PARÁ

"Querem queimar a ponte para ninguém sair", diz indígena sobre garimpeiros

Caciques foram impedidos de deixar a região do Alto Tapajós para denunciar invasão e incêndios às tribos. Local já foi alvo da investigação da PF e de corrupção da FAB

Talita de Souza
postado em 10/06/2021 22:01 / atualizado em 10/06/2021 22:02
 (crédito: Redes Sociais/Reprodução)
(crédito: Redes Sociais/Reprodução)

“Jacareacanga é cidade sem lei”. O trecho do comunicado dos indígenas que compõem o Movimento Munduruku Ipereg Ayu, do Alto Tapajós no Pará, denuncia uma extensa onda de ataques de garimpeiros ilegais ao grupo, que vive no município de Jacareacanga, no sudoeste do Pará. Divulgada na quarta-feira (9/6), a carta afirma que os agressores impedem os caciques e líderes da comitiva Munduruku de sair da região para expor a violência sofrida aos órgãos competentes em Brasília.

Segundo os indígenas, um ônibus contratado para levar o grupo até a capital do país foi atacado na manhã de ontem (9/6) pelos garimpeiros. O motorista foi ameaçado de morte e o veículo teve os pneus furados. "Se não saísse da cidade, o ônibus iria ser queimado. Nossa comitiva está proibida de seguir viagem", afirmam no comunicado.

Uma das líderes Munduruku, Alessandra Korap, usou as redes sociais para relatar o cenário vivido pelo povo. "Querem queimar a ponte para ninguém sair. Tem milícia no local e ninguém ainda fez nada", disse. Alessandra também diz que os caciques exigem um transporte para retirá-los do local. 

A viagem até Brasília faz parte da resistência do grupo indígenas contra recentes ataques sofridos. Em 26 de maio, durante a Operação Mundurukânia, deflagrada pela Polícia Federal (PF) para combater a exploração ilegal e delitos contra o meio ambiente, garimpeiros atacaram a aldeia Fazenda Tapajós, local em que uma das líderes Munduruku, Maria Leusa Kaba reside com a mãe, cacica da aldeia e outras pessoas. Duas casas foram incendiadas.

“É inaceitável que mesmo com a presença da Força Nacional na região a aldeia de uma das nossas principais lideranças tenha sido invadida por homens armados, portando galões de gasolina que incentivam o ódio contra todos nós”, escreveu a comitiva na ocasião, em blog próprio. As forças policiais também foram atacadas pelos garimpeiros.

Dois dias depois, em 28 de maio, os indígenas relataram que a PF e a Força Nacional deixaram a região, o que deixou o povo Munduruku mais desprotegidos. Para o grupo, a operação foi “uma farsa anunciada para proteger criminosos, que não fechou garimpos e nem conseguiu conter e impedir o ataque” aos líderes locais.

Assim, a viagem até Brasília seria uma forma de amplificar as denúncias dos ataques e garantir proteção. No entanto, os garimpeiros impediram o planejamento dos indígenas.

Os Munduruku pontuam, ainda, que qualquer violência sofrida por eles será de responsabilidade do estado brasileiro, que “não garantiram reforço policial” e assim continuam sendo atacados, “mesmo informando, pedido policiamento e apoio”. Eles relatam que ainda sofrem ameaças contínuas.

Terra indígena ameaçada

De acordo com o Greenpeace, o território Munduruku sofre com o garimpo ilegal há mais de uma década: de 2008 a 2020, foram cerca de 61km² destruídos. Já o sistema Deter do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), revela que 60% dos alertas de desmatamento nos nos quatro primeiros meses de 2020 ocorreu na Terra Indígena Munduruku, junto ao território Sai Cinza. Os indígenas afirmam que a situação é permitida pelo governo federal.

Em agosto de 2020, uma investigação foi aberta pelo Ministério Público Federal (MPF) para apurar suspeitas de que aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB) foram utilizadas para apoiar transportar mineradores ilegais até Brasília. Na ocasião, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) solicitou apoio da FAB em uma operação de combate a crimes ambientais em Jacareacanga. Lideranças do grupo Munduruku denunciaram o ocorrido ao MPF.

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