Politica

Ex-delegado reafirma em programa da TV Brasil crimes da ditadura militar

postado em 06/06/2012 19:05
O ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) Cláudio Guerra foi um dos policiais mais poderosos a atuar na repressão do regime militar entre as décadas de 1970 e 1980. Embora, segundo ele, tenha matado quase uma centena de pessoas, ressaltou que nunca torturou. Em entrevista ao programa Observatório da Imprensa, da TV Brasil, transmitido na noite desta terça-feira (5/6), Guerra relatou ao jornalista Alberto Dines, âncora do programa, os crimes e os bastidores da ditadura militar (1964-1985).

;Eu tinha aversão, não participava e era contra a tortura. Por isso nunca entrei nos lugares [de tortura], como a Casa da Morte [centro clandestino de tortura e assassinatos em Petrópolis, na região serrana fluminense]. Aqui no Espírito Santo, eu procurava tirar da minha equipe os policiais que torturavam;, disse Guerra em sua primeira entrevista após o lançamento do livro Memórias de uma Guerra Suja, originado de seus relatos aos jornalistas Rogério Medeiros e Marcelo Netto.



Aos 71 anos, Guerra é hoje pastor evangélico. Ele se converteu na cadeia, enquanto cumpria pena em regime fechado pela morte de um bicheiro. Atualmente, está sob prisão domiciliar. A vontade de contar a verdade, segundo ele, foi motivada pelo arrependimento após a conversão. ;Se eu tive coragem naquele passado lá de fazer as coisas erradas, muito mais coragem eu tenho hoje de falar a verdade e de poder ajudar e reparar um pouquinho as coisas erradas que eu fiz;, disse. [SAIBAMAIS]

Guerra também declarou foi responsável pela incineração de corpos de militantes de esquerda na Usina Cambaíba, em Campos dos Goytacazes, no norte fluminense. ;[Os agentes da ditadura estavam] querendo eliminar mais inimigos. Enterravam como indigente, com nome trocado. Só que isso estava começando a aparecer, e eles queriam uma alternativa. Queriam o negócio do fogo. Foi quando eu apresentei o Eli Ribeiro, dono da Usina Cambaíba, a eles;.

Segundo o ex-delegado, todos os corpos dos presos políticos chegavam seminus, castrados e com fraturas expostas. ;São cenas que me deixam muito abalado. Para mim, a pior época foi essa;, lamentou. No entanto, Guerra acredita que isso o motivou a revelar às famílias o que de fato ocorreu. ;Tenho um grande compromisso com as famílias, porque foi o que mais me machucou. Tinha apagado isso da minha mente, mas muita coisa está voltando à minha memória;.

Para ex-delegado Dops, os militares daquela época não estavam preparados para lidar com a oposição ao regime. Para ele, o caso da morte do jornalista Vladimir Herzog, em 1975, é um exemplo disso. ;Sabia que ali não tinha sido suicídio, foi uma burrada, mais um morto sob tortura. A pessoa que comandou aquilo prejudicou mais. O grupo de direita queria trazer a simpatia da sociedade para a causa deles, mas foi justamente o contrário. Aquilo foi um tiro no pé;, revelou.

De acordo com Guerra, durante a ditadura militar era comum militares receberem ;gratificações; de empresários. ;Eles participavam e davam prêmios para quem executava líderes. ;Eu não cheguei a ganhar bônus direto. Recebia um [bônus] mensal. Eu tinha duas contas, em nome de Cláudio Guerra e de Stanislaw Meireles;.

Após a publicação do livro, Guerra disse que foi ameaçado de morte. No entanto, para ele, ;morrer é lucro;, uma vez que agora é um homem religioso. ;Já recebi um monte de aviso. Mas não vão me calar. Não sou dedo-duro, vou falar na primeira pessoa. Não me sinto dedo-duro de ninguém;.

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