Diversão e Arte

MC do Riacho Fundo lança primeiro álbum financiado pela venda de balinhas

'Gomadi Maskar' foi composto, gravado, mixado e masterizado por Rubens MC em um home estúdio montado com o dinheiro das vendas

Devana Babu*
postado em 06/04/2020 18:05 / atualizado em 08/10/2020 11:32
Foto tirada em 2 de abril de 2019, em uma praça do Riacho Fundo, uma ano antes de Rubens MC lançar o primeiro álbum financiado com o dinheiro das vendas de balinhas
O rapper do Riacho Fundo II Rubens MC lançou, na última quarta-feira (1º/3), o primeiro álbum da carreira: Gomadi Maskar. “Eu escolhi o dia 1º de abril para soltar o álbum porque, quando eu falei que ia fazer esse corre aí, nego desacreditou, tá ligado? Nego me tirou, falou que eu tava mentindo, então eu falei: ‘então pode crer, vou soltar no dia da mentira mesmo’”, explica o MC, que, para tornar reais as ambições artísticas, passou alguns meses vendendo doces na porta de escolas, em praças e nas batalhas de rap que frequentava.

Daí, o nome do álbum, que, lido em voz alta, soa como “goma de mascar”, em referência às jujubas, balinhas, chicletes, pirulitos e paçocas que vendia com os parceiros Ruan Ramon e Gabriel, com quem iniciou o pequeno negócio. Começou com uma caixinha de jujuba e outra de bala, que se tornaram duas caixinhas de cada, acrescidas depois das balinhas, pirulitos e paçocas e, por fim, se tornaram um home estúdio no qual ele mesmo gravou, produziu, mixou e masterizou as 10 faixas do álbum, com parcerias e participações de oito artistas.

“Não juntei a grana pra pagar estúdio para gravar não, porque, antes, eu queria gravar e altos nego ficava me tirando, dizendo que a música era paia, querendo moldar o jeito que eu ia fazer a música. O bagulho é underground total. Eu mesmo que produzi com as paradas que eu consegui montar”, orgulha-se, não por soberba, mas por brio artístico. “É que, querendo ou não, a galera que trampa assim quer seguir meio que uma padronização, e eu gosto mais do rolê experimental. Não gosto muito de coisa padronizada. O experimental é muito mais massa. Gosto da emoção do momento, da sensação de estar depositando tua própria emoção naquela parada que tu tá fazendo. Não é pré-moldado, não se trata de molde”.

O álbum está disponível apenas no YouTube. “Por enquanto, eu não tenho planos para lançar em outra plataforma, não. A maioria da galera que me ouve nem tem acesso a outra plataforma”, avalia, mas gostaria de lançar o trabalho em mídia física. “Ninguém ouve CD mais, hoje em dia, mas seria uma parada simbólica. Pra distribuir em batalha, em evento que eu for cantar, fazendo aos pouquinhos, distribuindo umas cinco por show. Ou fazendo uns kits promocionais para dar como premiação pra galera das batalhas”, especula. 



Rockstar


Fã de artistas como Raul Seixas, Tim Maia, Planet Hemp e outros clássicos do rock nacional, Rubens começou a trajetória musical no meio roqueiro. Com cerca de 13 anos, começou a aprender violão e, pouco depois, quando começou a aprender contrabaixo, foi convidado por um primo para participar de uma banda de colégio, a Quinto ÁZ.

A banda durou sete anos, com Rubens como guitarrista e compositor, em parceria com o vocalista Carlos Henrique. Porém, divergências criativas e ideológicas fizeram Rubens se afastar da banda e iniciar um projeto solo. “Eu sempre gostei de escrever, de fazer poesia, de compor música. Eu queria continuar compondo, mas não tinha mais uma banda pra tocar comigo”, conta, e pensou: “Já que eu não tenho banda, vou atrás de um instrumental e vou gravar minhas letras em cima dele”.

Frequentador do rolê punk, o MC também tinha um pé no rap. “Meu primeiro rap foi Vida loka parte 1 (dos Racionais MCs), como todo mundo. Planet Hemp é minha referência maior”, conta.

Começou a participar de batalhas de rima e, numa dessa, conheceu o MC Alkaida, que gravou os primeiros três sons de Rubens, lançados a partir de janeiro de 2019. Pouco depois, travou contato com Will Usy, “um mano de Taguatinga” que disponibilizou o home estúdio para que Rubens gravasse o primeiro EP, Rockstar, um trabalho conceitual com cinco músicas que formam uma espécie de narrativa. Com Will, Rubens integrou o grupo de rap Palace Mob e, produzindo o primeiro som da banda, teve a primeira experiência como produtor.

Um tempo depois, foi convidado por um amigo para ir ao espaço cultural Cio das Artes, em Ceilândia, no qual ocorriam algumas batalhas de rimas. Nesse dia, saiu vencedor e ganhou do Dj da noite, o produtor El KV, a gravação de um som no estúdio 7x7 Records, também na Ceilândia. A parceria não parou por aí. Rubens começou a produzir outros trampos com El KV e absorver conhecimentos que depois seriam aproveitados no seu trabalho independente.

Desde fevereiro, com os amigos Ruan e Gabriel, Rubens já estava na missão de vender os doces para financiar a música. O itinerário era mais ou menos assim: no horário do almoço, ofereciam os produtos em frente ao Restaurante Comunitário. Depois de umas voltas pelas ruas, por volta das 17h, iam para a frente de uma escola de ensino médio. Depois da saída dos alunos do ensino regular e entrada dos alunos do EJA, iam para uma praça movimentada da cidade e lá ficavam enquanto houvesse movimento e estoque.

Por volta de outubro, já com os equipamentos comprados e alguma experiência, o MC começou o processo de gravação do álbum, que, basicamente, consistia em convidar amigos para o home estúdio para produzir juntos. “Mas sempre a galera que não tinha muito apoio. Nunca chamei ninguém com nome estridente. Sempre quis fortalecer a galera daqui, que tinha talento, mas ninguém via que tinha talento”, ressalta, explicando que não tem pretensões comerciais quanto ao estúdio, mas apenas fortalecer esse grupo de colaboradores que ela chama de “time”.  

A ferramenta principal do artista, independente da linguagem que esteja usando - rap, rock ou, até, funk - é a palavra. “Gosto de escrever. Foco na batida também, porque componho ouvindo o ritmo, de acordo com a temática que o ritmo toma, com o momento. Mas meu produto é a letra, o foco é sempre a mensagem.” Atualmente, Rubens trabalha como mestre de cerimônias – no sentido original do termo, apresentando eventos - da 7x7 Records e do Cio das Artes. 

*Estagiário sob a supevisão de Adriana Izel

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