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Classe política pressiona STF sobre penas a condenados em 2ª instância

Políticos querem posição do Supremo Tribunal Federal sobre um condenado em segunda instância cumprir a execução da pena mesmo recorrendo em tribunais superiores

Natália Lambert
postado em 18/07/2017 06:02
Alexandre de Moraes disse, durante sabatina no Senado, que não há inconstitucionalidade na prisão em 2ª instância: expectativa de mudança no placar

Diante da condenação por corrupção e lavagem de dinheiro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo juiz Sérgio Moro, parte da classe política, independentemente de colorações partidárias, volta a pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) para que se manifeste novamente sobre a possibilidade de um condenado em segunda instância cumprir a execução da pena mesmo recorrendo em tribunais superiores. Apesar de ter analisado a questão por três vezes no ano passado, o entendimento é que, com o voto do ministro Alexandre de Moraes ; que substituiu Teori Zavascki no começo deste ano ; e diante de declarações do ministro Gilmar Mendes, o placar apertado de 6 a 5 da última votação seria revertido. Na opinião de especialistas, a decisão causaria instabilidade jurídica e poderia interferir, inclusive, na Operação Lava-Jato.

[SAIBAMAIS]Contrário ao entendimento da prisão antes do trânsito em julgado, o ministro Marco Aurélio Mello é um dos principais defensores de que o STF reveja a questão, contrariada, inclusive, em suas decisões monocráticas. ;Sempre que chega um habeas corpus para mim ,observo com isso em mente. Quando assumi a posição de ministro, jurei cumprir a Constituição e não atender a maioria;, comenta. Questionado se o momento político seria ruim para alterar o acórdão, Marco Aurélio diz que ;sempre a prevalência da Constituição é bem-vinda;. ;Penso que a maioria concluiu de forma equivocada quanto ao princípio da inocência. Parece que um desses seis vai evoluir e será em boa hora. É sempre uma boa hora para amar a Constituição.;

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Sem citar nomes de colegas, a referência é sobre o ministro Gilmar Mendes, que, nos julgamentos do ano passado, votou com a maioria e alegou que após a condenação em duas instâncias já era possível formar convicção sobre a culpa. Entretanto, em maio deste ano, Mendes sinalizou uma mudança de entendimento durante julgamento na segunda turma do STF. Segundo ele, a execução da pena após segunda instância, seria uma ;possibilidade jurídica e não uma obrigação; e melhor seria se a Suprema Corte revisasse a questão. ;Há uma enxurrada de casos, em que há recursos pendentes, plausíveis até, e se decreta desde logo a prisão. Isso nós estamos dispostos a rever. Colocaria mais uma instância nessa decisão;, falou na ocasião.

A outra expectativa de mudança no placar seria com o voto do novato na Corte, ministro Alexandre de Moraes. Apesar de ter dito durante a sabatina na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, em fevereiro, que não vê inconstitucionalidade na prisão em segunda instância, já teria sinalizado entendimento contrário. ;Defendo o mesmo posicionamento desde 1998. O posicionamento de que o princípio da presunção de inocência, previsto na Constituição, não impede nem as prisões preventivas nem as prisões em segundo grau por decisão de segundo grau (;) Não há uma determinação legal, mas também não há impeditivo. Quem deve decidir sobre isso é o tribunal de segunda instância;, disse durante a sabatina.

Desgaste


Na opinião do ministro Luís Roberto Barroso, não faz sentido o Supremo decidir novamente sobre isso se não houve mudanças do ano passado para cá. ;O Supremo já decidiu esta matéria por três vezes, em menos de um ano. Nada mudou de lá para cá e não há por que voltar ao tema. Um país que vai alterando a jurisprudência em função do réu não é um Estado de direito, mas um Estado de compadrio;, afirmou em entrevista recente. Um jurista que prefere não se identificar concorda com o magistrado e acha pouco provável que a presidente do STF, Cármen Lúcia, assuma o desgaste de pautar a mudança de entendimento em meio à crise política que o país vive. A decisão cabe a ela. ;Há vários recursos e habeas corpus em andamento que poderiam justificar o reexame, mas pautar isso agora seria interpretado de forma ruim para o Supremo.;

Para o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho, uma mudança de entendimento não seria ruim só para a Operação Lava-Jato, mas para todo o sistema jurídico nacional. ;A prisão depois da segunda instância devolveu o mínimo de racionalidade ao sistema penal. Em nenhum lugar do mundo, as pessoas vão até a quarta instância sem cumprir pena. Qualquer revisão agora seria muito grave. Não é possível o Supremo reconsiderar 180;, mudando tudo outra vez. Espero que isso não aconteça;, defende Robalinho.

Saiba mais

Avaliação da lei
De acordo com o artigo 5; da Constituição Federal, ;ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; (inciso LIV) e ;ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; (inciso LVII). Desde 2009, a junção dos dois artigos passou a garantir que o condenado deveria seguir em liberdade até que se esgotassem todos os recursos no Judiciário.

Em fevereiro de 2016, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu, por 7 votos a 4, que, a partir da condenação por um órgão colegiado ; caso dos tribunais de segunda instância ;, não existiria mais a presunção da inocência, e o réu poderia começar a cumprir a pena mesmo que estivesse recorrendo em tribunais superiores. Votaram a favor da decisão os ministros Teori Zavascki (relator), Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. Rosa Weber, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski foram contrários.

Em um reexame da questão, em outubro do ano passado, o pleno confirmou num acórdão a decisão dando a ela o caráter de repercussão geral, mas o placar foi mais apertado, 6 a 5. O ministro Dias Toffoli mudou de entendimento. Em novembro, mais uma vez, o tribunal avaliou a questão por meio de uma votação virtual e confirmou o placar de 6 a 4. A ministra Rosa Weber não se manifestou, mas já era voto contrário.

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