Belo Horizonte ; Fadiga de material e excesso de carga não estão sozinhos na destruição das estradas brasileiras. Junta-se a esses fatores, que são mais comumente estudados, um importante agente natural e nunca antes levado em consideração, do ponto de vista acadêmico: o sol. Com essa premissa, a engenheira civil mineira Maria de Fátima Amazonas desenvolveu seus trabalhos de mestrado e doutorado, orientada pela professora Vanessa Lins, do Departamento de Química da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A conclusão foi de que a radiação solar contribui, sim, para a deterioração do asfalto.
;Há uma preocupação constante em se saber por que ocorre a deterioração do asfalto. O que se fala sempre é que a mistura asfáltica é danificada mais pela fadiga de material e excesso de carga. São fatores importantes. Mas esse estrago é agravado pelas intempéries, principalmente no Brasil, onde há grande insolação. Não havia nenhuma pesquisa a respeito disso, e eu quis provar que essa influência não é tão superficial quanto se acredita;, afirma Fátima, que decidiu estudar isoladamente o fator intemperismo para avaliar as consequências no envelhecimento do asfalto. ;Também existe uma preocupação com as características físicas e ensaios físicos, mas, quimicamente, não se sabe o que está acontecendo, e foi isso que eu procurei saber", acrescenta.
Depois de produzir a mistura asfáltica em laboratório (feita de brita, areia, pó de pedra e um ligante asfáltico), a engenheira civil separou cinco amostras (de 8cm de diâmetro por 3cm de espessura) e partiu para o envelhecimento acelerado, usando uma máquina de intemperismo. Ela manteve uma amostra virgem e as demais, respectivamente, foram envelhecidas por 500, 1 mil, 1,5 mil e 2 mil horas. Ela explica que, dentro da máquina, a temperatura foi a 60;C, oscilando em intervalos com jatos de água, que simulavam a chuva: ;Durante as 2 mil horas, houve ciclos de 80 minutos em que, durante 64 minutos era feita uma exposição à radiação de xenônio (similar ao da radiação solar) e, nos outros 16 minutos, à radiação e aspersão de água;. Os testes foram realizados em um laboratório de análise asfáltica do Departamento de Estradas e Rodagem de Minas Gerais (DER-MG).
O objetivo era verificar também o que ocorreria com o ligante asfáltico, que é o principal material aglutinante usado nos revestimentos de pavimentos no Brasil. No caso, foi usado o tipo convencional, que é o cimento asfáltico de petróleo (CAP), produto final da destilação do petróleo.
Processo de oxidação
;Visualmente, ao comparar as amostras (envelhecidas progressivamente), notamos que iam ficando cada vez mais esbranquiçadas e foram surgindo trincas superficiais, mas era preciso saber, quimicamente, o que estava acontecendo;, explica Fátima. Para isso, foram propostas metodologias de análise das amostras, segundo três diferentes métodos químicos.
O primeiro foi a análise do envelhecimento por meio de espectroscopia no infravermelho, que pode ser usado para identificar um composto ou investigar a composição química de uma amostra. Essa técnica possibilita saber se houve processo oxidativo. ;O que notamos foi que aumentou a proporção de grupos C=O (ligação dupla entre carbono e oxigênio) e O-H (ligação simples entre oxigênio e hidrogênio) em relação ao C-H (ligação simples entre carbono e hidrogênio), o que indica que houve oxidação;, afirma.
Em seguida, veio a análise térmica, que acompanha a perda de massa da amostra em função da temperatura. ;A análise térmica fornece informações sobre a estabilidade térmica do ligante, entre outras. O que ocorreu foi a diminuição da estabilidade térmica depois da exposição à radiação. A amostra envelhecida começou a perder massa a uma menor temperatura;, informa.
O terceiro método, a cromatografia de permeação em gel, dá a ideia da massa molar, ou seja, do tamanho das moléculas do ligante. Com o envelhecimento, houve uma tendência de quebra das moléculas e redução da massa. ;As moléculas se partem, ficam mais reativas e podem se unir e formar moléculas maiores, mais rígidas. Só que isso tende a fazer com que o ligante fique mais quebradiço e, consequentemente, a mistura asfáltica se torne mais propensa a trincas;, observa a engenheira.