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A melhor proteção possível

Dois projetos universitários incentivam a prática de atividades físicas entre diabéticos. O hábito melhora muito a qualidade de vida dos pacientes

postado em 07/06/2015 08:00

Os participantes do programa se reúnem sempre às quartas-feiras

O diabetes é um vilão conhecido de muitos brasileiros. Apesar disso, é rara uma atitude preventiva. As pessoas com a doença só começam a rever os hábitos a partir do diagnóstico. Quando essa confirmação chega, normalmente, é iniciada a administração da insulina e de remédios, que acompanham o indivíduo até o resto da vida. Sem outra alternativa ou mais informações.


O fisiologista do exercício e doutor em ciências da saúde Alexandre Gonçalves confirma que as intervenção feitas na saúde brasileira têm foco no tratamento e não na profilaxia. Para ele, o quadro já mudou muito, mas, ainda assim, temos uma grande deficiência na abordagem de males crônicos. A diabetes é um exemplo de que o controle dos sintomas vale a pena. "Uma vez diabética, a pessoa terá que se adaptar à nova condição", define.

Existem duas formas de a diabetes se manifestar. A tipo 1 é autoimune, ou seja, os anticorpos reagem contra as células do pâncreas, o que afeta a produção de insulina. Por isso, o sujeito não consegue transformar o açúcar dos tecidos musculares em energia, acarretando no acúmulo de glicose no sangue. Como é uma alteração do sistema imunológico, o indivíduo tem que regularizar o hormônio, portanto a insulina deve ser aplicada diariamente.

A tipo 2 abrange os casos em que há resistência do organismo em produzir a quantidade certa de insulina. Sua principal causa é a obesidade central: a distensão da circunferência abdominal, a partir de 88cm nas mulheres e 102cm nos homens, tem relação direta com a gordura interna nos órgãos. "O corpo tem a presença da substância, mas não ocorre o efeito desejado. A tendência é que surjam complicações, como a hipertensão, doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer", alerta Alexandre Gonçalves. Para combater esse quadro, além do cuidado com uma alimentação balanceada, o diabético deve se exercitar diariamente.

"Estudos mostram que a movimentação do corpo, mesmo sem a diminuição do peso, é capaz de melhorar a captação da glicose, para que o hormônio faça o seu trabalho de maneira mais fácil", informa o profissional. Durante o exercício, o organismo "queima" glicose. Isso diminui a concentração da substância no sangue de quem tem diabetes e, para quem não tem, ajuda a não acumular. O benefício é alcançado com uma mescla de exercícios de força, que aumentam a massa muscular, com atividades aeróbicas. É importante ter a orientação de um avaliador físico para que sejam observadas particularidades do organismo da pessoa.

Alinhado a essa abordagem, o Projeto Doce Desafio, na Universidade de Brasília, une atividade física, alimentação e o contexto psicossocial. "Propomos que o indivíduo resgate o seu estilo de vida, pois na genética não podemos mais mexer", explica Aline Nunes, engenheira de alimentos da farmácia e a vice-coordenadora do programa. O projeto recebe os participantes para que eles meçam as suas taxas (basta uma gotinha de sangue) e verifiquem se podem ou não fazer a atividade física naquele dia. Há o preenchimento de uma ficha, quem for autorizado faz a aula; quem não puder fica assistindo. Depois, o grupo participa de palestras sobre algum tema relacionado a diabetes. No fim, eles refazem o teste de glicemia e comparam com o primeiro.

Todos sentem-se satisfeitos com o que assimilam nos encontros semanais. Maria Ferreira de Oliveira tem 61 anos e há 10 descobriu a diabetes. Ela conta que os exercícios melhoram a sua disposição. Às vezes, fora do projeto, se arrisca a manter a rotina esportiva com caminhadas. Além disso, todo o conteúdo aprendido é usado no dia a dia. "É impressionante como eu chego com a glicose alta e saio com ela baixa. A pressão diminui também. Tudo se normaliza", diz, sorridente. Sua única reclamação é não ter os encontros com mais frequência (são semanais).

De acordo com Aline Nunes, pessoas com informações vagas sobre a doença e uma estrutura social e emocional frágil tem poucas chances de aderir ao tratamento. "A legislação garante remédios, mas não dispõe de orientações adequadas. Os medicamentos deveriam ser adaptados ao modo de vida do paciente, mas isso é difícil implantar porque não dá dinheiro", protesta. Durante um tempo, o Doce Desafio foi replicado em centros de saúde de Samambaia, Sobradinho, Ceilândia e Paranoá, mas não houve continuidade por conta de dificuldades estruturais e burocráticas. O mesmo se passou com o projeto Salvando o pé diabético, primeiramente implantado pela médica endocrinologista Ermelinda Pedroza, no Hospital Regional de Taguatinga e, posteriormente, reproduzido na clínica-escola da Universidade Católica de Taguatinga, com o nome de Atendimento aos diabéticos.

Coordenadora do programa na Católica, a fisioterapeuta Érika Gomes menciona a importância das atividades. "Estamos trabalhando com pacientes que provavelmente terão complicações graves, por exemplo, a amputação de um membro ou a cegueira, caso não se cuidarem. Temos chance de diminuir esses riscos." A proposta é fazer avaliações físicas do paciente pré-diabético e diabético para rastrear pontos como sua força muscular e alterações de sensibilidade. A partir disso, são prescritos métodos para proteger a pessoa e começa-se o treino físico em cima das dificuldades apresentadas. A intenção do projeto é que o paciente ganhe autonomia, comece a desenvolver o trabalho em casa e receba alta, para dar a vez a outra pessoa.

Serviço

Atendimento aos diabéticos
Segundas, quartas e sextas-feiras, de 8h às 11h30, na clínica-escola de fisioterapia da Universidade Católica de Brasília, na unidade de Taguatinga. Para se inscrever, o interessado deve comparecer no local com os exames, avaliações e autorização do médico em dia. O cadastro é feito na hora.

Programa Doce Desafio
Às quartas-feiras, das 8h às 10h e das 14h às 16h, no Centro Olímpico da Universidade de Brasília. Telefone: (61) 3107-2556 E-mail: docedesafio@gmail.com

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