MEIO AMBIENTE

"Há mais de 50 anos não tinha uma seca igual", diz ministra sobre o Pantanal

Ministra da Agricultura diz que fogo no Pantanal prejudica agricultor e é preciso investir no combate aos incêndios. Segundo Tereza Cristina, em razão da seca enfrentada no bioma, os focos voltarão a crescer nas próximas semanas

Natália Bosco*
postado em 30/09/2020 06:00
 (crédito: Antonio Araujo/MAPA)
(crédito: Antonio Araujo/MAPA)

Ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina afirmou, ontem, que o agricultor do Pantanal está tendo prejuízos com as queimadas que atingem a região e defendeu uma destinação maior de recursos para combate e prevenção ao fogo. Segundo ela, a seca contribui negativamente para a propagação de focos. As queimadas já devastaram quase 3,5 milhões de hectares do bioma.
“Nós sempre tivemos incêndios no Pantanal. Que o Pantanal é muito seco não é uma coisa nova, que aconteceu somente este ano, mas, este ano, foi desproporcional ao que aconteceu nos anos passados. Há mais de 50 anos não tinha uma seca igual. Os focos (de incêndio) estão voltando porque vamos passar esta semana e a próxima com muita seca (no Pantanal). Aquele fogo que, em muitos lugares, estava supostamente apagado, às vezes, volta com o vento”, avisou. O assunto foi abordado, ontem, pela ministra em uma live sobre sustentabilidade.

A bióloga Letícia Larcher, coordenadora técnica do Instituto Homem Pantaneiro, concorda em parte com a fala da ministra. “Historicamente, o Pantanal tem ciclos de cheia e seca, e a gente está em um ciclo de seca. Isso é uma questão natural do Pantanal. Mas a gente ainda não tem estudos suficientes para falar se o que está acontecendo agora, com a seca do Rio Paraguai, é uma seca do ciclo hídrico do rio ou se é uma seca em decorrência das mudanças climáticas, desmatamento de nascentes e outras intervenções, como construção de hidroelétricas de rios”, explicou.

Mas, destaca, a seca acelera e aumenta o impacto do fogo. Nisso, “ela está correta porque a vegetação que estaria ou deveria começar a inundar pelo ciclo que começaria, agora, em agosto, setembro e outubro não aconteceu. Toda vegetação que deveria estar alagada, está pegando fogo. O fogo chega e a água, que está ali, não é suficiente para conter”, completou a especialista.

A ministra destacou, ainda, a dificuldade de combater e prevenir incêndios nos biomas nacionais. Segundo ela, é necessário educar os produtores que ainda usam técnicas rudimentares de manejo agrícola. “Em um país como o nosso, gigante, é muito difícil você dizer que vai resolver isso (queimadas) em curto prazo. Primeiro, é preciso educação, conscientização e você tem, aí, diversas variáveis. Você tem aquele pequeno produtor que ainda usa a prática da queimada. São prática rudimentares. Por isso que se fala em assistência técnica e extensão rural para chegar até ele (o produtor), para que ele mude essa prática. Mas é um conjunto de fatores. Eu preciso que ele tenha primeiro a terra regularizada, para que eu também possa puni-lo, se estiver fazendo errado. Segundo, ele precisa ter crédito para mudar essa prática antiga e rudimentar para que ele conheça e tenha condições de implementar práticas mais modernas de manejo agrícola”, falou, ao ressaltar a importância da regularização fundiária para a prevenção de futuros incêndios.

De acordo com a chefe da pasta de Agricultura, é necessário, ainda, “separar o joio do trigo” quando se analisa a origem dos incêndios no bioma. “Será que o produtor do Pantanal, o homem pantaneiro, está feliz com esses incêndios que começaram como queimadas? Eu não quero criminalizar e nem descriminalizar ninguém, mas a grande maioria dos pantaneiros terá prejuízos enormes com essas queimadas”, frisou.

Programa

O fogo no Pantanal teve início em quatro fazendas de grande porte em Corumbá (MS), segundo investigação da Polícia Federal — a suspeita é que produtores rurais tenham colocado fogo na vegetação. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que do dia 1º ao dia 28 de setembro foram registrados 7.338 focos ativos na região. Informações do Inpe também mostram que de 1º de janeiro até ontem foram contados 17.491 incêndios, fazendo com que este seja o pior ano do Pantanal desde o início do monitoramento por satélite, em 1998.

Tereza Cristina comentou, também, a possibilidade de um novo programa voltado para um melhor monitoramento de áreas agrícolas e biomas brasileiros a ser lançado este ano. “A gente começará a rodar um programa para saber exatamente quem está fazendo o quê. Tem gente que mete fogo, porque quer tirar madeira. Tem gente que mete fogo ou deixa entrar o fogo, por sei lá o quê. Tem, aí, uma série de coisas.”

*Estagiária sob supervisão de Andreia Castro

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Manguezais e restingas protegidos

A Justiça Federal no Rio de Janeiro suspendeu provisoriamente, ontem, a decisão aprovada na segunda-feira pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) de revogar duas resoluções do próprio órgão. A decisão foi tomada pela 23ª Vara Federal do Rio de Janeiro em ação popular impetrada por quatro pessoas contra a União e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Na segunda, durante a 135ª reunião do Conama, o órgão decidiu revogar quatro resoluções (uma em vigor desde 1999, outra desde 2001 e duas desde 2002), flexibilizando controles ambientais. A revogação foi alvo de intensas críticas de ambientalistas.

Ontem, Juliana Cruz Teixeira da Silva, Leonardo Nicolau Passos Marinho, Renata Miranda Porto e Rodrigo da Silva Roma impetraram ação popular perante a Justiça Federal no Rio de Janeiro pedindo a anulação da decisão de revogar duas dessas resoluções. São as duas de 2002, de números 302 e 303. A primeira trata da preservação de áreas ao redor dos reservatórios de água, determinando como área de preservação permanente uma faixa mínima de 30 metros ao redor deles. A medida proíbe a exploração dessa área para qualquer uso econômico ou habitação. A segunda resolução protege os manguezais e faixas de restinga do litoral brasileiro, passando a considerá-los áreas de preservação permanente.

A juíza Maria Amélia de Carvalho atendeu o pedido e concedeu a liminar, “tendo em vista o evidente risco de danos irrecuperáveis ao meio ambiente”. O processo seguirá seu trâmite e a decisão poderá ser derrubada tanto na análise de mérito como por outra instância da Justiça Federal. Até o fechamento desta edição, o Ministério do Meio Ambiente não havia se manifestado sobre a decisão judicial.

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