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Entre a cama e a balança

Estar em forma é importante para a performance sexual? A resposta para essa pergunta não é simples, como atestou a Revista ao ouvir vários especialistas. O prazer, dizem eles, é uma experiência altamente pessoal

postado em 11/02/2011 18:23

Rafael Campos

Vaidade é bom, mas conteúdo é fundamental, afirma Manuella Cunha

Já reparou que os programas matinais de TV não se contentam em mostrar apenas receitas de deliciosos pratos calóricos? Alternando com o pecado da gula, sempre há aquele quadro especial com o mais novo exercício que vai deixar a barriga sarada, as pernas durinhas, os braços torneados ; enfim, seu corpo mais ;desejável;. A ditadura da magreza vai além de um índice de massa corporal saudável. O padrão midiático parece dizer: só os donos de músculos bem definidos estão aptos a ter uma vida sexual plena e realizada.

A contadora Manuella Cunha, 27 anos, compreende bem essa cobrança. Além de malhadora, tem aquela modernidade típica da geração Carrie Bradshaw, personagem do seriado Sex and the city. Ela percebe, porém, que muitos homens interessados só na aparência. ;Ainda há os que se apegam somente à imagem da mulher, que nos tratam como algo que deve ser exibido. Isso me incomoda muito;, desabafa. De sua parte, há outros interesses em jogo ; seja magro ou gordo, o importante é saber que o homem com quem ela se relaciona quer se cuidar e não perdeu a vaidade. ;E é preciso, acima de tudo, ter conteúdo. Não adianta nada um corpo bonito quando a boca fica o tempo todo fechada e não exista conversa.;

;A pressão por uma boa forma física acaba interferindo, inclusive, em outros aspectos da vida. Há uma cobrança exagerada de que a mulher pareça a Barbie e o homem, um super-herói;, afirma a psicóloga Juliana Paim. Em um mundo assim, o corpo parece ser um cartão de visitas. Nada mais equivocado, acredita a especialista, afinal, o desejo é algo muito mais complexo.

Também é importante lembrar que a libido femina tem mecanismos muito diferentes da masculina. O ginecologista Hugo Miyahira, membro da Sociedade de Ginecologia do Rio de Janeiro, garante que o homem é mais visual que a mulher, seja no que ele vê quando olha para o corpo da parceira, seja na criação do momento que levará ao êxtase. ;A mulher tem uma resposta sexual muito influenciada pelo tato. Você pode por uma boa música, ter um bom vinho, mas se não souber tocá-la, não vai gerar uma resposta;, garante.
O visual, contudo, só garante o estímulo masculino no começo. O policial civil André Cordeiro, 42 anos, diz que é natural, entre os homens, essa análise do corpo feminino. ;Mas, com o tempo, o relacionamento pede outras coisas, como um bom caráter, por exemplo.; André, que faz parte do ala masculina sarada, explica que pratica esporte desde os 13 anos e não vê nos exercícios uma arma de conquista. ;Para mim é um hábito. Se isso agrada minha parceira, que bom, mas penso primeiro na minha saúde.;

O grande X da questão é que uma ;boa performance; está relacionada à autoestima. E esta pode ser mais difícil de cultivar do que um belo bícepes. Mais cobradas, as mulheres mulheres querem se sentir lindas também durante a relação. ;O aspecto psicológico é importantíssimo e o desempenho sexual é diretamente afetado por ele. Se você se julga mal, direciona sua perfomance ao que pensa ser e não ao que é de verdade;, destaca Hugo Miyahira.

Sem tesão não há solução
Há gordinhas cheias de disposição para o sexo, lembra a redatora Janaína Calaça

Em resumo: os aspectos psicológicos são mais importantes do que os físicos na hora de determinar quem é ;bom de cama;. Mas isso não significa que sedentarismo seja algo positivo para a vida sexual. De acordo com o urologista João Hipólito Pous, secretário geral da Sociedade Brasileira de Urologia, homens muito acima do peso terão sim problemas para ter uma relação satisfatória. ;Quem está obeso pode ter maior dificuldade em respirar e se locomover na cama, bem como mais tendência a diabetes, e problemas cardiológicos;, alerta. Além disso, o médico explica que o excesso de gordura no homem pode diminuir seu nível de testosterona, o que interferiria no desejo. ;O prazer vai se tornando trabalhoso e isso afasta a vontade de fazer sexo.;

O orgasmo, claro, não é um ato genérico. As definições gerais da medicina dão conta dos aspectos fisiológicos, mas as sensações são únicas para cada pessoa, bem como o que elas esperam que seja feito para alcançá-lo. O ginecologista Ricardo Cavalcanti, vice-presidente da Comissão de Sexologia da Sociedade Brasileira de Ginecologia, diz que a forma física tem influência para quem olha: se agradou aos olhos, um grande passo já foi dado rumo ao prazer.

;Existem os ideiais de beleza em cada cultura, que celebram desejos que não são individuais;, ressalta o expecialista. Esses ideais incutem uma homogeneidade que, como consequência, estimula a busca por padrões idênticos e criam teorias sobre o desejo de cada povo, como a que diz que o bumbum grande é uma unanimidade nacional. Isso, porém, não desqualifica as preferências pessoais. ;Não há essa ligação, porque cada prazer é único ; gordos ou magros podem ser felizes com suas sexualidades;, completa Cavalcanti.

E, como afirma o urologista João Hipólito, não há relação entre o peso e a capacidade de dar prazer. A linha entre o muito gordo e o ;alguns quilinhos a mais; não é clara ; e não existe fórmula para desvendar o prazer dos outros. A redatora Janaína Calaça, 28 anos, não tem qualquer problemas com o corpo. Fora do padrão esquálido das passarelas, ela acredita que a capacidade de sedução feminina está bem além do peso.

;As mulheres gordinhas precisam trabalhar sua autoestima independentemente de padrões, pois o que é regra hoje pode não ser amanhã. Há que se construir a personalidade independente desses fatores externos.; Janaína aponta atributos físicos vantajosos só para as mulheres com algum peso a mais, como o colo mais abundante e as coxas grossas. E garante: autoestima tem que existir tanto para magros quanto para gordos. ;Há gordinhas cheias de disposição para o sexo e magrinhas também. A diferença está na forma como cada uma se vê e não com o corpo propriamente dito.;

Para o publicitário Hugo Adejaime, um corpo perfeito não é garantia de bons momentos a dois

O publicitário Hugo Adejaime, 25 anos, concorda: o que vale para tornar o sexo inesquecível é atitude da parceira e não um corpo sarado. ;De que adianta ela ter um corpo perfeito e ser uma porta na cama?;, questiona. O profissional explica que era muito magro na adolescência mas que, quando adulto, viu seu corpo ganhar peso. ;Por isso tenho que conquistar com outros aspectos, como um bom papo. Para mim, sexo vai bem além da forma física, tanto para o homem quanto para a mulher;, diz.

"Quando as mulheres se tornam mais seguras de seus corpos, de sua personalidade, de seus pontos fortes, ser magrinha ou gordinha fica em segundo plano;, arremata Janaína Calaça. Ou, como diz a versão brasileira do sucesso Let;s do It (Let;s Fall in Love), de Cole Porter: façamos, vamos amar.

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