Deborah Fortuna
postado em 04/01/2019 17:00
Além do protagonismo militar em áreas de chefia do governo federal, a pressão para recuperar e ampliar benefícios dos profissionais das Forças Armadas também deve aumentar nos próximos anos. Em menos de uma semana à frente da Presidência, Jair Bolsonaro deu uma atenção especial à categoria ao visitar . Em tom crítico durante cerimônia de transição de cargos na última quarta-feira (2/1), Bolsonaro voltou a falar sobre a necessidade de votar a Medida Provisória n;2.215, de 2001, e conceder benefícios que foram retirados à época, como, por exemplo, o auxílio-moradia.
Editada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2001, a MP acabou com a promoção automática dos que passavam para a reserva, adicional de inatividade, pensão para filha, acúmulo de pensão, entre outros. Recusando-se a citar o nome de FHC durante posse do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, Bolsonaro disse que os militares tinham sido ;esquecidos; durante os governos anteriores. Ao se dirigir ao ministro da Defesa, Bolsonaro comentou sobre a MP e disse que ;esperamos não deixá-la completar 19 anos;. Apesar de não ter conversado com o presidente, Azevedo e Silva defendeu que a MP fosse reavaliada.
Até a publicação desta reportagem, a consulta pública no site do Senado Federal mostrava que 1.125 apoiavam a MP, frente a 109 que discordavam.
Para o professor de Gestão Pública Ibmec/DF José Simões, colocar em pauta a MP é uma forma de regulamentar uma medida realizada há 16 anos. ;Isso não foi efetivado em lei para efetivamente se retirar os benefícios. É uma situação jurídica que se coloca;, afirmou. Sobre o auxílio-moradia, um das pautas consideradas polêmicas da MP, já que o reajuste para juízes e ministros teve repercussão negativa, Simões acredita que não impactará os cofres públicos da mesma forma que o Judiciário ;estimado em R$ 4 bilhões.
Segundo Simões, o auxílio-moradia funciona como uma ;contrapartida; do estado pelas mudanças constantes dos militares a outros estados, que não o de origem. ;Se é pedido que o militar mude de estado, então ele tem que ter apoio. Fazer just a um imóvel funcional ou ao auxílio moradia. É uma contrapartida;, afirmou. ;Mesmo porque um militar da base ganha em torno de R$ 4,5 mil. Se ele é transferido, por exemplo, para o Rio de Janeiro, com esse salário, onde ele vai morar? Se o órgão público obriga ele a essa transferência, por questões funcionais, ele também tem que arcar com isso;, afirmou.
Mas, para o especialista, é preciso que o benefício seja usado de forma correta, e que apenas os profissionais obrigados a mudar de estado tenham esse direito. ;A MP tirou uma série de benefícios. Ela foi tratada de uma forma, e depois foi modificada. Esse é um dos aspectos de luta dele (Bolsonaro) de longa data.
Em números
De acordo com o Ministério da Defesa, nenhum militar das Forças Armadas, no país, recebe o auxílio-moradia atualmente, visto que a MP n; 2215 não prevê tal remuneratório. Também não é possível calcular quanto representaria esse tipo de despesa, visto que não existe legislação que regulamente as condições em que seria pago o auxílio moradia.
Em nota, a pasta disse uma parcela dos efetivos militares ocupa próprio nacional residencial (PNR), e que as Forças Armadas não tem condições de garantir imóvel sob a responsabilidade da União para cumprir o previsto na legislação. Um dos mecanismos que teriam suprimido essa carência era o pagamento da Indenização de Moradia ; na Lei 8.237 de 1991, que auxiliava as despesas com habitação do militar e seus dependentes, em razão das condições obrigatórias de mudanças frequentes de residência a qual está sujeito. Mas, a MP também suprimiu essa indenização.
Protagonismo
Mesmo ao longo da campanha, Bolsonaro já havia sinalizado mais participação de militares em cargos do poder público, e isso se concretizou após o resultado das eleições. Para o cientista político do Mackenzie Rodrigo Prando, os privilégios dados às Forças Armadas fazem parte de uma luta de décadas do presidente.
"Ele foi deputado federal durante 28 anos, cuja base de apoio sempre foi os militares. Faz parte da trajetória dele, e sem dúvida que isso vai persistir. A contrapartida é da sociedade. Se ela vai aceitar ou cobrar do governo que ele aja da mesma maneira, de forma isenta, das outras categorias e classes da sociedade", comentou Prando.
Para o especialista, Bolsonaro está dando "uma resposta" à base de apoio que teve nas eleições, majoritariamente ligada às Forças Armadas. "A sociedade vai achar justo isso? Se ela aceitar, tudo bem. Mas, se tiver uma posição mais dura, talvez ele seja obrigado a retocar ou fazer de outra forma", opinou o professor.