O cenário da imprensa alternativa brasileira perdeu uma de suas grandes figuras no dia 24 de agosto. Jaguar, pseudônimo de Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, morreu aos 93 anos no hospital Copa D’or, no Rio Janeiro, por complicações renais de uma infecção respiratória. Jaguar deixou uma trajetória marcada pelo traço irreverente e pela crítica aguda aos costumes e à política do país. A sua carreira marcou-se tanto por charges emblemáticas quanto na participação decisiva em veículos de comunicação que se pautaram na luta pela liberdade de expressão.
Reconhecido por seu humor ácido e estilo inconfundível, Jaguar ajudou a transformar o modo como a imprensa satírica é percebida no Brasil. Ao longo das décadas, foi presença constante em publicações de grande circulação, mas sua contribuição mais notável está diretamente relacionada à criação do jornal que se tornou símbolo de resistência durante o período da ditadura militar: o Pasquim. Além disso, ele também colaborou com revistas como O Cruzeiro, Manchete, e participou do lendário grupo de humoristas do periódico Careta nos anos 1950. Jaguar também escreveu vários livros, incluindo coletâneas de suas charges, como “O Jaguar na linha”, que reúne parte significativa de sua obra gráfica e editorial, além de ter dirigido programas de televisão dedicados ao humor e à cultura carioca.

Como Jaguar contribuiu para o surgimento do Pasquim?
Em 1969, num contexto de censura e repressão, Jaguar uniu forças com outros nomes da vanguarda cultural, como Ziraldo, Millôr Fernandes e Paulo Francis, para fundar o Pasquim. A proposta do periódico era inovadora: trazer à tona temas considerados tabus, questionar autoridades e satirizar o cotidiano político de forma escancarada. Jaguar foi responsável por algumas das caricaturas mais marcantes do jornal e participava ativamente das pautas e decisões editoriais. Assim, sua presença era essencial não só na construção do conteúdo, mas também na defesa do espírito irreverente que marcaria a publicação.
O cartunista investia seu talento no desenvolvimento de personagens e situações que rapidamente ganharam o gosto do público. O traço simples e expressivo de Jaguar permitia traduzir complexas discussões políticas em imagens e textos curtos, tornando a crítica acessível a diferentes públicos.
Características que fizeram do Pasquim um marco da imprensa alternativa?
O Pasquim, sob a influência de Jaguar e seus colegas, tornou-se referência ao abordar temas sensíveis sem temor. Entre as principais marcas do jornal, destacam-se:
- Sátira política aguçada: através das charges de Jaguar e de outros colaboradores, o jornal desafiava autoridades e discutia abertamente o autoritarismo vigente.
- Liberdade criativa: a redação funcionava de maneira horizontal, com todos opinando sobre pautas e linha editorial, estimulando novas experimentações gráficas e textuais.
- Entrevistas consagradas: personalidades relevantes da política, da arte e da cultura foram retratadas com perguntas inusitadas e respostas espontâneas, muitas vezes desconcertantes para o leitor tradicional.
- Linguagem informal e acessível: aproximando-se do cidadão comum, o Pasquim utilizava gírias, humor popular e ironia para criar identificação com o público.
Além dessas características, o Pasquim também inovou na diagramação e no uso de ilustrações como linguagem principal, o que influenciaria a imprensa alternativa nacional por gerações. Ademais, o jornal não só marcou a crítica política como também revelou novos talentos do humor gráfico, lançando nomes como Henfil e Claudio Paiva. O periódico chegou a atingir tiragens históricas, superando 200 mil exemplares nos períodos mais intensos da repressão.

Por que o legado de Jaguar continua sendo relevante?
A atuação de Jaguar no Pasquim ajudou a estabelecer uma nova forma de comunicação social baseada na irreverência e na busca pela verdade. O jornal serviu como inspiração para outras publicações alternativas brasileiras ao longo dos anos, consolidando uma tradição de crítica satírica que se estende até hoje. Seus desenhos continuam sendo referência para novas gerações de cartunistas e jornalistas.
Além disso, o Pasquim representou uma trincheira de resistência em uma época de cerceamento à liberdade de expressão, mostrando a força da imprensa alternativa. O exemplo de Jaguar impulsionou a defesa de debates livres, tornando-o uma figura admirada entre profissionais de diversas áreas ligadas à comunicação.
Mesmo décadas após sua fundação, as lições deixadas pelo cartunista e pelo periódico criado em 1969 continuam atuais. Os profissionais da comunicação seguem resgatando a ideia de que é possível fazer crítica inteligente e bem-humorada, independente do contexto. Jaguar permanece como um ícone dessa postura diante dos desafios do jornalismo brasileiro.










