de todos e reforçam a urgência de uma solução abrangente para a gravíssima crise de refugiados, que deve, necessariamente, incluir o apoio da comunidade internacional e um esforço concentrado na busca de soluções para os conflitos que estão na origem desse fenômeno e que levam milhões de pessoas a abandonar suas casas na procura de melhores condições de vida;, afirma o Itamaraty.


Balanço amargo
Mais de 13 mil pessoas foram resgatadas no Mar Mediterrâneo na última semana. Dezenas morreram e centenas estão desaparecidas.

; As estatísticas se mantêm
As chegadas de refugiados à Europa se concentram em um prazo determinado de tempo. O número se mantém no mesmo nível que no ano passado: 46.700 desde o início do ano, contra 47.400 em 2015, durante o mesmo período, segundo a ONU. Se o total de mortos e desaparecidos na área agora excede os 1.700, a Organização Mundial para as Migrações (OIM) registrou 1.782 no mesmo período do ano passado.

; O Mediterrâneo central
A rota marítima saindo da Líbia se tornou a principal porta de entrada à Europa desde o fechamento da rota dos Bálcãs. O fluxo proveniente da Líbia se manteve mais ou menos constante desde o ano passado. A maioria dos imigrantes que chegam à Itália é proveniente da África subsaariana.

; Quantos saem da Líbia?
Um relatório recente da Interpol e da Europol calcula que cerca de 800 mil migrantes esperam sair da costa da Líbia até a Europa.

; Como é a viagem desde a Líbia?
A maioria dos migrantes empreendem a travessia a bordo de botes lotados. Muitos partem à noite, sob ameaça, golpes e disparos dos contrabandistas, pois vários querem desistir quando descobrem o péssimo estado das embarcações usadas na travessia.

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