violência

Líder dos yanomami acusa governo de descaso sobre desaparecimentos

Líder da etnia acusa autoridades de descaso e afirma que a própria comunidade investigará o sumiço de 24 indígenas

Cristiane Noberto
postado em 05/05/2022 06:00
 (crédito: Condisi-YY/Divulgação)
(crédito: Condisi-YY/Divulgação)

Lideranças indígenas Yanomamis de Roraima desistiram de esperar pela ajuda do governo federal e decidiram prosseguir, por conta própria, as investigações sobre o desaparecimento dos 24 indígenas da aldeia Aracaçá, na região Waikás. Eles não são vistos desde a semana passada, depois da acusação de estupro seguido de morte de uma menina de 12 anos da etnia. Além da acusação de falta de apoio político e desamparo de organismos federais, os indígenas convivem com o medo de serem vítimas de mais violência.

Segundo Júnior Hekurari Yanomami, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena e Ye'kuana (Condisi-YY), a Polícia Federal pouco tem agido para que se esclareça o episódio. Apesar de ter acompanhado os agentes até onde viviam os ianomâmis desaparecidos — no local há apenas restos calcinados daquilo que seria a comunidade —, foi cobrado para que houvesse "o corpo caído" necessário para que as investigações prosseguissem.

"Culturalmente, queimamos o corpo para fazer ritual e cerimônia. Por isso, não foi encontrado. Mas a comunidade continua queimada e os parentes desapareceram e a gente não sabe por que. Não temos muitas informações. O governo não vai fazer nada, os policiais não podem prender os garimpeiros — só podem destruir os equipamentos deles. Enquanto isso, eles (os exploradores) vão continuar", acusou.

O Correio procurou as autoridades sobre a falta de apoio às investigações apontada pelo líder ianomâmi. A Superintendência da PF em Roraima informou, somente, que as informações disponíveis são as da nota emitida no último dia 28, destacando que as investigações estão sendo feitas em conjunto com a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Ministério Público Federal (MPF) e a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), com o apoio do Exército e da Força Aérea Brasileira. Já o Ministério Público de Roraima assegurou que "continua trabalhando para a proteção dos indígenas".

No caso do Ministério da Justiça, devido à atuação da Força Nacional não poderia informar o quantitativo de agentes envolvidos na operação. Porém, dentro do Ministério da Defesa o caso é considerado "midiático" e que não há provas de que foram garimpeiros que mataram a menina — segundo relatou fonte ouvida pelo Correio.

A esperança do líder ianomâmi está na entrada da Defensoria Pública da União (DPU) na apuração do caso — que pretende investigar, também, o garimpo ilegal na região — e da comissão do Congresso formada para acompanhar o caso. As diligências dos parlamentares estão previstas para 11 e 12 de maio.

Ameaças

A omissão federal apontada por Júnior Hekurari Yanomami tem estimulado que garimpeiros intensifiquem as ameaças que sofre. Ele mostrou ao Correio dois áudios que recebeu, que atribui ao empresário do ramo de mineração Rodrigo Cataratas — coordenador Geral do Movimento Garimpo é Legal (MGL) na região.

"A paciência acabou. As atitudes vão ser tomadas à medida que o garimpeiro for agredido. Estamos saindo do MP (Ministério Público) pedindo que seja dada a mesma proporção da denúncia. A gente pede que mostre o corpo, faça laudo cadavérico. Não se comprovando isso, vamos processar todo mundo. A paciência acabou. Junior Yanomami vai ser investigado por denúncia falsa, por gastar bilhões públicos para mentir. De agora para frente, vamos responder (de forma) igual", anunciou.

Em vídeo publicado nas redes sociais, Cataratas acusa a comissão de parlamentares de parcialidade. "A gente sabe que o PT, as ONGs, o STF (Supremo Tribunal Federal) estão apenas olhando para um lado: o indígena. Mas, aqui, temos uma pauta de segurança nacional", afirmou, pedindo ainda que o presidente Jair Bolsonaro (PL) ouça o "outro lado, o dos garimpeiros".

O chefe garimpeiro ainda postou um vídeo cobrando de Bolsonaro e dos filhos acompanhamento da comissão de congressistas. "Faço um pedido ao presidente, ao Flávio (senador, PL-RJ) e ao Eduardo (deputado, PL-SP) para que fiquem atentos a essa comitiva. Para que coloquem um integrante, para que não seja transformada em uma questão ideológica. Seria muito importante que o presidente e seus filhos pudessem enviar um integrante do outro lado, para que seja imparcial", disse.

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