Politica

Funcionário da Câmara por 30 anos conta as histórias que viveu na Casa

Às vésperas de se aposentar, o policial legislativo Graciliano Ferreira conta o que viu na chamada Casa do Povo: de protestos históricos à morte de um parlamentar em plenário

postado em 28/12/2014 08:10
A experiência levou Graciliano a ser chamado de

;É no final do ano (de 2014). A partir de dezembro eu estou jogando a toalha. Isso aí é uma coisa que eu estou me preparando psicologicamente;;, diz, com uma ponta de tristeza na voz, o policial legislativo Graciliano Ferreira Filho, 56 anos. Admitido na Câmara no começo de 1985, ainda pelo regime celetista, Graciliano atua desde então como um dos responsáveis pela segurança do Plenário Ulysses Guimarães. Nos últimos 30 anos, acompanhou os principais momentos da vida política do país, como a aprovação da Constituição de 1988, apelidada de ;Constituição cidadã;, e o impeachment do ex-presidente Collor. Viu também cenas trágicas, como a do deputado que morreu vítima de um infarto logo após falar na tribuna e a de um parlamentar que ;puxou a arma; para um colega, durante uma discussão.

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Graciliano nasceu em 1958, no local onde hoje fica a Candangolândia. Brasília, à época, não passava de um grande canteiro de obras. ;Fui um dos primeiros (a nascer em Brasília). Praticamente o primeiro. Eu nasci no Hospital do Iapi (Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários), que funcionava em um prédio de madeira, entre a Candangolândia e o Núcleo Bandeirante;, conta ele, filho de um fazendeiro que vivia no povoado goiano de Itapaci, antes de se mudar para Brasília.

;Quando eu ingressei na Câmara, eram só 351 deputados. Depois, conforme se criavam mais estados, aí é que aumentou;, diz Graciliano, que às vezes é chamado pelos colegas com o apelido de ;professor;. Outra diferença: na época em que Graciliano ingressou na Polícia Legislativa, os parlamentares tinham horror à presença de policiais militares no Congresso, rescaldados pela experiência dos anos de chumbo. ;Isso nem se falava antes, era tema proibido no parlamento. Os parlamentares não deixavam a PM entrar aqui de forma nenhuma;, conta ele. Dessa forma, até o período de Inocêncio de Oliveira (então PFL-PE) na presidência da Casa, entre 1993 e 1995, a Polícia Legislativa tinha que dar conta do serviço sozinha.

Foi assim, sem auxílio da PM, que os profissionais encararam manifestações de massa, como os protestos dos caras-pintadas que pediam o impeachment de Collor, em 1992; e inúmeras tentativas de invasão da Casa no começo dos anos 1990 por sindicalistas. Com os caras-pintadas, por exemplo, Graciliano lembra-se de ter vivido maus bocados. ;Deram muito trabalho;, resume. ;Além de serem baderneiros, eles eram muito violentos. E não tinha proibição, não tinha ninguém que os parasse. E ainda juntava com a turma de estudantes, com o pessoal da UnB. Eles não acatavam ordem, rompiam os limites que a gente colocava;, recorda-se. E os protestos de junho de 2013? ;Foram fichinha em relação ao que a gente já viu;, compara ele, com uma gargalhada.

Absurdo
Mas não foram só os populares que deram trabalho a Graciliano e seus colegas ao longo da carreira. Dentro do plenário, a situação chegou à beira do absurdo algumas vezes, em episódios pouco documentados na história da Casa. Houve, por exemplo, quem lançasse mão de revólver no debate político. ;Teve um deputado, chamado Chico Pinto (Francisco José Pinto dos Santos, do PMDB-BA, morto em 2008), que chegou a botar a mão na arma para ameaçar outro deputado, em plena sessão, durante um bate-boca. Todo mundo viu que ele estava armado. O presidente pediu que se retirasse, mas ele não quis;, diz Graciliano, narrando um episódio ocorrido em 1991, durante a presidência do também peemedebista Ibsen Pinheiro (RS), atualmente sem mandato.

Outro momento inusitado relatado por Graciliano ocorreu em 1987, durante os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte que, no ano seguinte, aprovaria a atual Constituição brasileira. Era 18 de novembro, último dia de trabalho na fase de sistematização do texto. ;Foram muitas discussões e ia vencendo o prazo. Faltavam dois minutos para a meia-noite, quando se encerraria o prazo. E aí o presidente mandou que um servidor da Mesa, de nome Reginaldo, atrasasse o relógio. E nem teve muita contestação;, conta Graciliano. De fato, matéria publicada no dia seguinte na imprensa apontou que ;alguém atrasou o relógio do plenário em 20 minutos. E, graças a este tipo de manobra, algumas votações ainda foram encaixadas na última sessão da Comissão de Sistematização;.

Com o Dr. Ulysses internado no Instituto Cardiológico (Incor) de São Paulo, a presidência dos trabalhos era ocupada, naquela noite, pelo 1; vice-presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Aluízio Campos. Entre as emendas aprovadas graças ao ;expediente; dos constituintes, estava aquela que estabeleceu o voto direto para governador do DF, apresentada pelo senador Pompeu de Souza (PMDB-DF) e pelo deputado Augusto Carvalho (DF), então no PCB.

O episódio mais marcante da experiência de Graciliano no plenário foi o falecimento do ex-deputado Christovam Chiaradia (PFL-MG), em 1991. O fato ocorreu na manhã de 11 de setembro, uma quinta feira, durante uma sessão de homenagem ao ex-presidente eleito Tancredo Neves (1910-1985). ;Ele subiu à tribuna, falou, fez o seu discurso, e desceu. Quando deu o segundo passo, já colocou a mão na bancada da tribuna. E dali mesmo sentou e puff, arriou;, descreve Graciliano.

;Tentamos reanimá-lo (ele havia infartado), e ele não respondeu. Chamamos a ambulância. Até que ela saiu, fez a volta e parou na chapelaria; Ele já chegou sem vida ao hospital;, contou. A morte de Chiaradia, conta Graciliano, acabou provocando a criação do posto médico que hoje fica ao lado do plenário, com desfibriladores.

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