Politica

Gilmar Mendes: Julgamento da chapa Dilma-Temer deve terminar em junho

Presidente do TSE afirma que o processo, que será retomado em maio, deve terminar ainda no primeiro semestre

Gláucia Guimarães, Leonardo Cavalcanti, Denise Rothenburg
postado em 27/04/2017 06:00

Presidente do TSE afirma que o processo, que será retomado em maio, deve terminar ainda no primeiro semestre

Em entrevista ao programa CB.Poder, uma parceria entre a TV Brasília e o Correio Braziliense, o ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, disse que o julgamento da chapa Dilma-Temer deve terminar ainda no primeiro semestre. ;Há uma certa pressa natural, portanto acredito que podemos terminar esse julgamento ainda no primeiro semestre;, afirmou o magistrado. Em relação à discussão sobre foro privilegiado, o ministro reconheceu que a quantidade de investigados sobrecarrega o STF. Aprovado no Senado ontem, o projeto de abuso de autoridade também foi tema da conversa. ;Eu acho que faz falta uma lei de abuso de autoridade, a última que tivemos e que ainda hoje está em vigor é muito incompleta, até ingênua no atual contexto brasileiro;, analisou.

Quando o processo da chapa Dilma -Temer será finalizado?
Posso até fazer uma brincadeira: termina quando termina. Mas acho que não vai ser um julgamento muito alongando, podemos ter eventualmente um pedido de vista, e sempre ocorre isso em processos complexos. Agora mesmo estamos acompanhando um processo de governadores ; Amazonas e Tocantins ;, e em geral se sucedem pedidos de vista. Mas também no TSE por conta da própria celeridade que marca a Justiça Eleitoral. E também deste bem que se consome e desaparece que é o mandato, então há uma certa pressa natural, portanto acredito que podemos terminar esse julgamento ainda no primeiro semestre.

Muitos avaliam que o processo está sendo protelado para manter o presidente Michel Temer mais tempo no poder.
De maneira nenhuma, não há esse tipo de prática no âmbito da Justiça. Quem acompanhou esse julgamento sabe o quanto ele está sendo um julgamento complicado. Porque se trata de presidente da República. Nós nunca tínhamos tido um processo contra presidente. É um processo complicadíssimo. E depois vêm todas as regulações da Lava-Jato, que o próprio ministro Herman decidiu trazer essas informações.
[SAIBAMAIS]
O que o senhor achou dessa posição do ministro Herman de trazer esse processo da Lava-jato para âmbito eleitoral?
Tem uma discussão que os advogados da ex-presidente Dilma suscitaram dizendo que isso ampliou o fundamento do pedido. Esse é um debate que certamente vai se travar no âmbito do tribunal, acho que, do ponto de vista jurídico-político, essa foi uma visão cuidadosa da parte dele. Porque essas informações estão no ar, as pessoas sabem disso. Agora fingir que elas não existem seria de fato iludir um pouco a população.

Na hipótese de o presidenteTemer vir a perder o mandato em função desse processo, um dos nomes cotados é o do senhorna eleição indireta.
O que o senhor acha disso?
Isto é absolutamente impossível de se dar pelo ponto de vista jurídico. Essa eleição teria que se fazer nos termos da Constituição em 90 dias. O prazo para se engajarem em qualquer partido, no caso um juiz teria que ser de seis meses. Até fico assim lisonjeado, isso afaga meu ego não no sentido de dizer que quero ser presidente da República, mas sim no sentido de que estou atuando bem onde estou atuando.

Esse processo no TSE qualifica o TSE, que afinal até agora apenas julgou governadores?
Eu tenho a impressão de que esse será o resultado. Se você olhar o meu voto, até tentando pacificar o espírito dos meus colegas lá na admissibilidade, eu dizia: ;A minha pretensão não é cassar a presidente, mas mostrar como se deu essa eleição. Se, de fato, houve abuso, porque nós tínhamos a impressão de que tinha havido. A ideia de que o Petrolão tinha financiado a campanha, isso já estava presente. O ministro Herman Benjamin tem dito que será um processo histórico. Eu acho que será histórico independentemente do resultado, se procedente ou improcedente. Nós vamos ter, com o trânsito em julgado, a informação de como se fez essa campanha em 2014. As revelações que estão aí são realmente preocupantes.

O Brasil consegue virar essa página?
Eu acho que sim e tenho discursado nesse sentido. Eu tenho dito que nós precisamos engajar nossas boas energias na reforma política. Nós conseguimos virar a página da inflação crônica fazendo o Plano Real no momento em que ninguém acreditava. É possível e nós precisamos fazer isso também no âmbito político para ganharmos estabilidade.

Mas esse Congresso tão atacado, envolvido e suspeito em relação, especialmente, à Lava-Jato, ele tem condição de fazer essa reforma política?
Eu tenho a impressão que nós vamos ter que fazer distinções, quem tiver responsabilidade de corrupção tem que ser afastado e criminalizado. Se houver outro tipo de irregularidade, caixa dois e coisa do tipo, temos que encaminhar em um outro tratamento e encarar isso como o TSE sempre encarou.

Pagar multa?
Isso ou alguma coisa nessa linha, e evitar essa demonização da política como se vem fazendo.

A CCJ do Senado acabou de aprovar o projeto de abuso e autoridade. Como
o senhor avalia?
Eu acho até engraçado autoridades reclamarem de uma lei de abuso de autoridade porque o que eles podem pedir é que os textos sejam aperfeiçoados, que haja clareza, que não haja tipo aberto, essa ideia de crime de hermenêutica não deve ocorrer. Mas eu acho que faz falta uma lei de abuso de autoridade, a última que tivemos e que ainda hoje está em vigor é muito incompleta, até ingênua no atual contexto brasileiro, é a lei feita por Milton Campos, de 1965, totalmente passada. Precisamos de uma nova lei. Vazamentos de informações, exposição de presos, ;sabe com quem está falando;, tudo isso que a gente sabe que são práticas correntes. A lista de abuso de autoridade vai de A a Z, no Brasil. É preciso colocar isso para que não ocorra e haja algum tipo de inibição. Eu não tenho o menor constrangimento em defender, até porque defendi isso no pacto republicano. O projeto de lei originário foi da nossa lavra. Quem trabalhou nisso? Pessoas insuspeitas, de visão liberal. Everardo Maciel, Rui Stoco, um dos desembargadores de São Paulo da melhor qualidade, Teori Zavascki, pessoas com abertura mental, com compromisso institucional.

Os investigadores não devem ter receio, então?
Claro que não. E reclamam: se o promotor arquivar, vai ter uma ação penal subsidiária. Correto, porque o promotor pode arquivar o pedido abusivamente. Nós temos que mudar o paradigma. Estado de direito é aquele em que não tem soberanos, todos estão submetidos à lei. Portanto, promotor, juiz, delegado, todos estão submetidos à lei e a lei de abuso de autoridade é isso.

O senhor acha que a lei brasileira é aplicada, da mesma forma, para todo mundo?
Claro que não. Esse é o problema de um país com tantas assimetrias, por isso temos que melhorar a aplicação da lei e nesse sentido nós temos dois grandes órgãos que poderiam funcionar de maneira mais adequada: o CNJ e o CNMP. Estamos discutindo agora a questão do foro, e o discurso é que o foro no Supremo não funciona e no primeiro grau sim. Ledo engano, a Justiça criminal brasileira é falha como um todo. Nós vimos o caso do goleiro Bruno, seis anos para julgar uma apelação em Minas Gerais. Justifica-se isso? Ou o caso do Carandiru, quantos anos? Agora que foi julgada a apelação do Tribunal de Justiça de São Paulo. Aí vem dizer que a Justiça ordinária funciona, porque o paradigma é o Moro, que só está fazendo isso graças a uma decisão do Tribunal Regional Federal do Rio Grande do Sul. Não estou dizendo que isso foi errado, mas não é esse o paradigma da Justiça. O paradigma é de deixar prescrever crime de júri, 20 anos, crime de homicídio e tentativa de homicídio dolosos. Precisamos melhorar muito isso, cobrar. É um país em que os inquéritos, às vezes, não se abrem, logo em caso de homicídio não abre, quando o inquérito é aberto, não se conclui, depois não se oferece denúncia. Esses dois órgãos poderiam fazer um mutirão para tentar melhorar, vivamente, essa seara e melhorar a aplicação da Justiça, de maneira igual.

O senhor é a favor ou contra o foro privilegiado?
Eu não vejo o foro como um mal em si mesmo, mas a minha avaliação é de que o constituinte foi muito otimista. Ele não esperava que, entre os detentores de foro, haveria essa criminalidade quase que sistêmica, mas a metade do Congresso hoje está sendo investigada, vamos colocar aí que há muita injustiça e tudo mais, mas tudo isso sobrecarrega, sobremaneira, o Supremo Tribunal Federal. Passar para o primeiro grau também não é a solução de maneira automática. Na experiência do mensalão, dividimos os processos e o mensalão foi julgado no Supremo. Os processos que estão por aí, que foram separados para julgamento, continuam. Isso mostra que aqui também há uma assimetria.

Por que tanto político enrolado quer o foro?
Por maior segurança. O Supremo não sai fazendo prisões por aí. Caso raro o do senador Delcídio. Segurança no próprio julgamento. O recebimento da denúncia entre nós é solene, nós discutimos o recebimento, isso não se dá em primeiro grau. Há uma série de razões, o tribunal é muito mais parcimonioso e tem que ser porque é a última decisão. Para o político, o processo judicial já é uma pena por causa da popularidade, na medida em que você tem um juiz muito performático, midiático.

Isso está ocorrendo em relação ao Moro?
Tem ocorrido em relação a vários casos, não sei se se atribui a ele ou aos procuradores, mas há um vazamento sistemático que vocês sabem de onde vem.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação