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Politica

Entrada de Ivan Monteiro na Petrobras deve acalmar o mercado e o Congresso

Sem garantias de que o freio nos reajustes do diesel vai manter ânimos sob controle, governo sabe que estará diante de perdas em uma das maiores empresas do país


Na tentativa de acabar com a greve dos caminhoneiros, o governo prometeu à categoria a redução de R$ 0,46 no preço do diesel por 60 dias, a destinação de 30% dos fretes da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para autônomos e descontos no pedágio. As propostas agradaram e desmobilizaram os manifestantes. Mas o movimento levou à queda de Pedro Parente, então presidente da estatal, e coloca em xeque a política de preços da petrolífera, que hoje é definido com base no que é aplicado pelo mercado internacional.

Sem ter garantia de que o freio nos reajustes do diesel vai manter os ânimos calmos por muito tempo e com perdas bilionárias em uma das maiores empresas do país, o governo pode ter encontrado uma saída bem mais cara do que o previsto. Ontem, o preço da gasolina subiu 2,25% nas refinarias com autorização da Petrobras.

Durante a greve dos caminhoneiros, o mundo acompanhou uma derrocada acentuada das contas da Petrobras. A gigante do setor petrolífero ; espécie de vitrine da bolsa de valores brasileira e que representa mais do que um bom negócio no setor econômico ; pode definir como serão os últimos meses do governo atual e como será o desempenho da próxima gestão que assumir o comando do país, após as eleições de outubro. Em apenas uma semana de greve dos caminhoneiros, a Petrobras perdeu R$ 162 bilhões em valor de mercado. Isso ocorreu por conta de uma queda de 34% na cotação de suas ações.

[SAIBAMAIS]A empresa, que ocupava o posto de empresa mais valiosa do Brasil, por conta de um lucro de R$ 6,9 bilhões no primeiro trimestre deste ano, caiu para o quarto lugar. A crise levou a estatal a ser ultrapassada em valor de mercado pela Ambev, Itaú Unibanco e Vale. Na última sexta-feira, no auge da crise, os papéis preferenciais da Petrobras fecharam em baixa de 14,82% na Bolsa de Valores de São Paulo (B3) e os ordinários caíram 14,92%. Amanhã, o mercado abre ainda envolvido na tensão política e diante das incertezas do cenário político e econômico.

Entre os analistas, a avaliação dominante é a de que a greve causou abalo inesperado na empresa e revelou que o envolvimento do governo é um dos entraves na gestão da estatal. O professor Edmar Almeida, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), destaca que a troca de comando escancarou a interferência política nos negócios. ;A maneira e a razão pelas quais Pedro Parente saiu são ruins para a empresa. Isso ficou evidente com a forte reação do mercado. Mas a escolha do Ivan Monteiro para o cargo é a forma de mostrar que não houve uma ruptura no comando. Mas o prejuízo já está criado e a venda de ativos e de refinarias fica prejudicado;, afirma.

Para o especialista, mesmo com o fim da greve, o assunto não está encerrado e deve se estender até as eleições. ;Eu acredito que a política de preços da Petrobras, de ajuste diário, dificilmente conseguirá se manter. Há dois anos foi escolhido esse sistema de reajuste. Mas hoje sabemos que deu errado. O ideal seria ter concorrência, ter outras refinarias. Do jeito que está, o preço vai mudar muito e toda vez que subir, poderá ter uma crise. Esse assunto vai dominar as eleições e até lá tem que ocorrer mudanças nas regras;, completa Edmar. Nos últimos dias, correm pelas redes sociais, principalmente pelo WhatsApp, boatos afirmando que uma nova greve de caminhoneiros pode ter início esta semana.


Reunião

O grupo de Acompanhamento de Normalização do Abastecimento fez mais uma reunião na manhã de ontem, no Palácio do Planalto. O encontro durou pouco mais de meia hora e reuniu o ministro do Gabinete de Segurança Institucional Sérgio Etchegoyen, o ministro substituto da Justiça, Claudenir Brito, o chefe do Estado-maior das Forças Armadas, o almirante Ademir Sobrinho. Apesar de não acreditar em uma nova paralisação, o governo informou que está acompanhando a situação de perto.

Daqui a um período de dois meses, o artigo da medida provisória que concede redução no preço do diesel na bomba deixará de valer. A intenção do governo é reajustar pouco esse valor. Mas além dos dados matemáticos dessa equação, o fator político também entra na conta. O elevado valor do litro da gasolina, que se aproxima de cinco reais em grande parte dos estados, continua levantando a insatisfação dos brasileiros.

Outros movimentos sociais, e até atos independentes da população, podem se insurgir contra o governo. Para o economista Adriano Pires, sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) e ex-superintendente de Importação e Exportação de petróleo da Agência Nacional do Petróleo (ANP), houve um retrocesso ainda difícil de calcular. ;Eu acho que o governo se embaralhou nessa crise. Do ponto de vista do setor de óleo e gás, essas decisões levaram ao retrocesso. A causa da crise é o frete dos caminhoneiros. Isso ocorre por conta de barbeiragens nos governos Lula e Dilma, que subsidiaram a compra de caminhões sem necessidade do mercado;, afirma.


Exemplo

Não é necessário ir muito longe para entender o que ocorre quando o Estado tenta usar uma valorosa empresa pública para satisfazer pretensões políticas. A Petróleos de Venezuela (PDVSA), estatal que é a mina dos olhos do governo do país vizinho, hoje produz 1,5 milhão de barris por dia. É quase metade da quantidade que já produziu em seu auge, em 2005, quando foi catalogada como a terceira maior petrolífera mundial.

A ex-presidente Dilma Rousseff tentou uma política parecida. Obrigada, a Petrobras baixou o valor do combustível na gestão da petista e teve perdas, à época, de U$ 30 bilhões. Tudo isso se somou ao esquema de corrupção investigado na Lava-Jato, que, de acordo com o Ministério Público Federal (MPF), pode ter ocasionado o desvio de R$ 20 bilhões nos cofres da empresa.


Os valores da derrocada


Em dois dias de greve dos caminhoneiros, a Petrobras perdeu R$ 120 bilhões em valor de mercado com a baixa nas ações

Ao final da greve, que durou 11 dias, as perdas chegaram a R$ 162 bilhões. Na sexta-feira, com a troca de comando, foram R$ 40 bilhões no Brasil

A medida provisória editada pelo presidente Michel Temer reduz R$ 0,46 no preço do diesel na bomba

Após o fim do prazo de desconto, o governo promete acabar com os reajustes diários, e ampliar o período de mudanças nos preços do diesel

Não foram anunciadas medidas relativas à gasolina. Ontem, a Petrobras anunciou alta de R$ 2,2% no preço repassado às refinarias