Cidades

Relatório aponta que 9 pontes e viadutos do DF estão com riscos estruturais

Assim como em 2012, relatório do tribunal indica necessidade de intervenções imediatas em algumas obras do Plano Piloto. Defeitos que acarretaram o desabamento do viaduto do Eixão estão presentes em quase todas as estruturas analisadas

Augusto Fernandes
postado em 19/12/2018 12:14
Viaduto da Galeria dos Estados
Há pouco mais de 10 meses, quando o viaduto no Eixão Sul sobre a Galeria dos Estados desabou, veio à tona um relatório divulgado em 2012 pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF). O documento apontava sobre a necessidade de reparos urgentes em 13 pontes e viadutos espalhados pela capital federal. O trecho do Eixão que caiu, por exemplo, era um dos pontos que precisava de manutenções. A tragédia acendeu um sinal de alerta sobre as outras 12 estruturas e o tribunal fez mais uma avaliação das edificações. O novo documento mostra que a situação continua delicada: nove pontes e viadutos ainda apresentam defeitos.

Os locais em risco são: a Ponte do Bragueto; a Ponte Costa e Silva; a Ponte das Garças; o viaduto do Eixo W, sobre a via N2; o viaduto do Eixo L, na altura da 215/216 Norte; o viaduto do Eixo W, na altura da 115/116 Norte; o viaduto do Eixo L, na altura da 203/204 Sul; o viaduto do Eixo L, na altura da 215/216 Sul; e a passagem de pedestres subterrânea entre as quadras 115/116 e 215/216 Norte.

De acordo com o TCDF, passados mais de seis anos do primeiro relatório, a necessidade de intervenções nestes pontos permanece imediata. "Tal situação fica mais evidente quando se percebe que vários bens públicos objeto da auditoria realizada em 2012, até a presente data, não apresentam evidências de que sofreram alguma intervenção de manutenção ou conservação. A maioria dos processos de deterioração desenvolve-se gradualmente, desse modo, deve-se identificar, diagnosticar e solucionar os problemas antes que atinjam proporções graves ou que resultem em custos financeiros e sociais elevados", alerta um trecho do documento.

O relatório deste ano identificou uma série de problemas nas edificações em questão. Entre os defeitos, estão: armaduras expostas; buracos; fissuras; trincas; desagregação do concreto nos pilares, nas vigas, nas lajes e nas fundações; desgastes; deformação da infraestrutura; ondulações e desníveis no pavimento; ausência de fixação dos guarda-corpos; abertura nas juntas de dilatação; ausência de tampa de bueiro e equipamentos mal instalados nas calçadas; descolamento de placas; oxidação do aço e da estrutura; e marcas de infiltração. Os dois últimos, segundo avaliação da Universidade de Brasília (UnB), foram os principais motivos do desabamento no Eixão Sul.
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No documento, o tribunal cobra "atuação ativa dos responsáveis para a efetiva conservação dos bens públicos", em especial, do Executivo local. "A questão da conservação dos bens públicos relaciona-se mais com as estratégias de atuação e alocação de recursos a nível de governo central do que com a realização de atividades pontuais das secretarias ou entidades descentralizadas. Qualquer bem público sem a devida manutenção permanente oferece riscos aos usuários."

Ações


O TCDF deu um prazo de 90 dias a partir da publicação do relatório, em 21 de junho, para que o GDF apresentasse um plano de implementação contendo medidas para corrigir as situações verificadas na auditoria da Corte. O governo enviou o documento ao tribunal em 4 de setembro, especificando que o projeto de conservação e manutenção seria adotado pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER) e pela Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap).

Diretor-presidente da Novacap, Júlio Menegotto disse à reportagem que a estatal conta com um cronograma de execução de obras, recuperação estrutural e reformas em pontes e viadutos que abrangem não apenas as edificações apontadas pelo TCDF. Ele garantiu que, apesar do novo alerta do tribunal, as obras são monitoradas constantemente. "Semanalmente, fazemos vistorias para identificar qualquer tipo de alteração. Hoje, elas estão em perfeitas condições e não existe nenhum risco iminente", diz Menegotto.

O presidente do órgão lembrou também que, desde 2015, a Novacap investiu quase R$ 115 milhões na construção ou reformas de pontes e viadutos. No momento, aproximadamente R$ 50,7 milhões estão em fase de contratação. Parte desse dinheiro será utilizado em algumas obras que aparecem no documento do Tribunal de Contas. "Vamos divulgar nesta semana a licitação para contratar uma empresa que vai reformar os viadutos que passam por todas as tesourinhas do Plano Piloto, não só as do relatório. O projeto já foi autorizado e aprovado pelo Iphan [Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional]. Além disso, vamos anunciar em alguns dias a empresa que fará reparos no viaduto do Eixo W sobre a via N2. Aos poucos, estamos cuidando de todos eles;, observou.

Omissão


O relatório do TCDF classifica que a negligência do governo local em não tomar medidas protetivas foi determinante para o desabamento de fevereiro. "A omissão do poder público relativamente à manutenção dos diversos bens públicos implica a diminuição da vida útil das edificações, causa transtornos aos cidadãos e custos adicionais em serviços de recuperação ou construção. Não foi por outro motivo que, a despeito do alerta feito ao Governo na auditoria [de 2012], sobre a necessidade urgente de reparos, houve o desabamento do viaduto.;
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) apura eventuais responsabilidades por ato de improbidade administrativa por dano ao erário causado pela omissão na preservação do viaduto. As investigações continuam em andamento e se desenvolvem em conjunto com as apurações da Divisão de Combate aos Crimes Contra a Administração Pública (Dicap), da Polícia Civil. Além disso, o órgão instaurou procedimento administrativo com o objetivo de acompanhar as medidas tomadas pelo Governo para implantar política pública de preservação permanente de todas as obras de artes especiais (pontes, viadutos etc) do Distrito Federal para evitar novos desabamentos.
Júlio Menegotto, contudo, refutou a afirmação. "Quando falamos em manutenção de pontes e viadutos, temos que voltar 30 anos na história. Nenhuma obra chega em estágio de comprometimento ou de urgência de conservação em apenas quatro anos. Ela leva anos em fase de deterioração e degradação. É difícil falar em omissão do Estado, pois nesta gestão, fizemos muita coisa. Hoje, existem mais de 700 pontes e viadutos no Distrito Federal. É um universo grande. Nós não nos omitimos, apenas demos prioridade ao que era mais importante", explicou.

Apesar disso, o presidente-diretor da Novacap reconhece que Brasília carece de melhores investimentos para reparos em pontes e viadutos. "O desabamento no Eixão mostrou que nós devemos investir um valor maior. Se tivermos um plano para os próximos 10 anos, por exemplo, que consiga atingir todas as pontes e viadutos que existem no DF, é possível avançar de maneira mais efetiva", analisou Júlio Menegotto.
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"Situação crítica"


O Correio visitou as 12 pontes e viadutos listados pelo TCDF junto ao engenheiro civil especialista em patologia das construções do Instituto de Educação Superior de Brasília (IESB), Matheus Leoni Martins. Segundo ele, mesmo as obras que não apresentaram defeitos relevantes na auditoria ; o estacionamento CNB (em frente ao Shopping Conjunto Nacional), o viaduto sobre o Buraco do Tatu no sentido norte/sul e o viaduto DF-002 sobre a via S2 ; precisam de cuidado.

"Pelo menos uma intervenção mínima. O responsável pela jurisdição de cada uma dessas pontes e viadutos teria que enviar uma equipe de engenharia aos locais e fazer uma avaliação minuciosa. O correto seria no mínimo uma vistoria por ano para mapear os defeitos e apontar quais são as intervenções necessárias. O que não pode é deixar os problemas se acumularem até chegar à situação de calamidade pública", alertou.

Na avaliação de Matheus Leoni, são necessárias medidas corretivas e preventivas. "Tem que ser criado um programa de governo relacionado à manutenção, com atitudes de curto, médio e longo prazo. Recuperar a estrutura das que estão em condições mais críticas seria o primeiro passo. Após isso, estabelecer medidas de conservação periódicas", sugeriu o especialista.

Segundo ele, o relatório do TCDF não pode ser deixado de lado. "Pouca coisa mudou de 2012 até aqui. Aquele primeiro documento já apontava riscos. As obras não estão recebendo o cuidado necessário. O pior de tudo é que não é uma ou duas edificações. São várias. Se analisássemos outras além das indicadas pelo tribunal, também encontraríamos problemas. O governo não pode esperar outro desabamento para mudar a sua atitude", frisou.

Memória


Na manhã de 6 de fevereiro, parte do viaduto sobre a Galeria dos Estados, no Eixão Sul, desabou. Ensaios e análises feitos pelo Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Faculdade de Tecnologia da Universidade de Brasília (UnB) apontaram que infiltração de água e desgaste do aço foram os responsáveis pela queda.

Desde então, o tráfego no local foi alterado: duas pistas de ligação foram criadas para desviar o trânsito dos setores Bancário e Comercial Sul. Em 24 de setembro, a Via Engenharia iniciou a obra de reconstrução, estimada em R$ 10,9 milhões. Segundo o Departamento de Estradas e Rodagens (DER), responsável pelo viaduto, 18% da obra está concluída, e ela deve ser finalizada em 1; de março.
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Radiografia


Confira como estão as 12 obras vistoriadas pelo TCDF neste ano. O Correio foi a todas com o engenheiro civil especialista em patologia das construções Matheus Leoni Martins

Ponte do Bragueto - necessidade de intervenções imediatas
Ponte do Bragueto
>> Marcas de infiltração, armadura exposta, oxidação do aço, buracos, fissuras, trincas, deformação, ondulação, desplacamento de cobrimento dos guarda-corpos, abertura na altura da junta de dilatação, desagregação do concreto e acessos com desnível. Na data da visita, o local encontrava-se em obra para a implantação do Trevo de Triagem Norte.

Ponte Costa e Silva - necessidade de intervenções imediatas
Ponte Costa e Silva
>> Marcas de infiltração, armadura exposta, buracos, fissuras, trincas, deformação, ondulação, desagregação do concreto, acessos com desnível, desgastes, trilhas de roda e equipamentos mal instalados.

Ponte das Garças - necessidade de intervenções imediatas
Ponte das Garças
>> Marcas de infiltração, armadura exposta, oxidação do aço, buracos, fissuras, trincas, deformação, ondulação, abertura na altura da junta de dilatação, desagregação do concreto, acessos com desnível, trilhas de roda, ausência de fixação na base e ausência de tampa de bueiro. ;Um dos problemas mais graves é a armadura exposta nos pilares de sustentação. Se a ligação entre o pilar e a fundação da ponte não existe, a falha é enorme;, avaliou Matheus Leoni.


Viaduto do Eixo W sobre a via N2 - necessidade de intervenções imediatas
Viaduto do Eixo W sobre a via N2
>> Armadura exposta, desagregação do concreto, marcas de infiltração, fissuras e descolamento de placas. ;Este é o viaduto com as piores condições, devido ao seu tamanho e utilização, e precisa de uma manutenção ainda mais imediata do que os demais. É perceptível que o aço das armaduras já está corroído. Além disso, há diversas fissuras que cruzam toda a estrutura da laje;, disse o especialista.


Viaduto do Eixo L na altura da 215/216 Norte - necessidade de intervenções imediatas
Viaduto do Eixo L na altura da 215/216 Norte
>> Armadura exposta, fissura no concreto, desagregação do concreto e deslocamento excessivo. ;Armadura exposta pode significar que ela perdeu cessão. Caso isso tenha acontecido, a armadura precisa ser trocada;, contou Matheus Leoni.


Viaduto do Eixo W na altura da 115/116 Norte - necessidade de intervenções imediatas
Viaduto do Eixo W na altura da 115/116 Norte
>> Fissura, desagregação do concreto, armadura exposta, oxidação do aço, abertura e marcas de infiltração.


Viaduto da DF-002 sobre a via S2 - não apresentou defeitos relevantes
Viaduto da DF-002 sobre a via S2
>> Marcas de infiltração, fissura no concreto e armadura exposta. ;As infiltrações precisam ser controladas, pois podem corroer a armadura. Com isso, a estrutura passa a não absorver a carga da forma que absorvia antes. Sobrecarrega alguns pontos mais do que outros. Quanto mais tempo a água ficar dentro da estrutura, maiores serão as chances de corrosão;, explicou o especialista.


Viaduto sobre o Buraco do Tatu no sentido norte/sul - não apresentou defeitos relevantes
Viaduto sobre o Buraco do Tatu no sentido norte/sul
>> O viaduto passou por obras recentemente e não apresentava nenhum defeito aparente na data da visita.


Viaduto do Eixo L na altura da 203/204 Sul - necessidade de intervenções imediatas
Viaduto do Eixo L na altura da 203/204 Sul
>> Deterioração do revestimento, desagregação do concreto, armadura exposta, manchas de infiltração e oxidação do aço. ;Há também armadura corroída. O concreto já está comprometido, mas quando a estrutura começa a perder aço, é mais perigoso. A sorte deste viaduto, e de muitos outros da capital, é que ele tem uma estrutura mais robusta. É superdimensionado. Foi projetado com um coeficiente de segurança para aguentar um peso maior do que o necessário;, apontou Matheus Leoni.


Viaduto do Eixo L na altura da 215/216 Sul - necessidade de intervenções imediatas
Viaduto do Eixo L na altura da 215/216 Sul
>> Deterioração do revestimento, desagregação do concreto, manchas de infiltração, fissura, armadura exposta, oxidação do aço e deslocamento de placas.


Passagem de pedestres subterrânea na DF-002 entre as quadras 115/116 e 215/216 Norte - necessidade de intervenções imediatas
Na foto, Professor Matheus Leoni analisa as condições da estrutura do viadutos de Brasília
>> Descolamento de revestimento, fissuras, oxidação do aço, marcas de infiltração, corrosão dos corrimões, descontinuidade, componente desafixado, desagregação do concreto, deformação de piso, má fixação da drenagem, obstrução, trincas, luminária quebrada, ausência de lâmpadas e mal funcionamento.


Estacionamento CNB - não apresentou defeitos relevantes
Estacionamento CNB
>> O estacionamento passou por obras recentemente e não apresentava nenhum defeito aparente na data da visita.

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