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Entrevista // Samuel Cirnansck

Famoso por seus belos vestidos de festa e de noiva, o estilista se orgulha do atendimento personalizado que dispensa a suas clientes

Flávia Duarte
postado em 14/04/2013 08:00

Famoso por seus belos vestidos de festa e de noiva, o estilista se orgulha do atendimento personalizado que dispensa a suas clientes

É sua primeira visita a Brasília?
Não lembro a ocasião nem o ano que vim a Brasília, mas já conhecia. Brasília é uma cidade muito específica para quem vem de fora, especialmente para o paulistano. A gente vê Brasília como uma cidade completamente diferente do resto do Brasil. É um enigma. O que nós pensamos da cidade é que as pessoas trabalham aqui e vão embora no fim de semana. A última vez que estive aqui perguntei no hotel se dava para usar sauna e eles disseram que só até quinta. ;A gente não tem hóspedes no fim de semana. Vocês são os únicos no hotel;, responderam. Aqui, tem coisas pitorescas.

Você já declarou mais de uma vez que tudo pode virar inspiração para moda. Brasília é inspiradora?
Muito. Acabei de ver uma imagem da Catedral, que tem aqueles anjos suspensos. Aquilo é incrível, o vidro, as transparências... É linda esta imagem da arquitetura da cidade pensada. Isso é muito bacana.

Suas peças são vendidas em algumas lojas multimarcas da cidade. Como você define a cliente daqui?
Ela é sofisticada, conhece de moda, de roupa, como outra de qualquer lugar do Brasil. O gosto é o mesmo. Tanto que trouxe casacos para cá e me disseram que aqui é muito quente, mas as mulheres viajam muito, estão em lugares frios. Elas têm essa cultura internacional.

Você ficou conhecido por fazer vestidos de noivas. Considera-se um precursor?

Não gosto muito de me autodenominar, colocar rótulos, mas não me lembro de marcas e pessoas falando de noivas. Não me lembro nem de o mercado estar aquecido quando comecei. Era até meio cafona no meio da moda falar de noiva e hoje é normal, o mercado está mais aberto. É legal saber que você fez parte desse movimento.

Seu forte é o atendimento personalizado em seu ateliê em São Paulo. Por que fez essa opção?
Quando tinha meus 9,10 anos, sempre imaginei que o mercado ia ser voltado para a pessoa. Um lugar para alguém me paparicar, cuidar de mim, massagear meu cabelo. Isso é o que o ser humano quer. Quando você compra uma roupa, compra atendimento, uma hora que vai conversar com alguém que acha bacana, que você vai desabafar.

E você sempre as ouve?
Ah, estou lá para isso. Para atender a mulher e todo seu mundo (risos). É a primeira vez dela, mas não é a minha. Você precisa de um profissional para dizer que vai dar tudo certo e que, se não der, a gente vai arrumar. É um problema a menos no mundo incrível das mulheres. Quando você entende que tem um ateliê de costura para vestir mulheres que vão a festa, que é um momento especial, você já está sendo agraciado por participar desse momento dela.

No ateliê, as roupas são personalizadas?

Essa é a vantagem de ter um ateliê. Há coisas que incomodam a mulher e você consegue mudar, pode brincar com a peça. Ela diz que gosta de um volume, de um bordado, de construção. Ela monta o vestido. Também faço roupa dos desfiles, mas, se o vestido for muito marcante, faço um em cada capital. Os outros, faço dois ou três, no máximo, mas, geralmente, mudo algum detalhe: a saia, um tecido.

Os estilistas reclamam que fazer moda é caro;
Fazer roupa é muito difícil no Brasil. Comprar tecido é muito caro. Hoje em dia, o cliente é muito exigente, o que não é diferente da minha época. Tem muita roupa no mercado, muitas peças importadas. Brasileiro é acostumado a pagar caro em tudo, então ele não vê muita diferença em uma roupa barata lá fora e outra cara aqui. Lidar com esse mercado e trazer esse cliente para você, às vezes, é muito cruel, mas acredito que tem espaço para todo tipo de roupa.

E como você superou essas dificuldades?
Com uma administração competente, focada no financeiro, nas contas a pagar e em todos os encargos que nós temos no Brasil. Não adianta só ter a ideia. Tem que vender. O que me fez ter uma empresa com 40 funcionários, vendendo, acho que é resultado de ser sério. É importante ser empreendedor, empresário, ao mesmo tempo, e criador. Os meus primeiros dois desfiles paguei com meu próprio dinheiro e, depois, tive ajuda de custo do Amni HotSpot, de R$ 20 mil, de seis em seis meses. Assim, eu conseguia comprar tecido, pagar os funcionários e fazer a coleção.

Com a morte da Clô Orozco, muitas pessoas levantaram a hipótese de uma desilusão com a moda. Acredita que, como ela, alguns estilistas estão desiludidos?
Existe uma desilusão quando você chega a uma certa idade e percebe que tem que trilhar o dobro. Então, você se pergunta o que fez até agora. As pessoas infelizes não mudam seu eu e preferem tentar mudar a realidade. Por isso, ficam infelizes. Existem, no mundo do artista, essas lacunas. Quando a gente lida com criadores, que executam trabalhos visionários, estamos lidando com pessoas que têm uma sensibilidade diferente. E nós não temos esse cuidado com o artista no Brasil. Aqui, tratam o artista como um operário, que tem que bater cartão, fazer aquilo e voltar. Não é bem assim. O artista tem um ecossistema mental que faz parte de um equilíbrio para a obra sair. Você pode se desiludir e virar a página ou definir que não consegue e acabou aqui. E acabou tudo: a família, o trabalho e não só a moda. Pra mim, ela (Clô Orozco) era a melhor prêt-à-porter do Brasil, o que tinha de mais chique, de mais refinado. Ela fazia o que a mulher no Brasil mais precisava ter. Ela fazia uma roupa simples, usual e necessária. Quem era chique ficava mais chique ainda. É uma pena!

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