Maria Irenilda Perreira/Estado de Minas
postado em 05/04/2018 10:27
A dona Vilma vai ficar. A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) decidiu suspender a ação de despejo contra Vilma Eustáquia da Silva, de 73 anos, e ceder a moradia enquanto ela for viva. ;Pedimos ao juiz a suspensão da execução que se daria agora em maio. E, paralelamente, nós estamos iniciando um processo de cessão do imóvel para dona Vilma enquanto ela for viva, considerando a situação dela de não ter recurso de adquirir ou alugar outro imóvel;, informou o Procurador-Geral do Município, Tomáz de Aquino Resende. O pedido foi deferido pelo Juiz Rinaldo Kennedy Silva, ontem.
A decisão veio um dia após o Estado de Minas publicar uma reportagem exclusiva sobre o drama da idosa, que seria despejada do imóvel onde sempre viveu no Bairro São Pedro, Região Centro-Sul de Belo Horizonte. Corretoras que atuam no bairro avaliam que o terreno atualmente custe entre R$ 800 mil a R$ 1 milhão. A história de dona Vilma, contada em texto e vídeo, causou comoção e revolta nas redes sociais. Até a publicação deste texto, o vídeo já tinha sido visto por mais de 40 mil pessoas, com mais de 1,3 mil compartilhamentos, 3 mil reações e mais de 500 comentários nos perfis do jornal.
A repercussão do caso teve efeito quase imediato na cúpula da administração municipal, conforme relata o procurador. ;(Prefeito) Alexandre Kalil me ligou pra saber da situação e determinou que a gente achasse uma solução. Pediu que, se possível, não tirasse a dona Vilma do imóvel;, contou o promotor. De acordo com ele, um grupo de advogados já analisavam o caso há aproximadamente 10 dias. Na internet, a hashtag #DonaVilmaFica já reunia manifestações de indignação desde o começo de março.
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A notícia da suspensão da ordem de despejo foi comemorada por Dona Vilma e filhos. ;Estou mais aliviada, mais tranquila, mas ainda continuamos na luta. Peço a Deus que eles pensem bem porque não são 20 anos, são 100 anos da nossa família aqui;, declarou a idosa. Já para a filha de Vilma, Heloíza Helena, a decisão favorável da Justiça a pedido da PBH, reacende uma esperança de diálogo. ;A decisão de hoje demonstra sensibilidade tanto do Judiciário como da prefeitura. Vínhamos nos últimos meses muito angustiadas, muito aflitas. Então isso nos dá esperança, nos mobiliza a dormir um pouco mais em paz. Continuamos acreditando na possibilidade de diálogo com a prefeitura;, disse.
Conforme o procurador, a decisão tomada pela pela PBH tem respaldo legal. ;A lei permite que o município ceda imóvel de moradia para as pessoas pobres. Dentro dessa possibilidade, o que o município vai fazer é isso: trancar o processo e ceder a moradia;, explicou. Dona Vilma não tem documento de compra do imóvel, mas dispõe de guias de IPTU pagas desde a década de 1920, o que, para juristas ouvidos pelo EM, poderiam provar a posse.
O Coletivo de Advocacia Popular Maria Felipa, que defende Dona Vilma, diz que a decisão judicial que suspendeu o despejo é frágil. ;Ela é um acordo entre a promotoria e município, que suspende temporariamente a decisão e não entra no mérito da questão. Vamos continuar com as ações para que seja reconhecido o direito de propriedade da dona Vilma;, informou Eduardo Levi, representante do Coletivo.
O caso
Dona Vilma nasceu numa família de operários que ajudaram a calçar as ruas de pedra de Belo Horizonte no início do século 19. Àquela época, segundo a idosa, o pai, José Rodrigues da Silva, comprou o terreno de 354 metros quadrados, onde construiu a casa de quatro cômodos que deixaria de herança para os 10 filhos.
Em 27 de fevereiro deste ano, a moradora recebeu com susto e apreensão uma determinação de despejo da casa onde sempre morou. A Justiça determinou que ela e dois filhos saíssem da casa, sob pena de uma multa diária de R$ 50 após o vencimento do prazo ; que expira no fim de maio.
O transtorno começou com uma ação ajuizada pela Prefeitura de Belo Horizonte em 2013, na qual o poder público afirma que a família Silva ocupa ilegalmente o imóvel, que seria de propriedade do município. Além da reintegração de posse, a ordem judicial, julgada em junho de 2017 pelo juiz Rinaldo Kennedy Silva, da 2; Vara da Fazenda Pública Municipal, mandava demolir a casa e o barracão construídos no lote.