Segundo Ângela Maria dos Santos, delegada-chefe da Delegacia Especial de Repressão aos Crimes por Discriminação Racial, Religiosa ou por Orientação Sexual ou contra a Pessoa Idosa ou com Deficiência (Decrin), o crime foi um caso claro de tentativa de homicídio. Mas esse não foi o entendimento da Justiça. "O juiz entendeu que não era tentativa de homicídio, o que exclui o Tribunal de Júri, e negou o pedido de prisão preventiva", explicou.
O caso está agora na 1; Vara Criminal de Taguatinga e é tratado como crime de lesão corporal grave ou gravíssima por motivo de homotransfobia. O laudo ainda não foi concluído e, por isso, ainda não se sabe a o grau da lesão. No caso de lesão grave, a pena prevista é de 1 anos a 5 anos.
Crime
A reconstrução do caso feita pela polícia indicou versão conflitantes entre os depoimentos dos autores da agressão, 37 e 38 anos, e as travestis, de 18 e 27 anos de idade. Imagens obtidas pela polícia, contudo, confirmam a versão das vítimas.
A delegada conta que as travestis não procuraram a polícia por sentirem medo. Já os dois homens envolvidos chegaram a procurar a 21; Delegacia de Polícia (Taguatinga Sul), após a divulgação do vídeo da agressão, para contar suas versões.
"Elas estavam trabalhando quando foram abordadas por dois rapazes e combinaram um programa sexual. Foram para o motel de carro com eles e programa de fato ocorreu, mas na saída eles não conseguem pagar toda a conta e ficam faltando R$ 12", relatou a delegada. Imagens de câmeras de segurança do motel mostram um dos homens deixando um relógio como garantia. Confira no vídeo.
A delegada detalha que, durante toda a ação, os homens proferiram palavras ofensivas para as travestis. ;Palavra muitos grosseiras se referindo as questões transexuais e homosexuais como se elas não tivessem o direito de ser mulheres.;
Na versão dos autores, eles estariam bebendo próximos ao local e foram abordados pelas travestis, que teriam entrado no carro e demandado a realização de um programa. A polícia informou ainda que, dias após o ocorrido, um dos autores, o dono do carro branco que aparece nas imagens, entrou com pedido no departamento de Trânsito do DF (Detran-DF) para solicitar a mudança de cor do veículo.
;Temos a informação das vítimas que após as agressões, um dos dos autores ficou rondando o local com tom ameaçador. Por isso, elas pararam de frequentar o lugar, que é seu local de trabalho;, acrescentou a delegada. No entendimento da polícia, pelo ocorrido ter tido grande repercussão, ter afastado as vítimas de seu trabalho e por um dos autores estar procurando as vítimas de forma intimidatória, a prisão preventiva deveria ser solicitada.
Os investigadores chegaram ainda a localizar as duas unidades de saúde em que um dos agressores procurou ajuda por conta de um corte na mão. Nos dois locais, deu motivos conflitantes para explicar o ferimento.
Preconceito
Para Ângela Maria, os entendimentos conflitantes da polícia e da Justiça levantam uma questão importante relacionada ao preconceito no tratamento dos casos relacionados as questões de gênero. "para tratar do caso se não é uma delegacia especializada que tenha um olhar diferenciado, tende-se a diminuir os casos por conta do preconceito que temos", opinou. Ela defende uma maior capacitação para as autoridades para transmitir o entendimento de que existem grupos marginalizados vulneráveis na sociedade.
"É um trabalho que tem que ser feito para mudar a cultura tanto da polícia, do Ministério Público, do Judiciário, quanto da sociedade em geral. É necessário que haja uma mudança de paradigma para um olhar mais compassivo", concluiu.