Internacional

ONU vê polícia aliada a grileiros para invadir terras indígenas no Brasil

Os crimes contra indígenas, segundo a ONU, estão se tornando muito frequentes — foram seis assassinatos desde o início do ano contra quatro em todo 2021

Vicente Nunes - Correspondente
postado em 15/07/2022 16:06
 (crédito: AFP / HAZEM BADER)
(crédito: AFP / HAZEM BADER)

 

Lisboa, Portugal — O assassinato de indígenas e a invasão de aldeias, protegidas por lei, levaram a Comissão Internacional de Direitos Humanos (CIDH) e o Escritório Regional na América do Sul da Alta Comissariada da Organização das Nações Unidas (ONU) a cobrarem ação rápida do governo brasileiro para proteger os povos originários. Os crimes contra indígenas, segundo a ONU, estão se tornando muito frequentes — foram seis assassinatos desde o início do ano contra quatro em todo 2021 — e muito da violência vem da polícia, que estaria associada a grileiros de terras.

“Reiteramos nossa grande preocupação com a série de ataques, ameaças e intimidações relatadas por vários povos indígenas no Brasil. Exortamos o Estado brasileiro a investigar e sancionar esses casos com a devida diligência, bem como a implementar medidas urgentes e eficazes para proteger a vida e a integridade, tanto daqueles que fazem parte desses povos quanto dos que defendem seus direitos”, ressaltam as entidades.

Segundo informações coletadas pela ONU Direitos Humanos, com base em informações fornecidas por organizações da sociedade civil, além dos seis assassinatos de indígenas neste ano, em 24 de junho último, duas comunidades Guarani e Kaiowá, em Mato Grosso do Sul, foram vítimas de ataques armados por grupos formados por policiais militares e pessoas civis. “Ambas as situações ocorreram no âmbito de processos de despejo de pessoas indígenas de terras que as comunidades Guarani e Kaiowá reivindicam como ancestrais. Durante as diferentes operações, agentes dispararam do chão e também de um helicóptero, o que teria resultado em um indígena morto e mais de 10 feridos, incluindo mulheres e crianças”, afirma a ONU.

No entender da Comissão de Direitos Humanos, esse quadro é inaceitável, sobretudo porque as operações teriam sido realizadas sem autorização judicial e em desacordo com o estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que proibiu os despejos forçados em todo o país até 31 de outubro. “Há, ainda, relatos de que, em 15 de junho, um indígena de 61 anos foi espancado até a morte por policiais militares de Pernambuco depois de ser acusado de portar uma arma, o que constituiria em um caso de uso excessivo de força por agentes do Estado”, ressalta a Organização.

Discriminação


Tanto a Comissão Internacional quanto o Escritório Regional de Direitos Humanos da ONU reforçam que veem com preocupação o envolvimento das forças policiais em diversos casos de violência contra os povos indígenas no Brasil, e pedem que o Estado erradique a discriminação e o perfilamento racial das forças de segurança. “Exortamos às autoridades uma investigação rápida sobre alegações de que policiais estão agindo ao lado de proprietários privados contra povos indígenas que reivindicam terras ancestrais”, frisam as entidades.

Em relatório sobre direitos humanos no Brasil, a ONU ressalta a grave situação dos povos Guarani e Kaiowá devido à violação de seus direitos territoriais e aos ataques que sofreram no contexto da defesa de seus direitos. Os principais problemas estão relacionados à defesa territorial e ambiental, intimidação, ameaças, ataques e criminalização contra defensores, lideranças e comunidades indígenas.
“Esses problemas também podem ser observado nas medidas cautelares concedidas pela CIDH em favor dos povos indígenas Guajajara, Awá, Munduruku, Yanomami e Ye’kwana, que solicitaram ao Estado do Brasil que adote as medidas necessárias para proteger os direitos à saúde, à vida e à integridade pessoal de seus membros no contexto da pandemia como resultado da presença de pessoas não autorizadas explorando recursos naturais em seus territórios”.

Dada persistência e o agravamento desta situação, a Comissão pediu à Corte Interamericana de Direitos Humanos medidas provisórias para os povos Yanomami, Ye’kwana e Munduruku.Para a ONU,
nesse contexto de hostilidades contra os direitos dos povos indígenas, é fundamental lembrar o brutal assassinato do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, ocorrido no início de junho na Amazônia brasileira.

“Defensores proeminentes dos direitos dos povos indígenas e do meio ambiente, ambos foram mortos enquanto se dirigiam a uma comunidade indígena como parte de uma investigação sobre os impactos da mineração ilegal e outras atividades ilícitas perpetradas por grupos armados no Vale do Javari, estado do Amazonas”, lembra a ONU. No entender da instituição, casos desse tipo destacam a vulnerabilidade das pessoas que defendem os direitos dos povos indígenas e do meio ambiente no país.

A ONU complementa que, sobre esse caso, o governo brasileiro informou que reconhece e valoriza o papel das pessoas defensoras de direitos humanos, inclusive aqueles exercidos por indígenas, e garantiu que tem aplicado medidas de proteção a mais de 540 pessoas defensoras em todo o país, incluindo um Yanomami e três lideranças Munduruku.

O governo destacou, ainda, que vê com seriedade denúncias de atos de violência contra os povos indígenas, além de realizar uma série de procedimentos de investigação que têm levado a punições dos responsáveis pelos crimes. Segundo o governo, as políticas de segurança são de responsabilidade dos estados federados e que, quando necessário e em coordenação com as autoridades locais, as forças federais podem ser mobilizadas, particularmente a Força Nacional de Segurança e a Polícia Federal.

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