Politica

Cidadãos reclamam de burocracia, demora e erros nos balcões de repartições

Servidores apontam dificuldades para o trabalho. Para especialistas, produtividade precisa ser maior

Marlene Gomes - Especial para o Correio, Vera Batista
postado em 27/08/2017 08:01
Maria Ines passou duas horas na fila do posto da Previdência Social da Asa Sul: espera e atendimento desatento
O corte drástico de orçamento prejudicou várias áreas do serviço público. Da emissão de passaportes, passando pela paralisação de áreas prioritárias, como segurança, saúde, educação e projetos fundamentais para a população de baixa renda.

No Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o contribuinte, que arca com pesados impostos, é prejudicado. Dados da ONG Contas Abertas mostram que o valor pago para o funcionamento das unidades descentralizadas, por meio do programa Previdência Social do Ministério do Trabalho, foi de R$ 70,3 milhões, de janeiro a julho deste ano, o que representa uma queda de 78,7%, na comparação com igual período do ano passado ; quando bateu R$ 330 milhões.

Em muitas situações, não se trata apenas de falta de recursos. Especialistas chamam atenção para a necessidade de melhora da produvitividade do setor público, o que é um problema crônico no Brasil devido à dificuldade de punir quem tem desempenho insuficiente. Agora, com os cortes de recursos, a situação se agrava. Há avaliações de que isso esteja sendo usado para justificar, de modo consciente ou não, a ineficiência. É uma mistura de desalento com falta de dedicação proposital ; o que fica difícil de ser combatido no quadro de escassez e de dificuldades generalizadas.

Maria Ines de Souza Alves sabe o que é isso. Foi atualizar o endereço no posto de atendimento da Previdência Social, na Asa Sul. Do Jardim Mangueiral, onde reside, viajou em dois ônibus sob calor intenso. Às 14h30, recebeu a senha no posto. Foi atendida duas horas depois ; e quase teve que voltar. O atendente atualizou o endereço com dados errados. ;Ele estava muito desatento. Ainda bem que eu prestei atenção para não ter mais transtornos;, desabafa Maria Ines.

Fabíola de Souza Duarte, vai constantemente ao posto da W3 Sul para uma perícia de reabilitação profissional. Ela sofre de uma doença que afeta o formato e a espessura da córnea, provocando a percepção de imagens distorcidas e borradas. Assim, não trabalha há quatro anos. ;Em 2015, o INSS negou a minha aposentadoria por causa da idade. E, de seis em seis meses, continuo tendo que comparecer ao posto, porque o serviço de reabilitação profissional não pode ser agendado por telefone;, explicou.

Sindicalistas afirmam que as condições de trabalho são inadequadas. ;Falta de tudo: papel para imprimir processo, café, ar-condicionado e segurança nas agências, em um momento perigoso, em que se retiram direitos do trabalhador e o número de agressões a servidores cresce;, afirma Sandro Alex de Oliveira Cezar, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS).

;Raramente se veem filas. Tudo agora é virtual. As pessoas demoram de quatro a cinco meses para agendar um atendimento. Trocaram a fila real pela fila virtual. A população, agora, sofre em casa;, diz Cezar.

A tesourada nem sempre aparece à primeira vista. E, às vezes, o remanejamento de recursos fica mais caro para o governo, que deixar de cumprir a meta.

;O Programa de Fiscalização por Sorteio Público, do Ministério da Transparência e Controle (CGU), que envia auditores a municípios com até 500 mil habitantes para fiscalizar a aplicação de recursos federais, é o mais afetado com a escassez de recursos;, destaca Rudinei Marques, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores e Técnicos de Finanças e Controle (Unacon).

;Nos órgãos ambientais, os fiscais não conseguem trabalhar porque não têm gasolina para as viaturas. Mais grave é a situação do combate a endemias. A consequência pode ser a proliferação de doenças que já estavam erradicadas;, aponta Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef).

[SAIBAMAIS]A Polícia Rodoviária Federal (PRF) já não faz escoltas de cargas estratégicas e rondas. ;Só se faz atendimento a acidentes. Os assaltos a ônibus cresceram 550%; a cargas, 107%; e o número de mortes, 4%, entre julho de 2017 e julho de 2017;, conta Deolindo Carniel, presidente da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF).

A fiscalização do trabalho escravo não funciona desde maio e tem apenas R$ 6,6 mil em caixa. ;Em 21 de julho, denunciamos à OIT que o Brasil não está respeitando várias convenções de diretrizes de inspeção que ratificou; , conta Carlos Silva, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait).

As situações se repetem no setor de segurança. ;Até os contratos de manutenção de viaturas, passagens e diárias estão prejudicados. O orçamento de 2017 veio 50% inferior ao de 2016. E, em seguida, sofreu contingenciamento de 44%;, argumenta Luis Boudens, presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef). ;Várias missões serão abortadas por ordem da Superintendência, por falta de recursos para pagamento de diárias;, denuncia Éder Fernando da Silva, presidente do SinpecPF, que representa os administrativos da PF.

A economista Grazielle David, do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), destacou que nem sempre o corte nas despesas é aparente. ;As consequências dentro dos estados e municípios são graves. Algumas ficam escondidas porque os governadores, ao remanejarem os recursos, tiram sempre da educação e da saúde;, diz Grazielle.

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