Politica

Senado: trem da alegria oficializado

Primeira-Secretaria repassa ao Ministério Público Federal a responsabilidade em apurar a efetivação irregular de estagiários nos quadros da Casa na década de 1990

postado em 10/09/2009 08:00

O Senado decidiu parar as investigações que apontaram a efetivação irregular de 76 estagiários na gráfica da Casa, em 1992. Mesmo de posse de documento oficial que detalha as falhas no processo de incorporação desses funcionários ao quadro, a Primeira-Secretaria optou por repassar para o Ministério Público Federal a responsabilidade de apurar, identificar e punir os infratores. Ainda assim, até hoje a documentação, finalizada em 20 de julho, não chegou às mãos dos procuradores que abriram procedimento sobre o assunto.

O trem da alegria dos estagiários foi apresentado como um escândalo no esteio da divulgação do conteúdo dos atos secretos. A efetivação dessas pessoas ficou escondida por mais de 17 anos, mas as irregularidades se iniciaram na década de 1980.

Documento assinado pelo atual diretor-geral da gráfica, Florian Madruga, elaborado por determinação do primeiro-secretário da Casa, Heráclito Fortes (DEM-PI), detalha os vícios no processo de incorporação desses funcionários ao quadro do Senado. A apuração foi iniciada após pedido de informação do senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) sobre o escândalo.

A assessoria da Primeira-Secretaria diz que, mesmo de posse de relato sobre as irregularidades, já cumpriu seu papel ordenando a apuração inicial e prestando contas a Arthur Virgílio. O órgão alega ainda que não está sendo omisso, já que teria repassado o resultado das apurações ao Ministério Público ; a documentação ainda não foi enviada. Segundo a Diretoria-Geral da Casa, isso deve ocorrer na próxima semana, porque, só na segunda-feira (14) se encerraria o prazo dado aos ex-estagiários para juntar documentos e prestar as informações.

Fato é que a situação dos ex-estagiários comoveu alguns parlamentares. Prestando serviço ao Senado há mais de 20 anos, esses fizeram uma peregrinação por gabinetes. De início, o tema que agora vai ficar sem apuração interna, seria debatido na Comissão de Constituição e Justiça, que emitiria parecer sobre a ilegalidade das contratações.

Programa
De agosto de 1984 a fevereiro de 1985, segundo o documento produzido a pedido da Primeira-Secretaria, a que o Correio teve acesso, a gráfica admitiu 82 ;estagiários-bolsistas; sem adotar qualquer processo seletivo ou apresentar programa de estágio vinculado a instituições de ensino. Seis desses ex-estagiários morreram, e suas famílias recebem pensão, e outros sete já estão aposentados.

Para viabilizar a efetivação dos estagiários uma série de ofícios e requerimentos foram apresentados, solicitando parecer sobre ao vínculo empregatício desses funcionários. Em maio de 1990, chega à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, um pedido de análise sobre o assunto. A CCJ diz que quem deve decidir sobre o tema é a Mesa Diretora, alegando que cabia a ela tratar dos temas administrativos da Casa. A Mesa, por sua vez, devolveu a prerrogativa à CCJ.

Em junho de 1990, parecer do senado José Paulo Bisol colocou fim à controvérsia. No texto ele disse que o Senado deveria reconhecer o vínculo dos estagiários pelo regime da CLT ; ou seja, o mesmo adotado pela iniciativa privada ;, mas que todos os cargos ocupados no Senado por funcionários contratados pelo regime celetista deveriam ser extintos, e que, para serem novamente ocupados, deveria haver definição por lei de suas funções e abertura de concurso público para o preenchimento das vagas.

O parecer do senador era fatal às intenções de efetivar os estagiários. Mas, contrariando a decisão da CCJ, um ato da Comissão Diretora, de 1991, sem número ou registro formal, se utilizou apenas da parte do texto que determina reconhecimento do vínculo empregatício e formaliza a situação dos servidores.

; Fruto de pedido
Para oficializar a medida, que nunca foi publicada, um ofício, assinado pelo então presidente da Casa Mauro Benevides, autorizou o ex-diretor-executivo da gráfica Agaciel Maia a enquadrar os estagiários no quadro de pessoal a partir de janeiro de 1992. Na ocasião em que o escândalo foi divulgado, Benevides disse que o ofício que viabilizou a contratação desses servidores foi uma decisão unânime da Mesa Diretora, e admitiu, posteriormente, que foi fruto de um pedido de Agaciel Maia.

; Sem concurso
Os estagiários já prestavam serviço na Casa, mas haviam ficado de fora do maior trem da alegria da história do Congresso, quando o então presidente da Casa Moacyr Dalla efetivou no quadro de funcionários da gráfica 1.558 pessoas. Para acomodar os excluídos, deu-se a eles o título de estagiários. Em 1987, o ex-diretor-geral do Senado, à época diretor-executivo da gráfica Agaciel Maia deu início a uma série de tentativas de regularizar a situação dessas pessoas. Um ano depois, a missão se complicou. A nova Constituição vedou a contratação de servidores públicos sem aprovação prévia em concurso.

; Passo a passo de um trem da alegria

- De agosto de 1984 a fevereiro de 1985, a Gráfica do Senado contrata 82 estagiários sem qualquer processo seletivo ou definição de programa vinculado a instituições de ensino

- Em janeiro de 1987, o à época diretor-executivo da Gráfica, Agaciel Maia, encaminha pedido de análise sobre a situação dos estagiários ao Conselho de Supervisão do Senado. Em abril daquele ano, o então primeiro-secretário da Casa, Jutahy Magalhães, questiona o
consultor-geral sobre a possibilidade de se reconhecer o vínculo mpregatício do Senado com os estagiários. Ainda em 1987, o consultor-geral diz que o Senado deve reconhecer o vínculo na forma da CLT, podendo, inclusive, rescindir os contratos, após o reconhecimento, arcando com os custos das demissões. Os estagiários são mantidos.

- Em 30 de maio de 1990, a Comissão de Constituição e Justiça recebe indicação apresentada pelo senador Maurício Corrêa, em que era sugerida análise sobre o vínculo empregatício dos estagiários da gráfica.

- Parecer do senador Jutahy Magalhães na CCJ remete a discussão para a Mesa Diretora, alegando caber a ela iniciar matérias sobre a administração do Senado.

- A Mesa, por sua vez, opta por devolver à CCJ o processo que trata da efetivação dos estagiários, alegando a existência de ;pendência judicial; e dúvida quanto à constitucionalidade da matéria.

- Em dezembro de 1990, o senador José Paulo Bisol emite parecer pela CCJ condenando a efetivação dos estagiários. No texto, ele acaba com a possibilidade da efetivação dos estagiários. Diz que a contratação
deve ser reconhecia pelo regime da CLT, mas que todos os cargos egidos pelo antigo regime devem ser extintos, e que um concurso público deve ser aberto para que se faça a ocupação dos cargos.

- Contrariando a decisão de Bisol, ato da Comissão Diretora de 1991 reconhece o vínculo dos estagiários da Gráfica do Senado. Para tanto, usa como fundamento apenas a parte em que o senador argumenta em favor
do reconhecimento do vínculo, sem fazer alusão à exigência de concurso úblico para a ocupação dos cargos. Neste ato, 76 pessoas são efetivadas, em cargo de Assistente Industrial Gráfico. O ato conta com sete assinaturas, mas não foi numerado, e nem publicado na base de ados do Senado.

- Para oficializar o ato que nunca foi publicado, um ofício assinado por auro Benevides, então presidente do Senado, autoriza o diretor da Gráfica, Agaciel Maia, a enquadrar os servidores, com efeitos financeiros a partir de janeiro de 1992. Benevides não se recorda de
ter assinado o ofício.

- O documento assinado pelo atual diretor da gráfica do Senado ressalta o final que ;nos assentamentos funcionais dos servidores atingidos pelo enquadramento não há qualquer registro formal de ato que tenha
determinado o ingresso no cargo ou reconhecido o vínculo, ndividualmente;.

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