MEIO AMBIENTE

Cerrado: "Não podemos esperar ou errar mais", diz Mercedes Bustamante

Segundo a bióloga e presidente da Capes, é urgente que o poder público e a sociedade se mobilizem para a conservação do Cerrado, considerado a savana mais biodiversa do mundo

Presidente da Capes, Mercedes participou do 10º Encontro e Feira dos Povos do Cerrado, na Torre de TV -  (crédito: Khalil Santos/CB/D.A Press)
Presidente da Capes, Mercedes participou do 10º Encontro e Feira dos Povos do Cerrado, na Torre de TV - (crédito: Khalil Santos/CB/D.A Press)
postado em 15/09/2023 12:07 / atualizado em 15/09/2023 15:22

Conhecido como berço das águas, o Cerrado alimenta as nascentes de oito das doze bacias hidrográficas mais importantes do país: Amazônica, Rio Tocantins-Araguaia, Atlântico Nordeste Oriental, Bacia do Parnaíba, São Francisco, Atlântico Leste, Bacia do Paraná e Paraguai. O bioma também é a savana mais biodiversa do mundo, com aproximadamente 12 mil plantas catalogadas. Segundo o Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), há ainda cerca de 2.653 espécies de animais vertebrados no ecossistema cerratense. Entretanto, toda essa riqueza está sendo ameaçada com o avanço do desmatamento e das queimadas no bioma. Para a bióloga e presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Mercedes Bustamante, é urgente que o poder público e a sociedade se mobilizem para a conservação do Cerrado. "Não podemos esperar ou errar mais", diz a também professora da Universidade de Brasília (UnB).

Mercedes participou 10º Encontro e Feira dos Povos do Cerrado, na Torre de TV, nesta sexta-feira (15/9). No evento, a especialista comentou que a importância do Cerrado não é apenas ambiental, mas também econômica e social. Dos principais desafios que a humanidade enfrenta, como alimentar cerca de 9 a 10 bilhões de pessoas até 2050 e reduzir as emissões de gases de efeito estufa, as soluções passam pelo bioma que cobre cerca de 25% do território nacional. Isso porque o Cerrado é relevante para assegurar a segurança alimentar, hídrica e energética do Brasil. 

"A sustentabilidade não é mais uma opção, mas, sim, um imperativo para o Cerrado", pontuou Mercedes Bustamante. De acordo com ela, não há um modelo de conservação único para o bioma, pois é necessário olhar as especificidades de cada estado e traçar estratégias direcionadas. O Cerrado abrange os estados de Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Maranhão, Piauí, Rondônia, Paraná, São Paulo e Distrito Federal. Entre as maneiras de preservação, Mercedes aponta o manejo adequado do solo, utilização sustentável e inteligente dos recursos, restauração das áreas degradadas, além do enfrentamento contra as queimadas e desmatamentos legais e ilegais.

Quase 50% do bioma já foi desmatado. Entre agosto de 2022 e julho de 2023, os alertas de desmatamento no Cerrado cresceram 16,5% em comparação com o ano anterior, contabilizando 6.359 km² de vegetação devastada. Os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Além disso, em junho, o Cerrado registrou o maior número de queimadas dos últimos 16 anos. Em 2022, foram 4.239 focos de incêndio. Já neste ano, houve crescimento de 5%, com 4.472 ocorrências.

Justiça climática

A luta pela preservação do Cerrado também passa pela defesa de justiça climática, pois o bioma é lar de diversas comunidades tradicionais: 83 etnias indígenas, quilombolas, extrativistas, geraizeiros, vazanteiros, quebradeiras de coco, ribeirinhos, pescadores artesanais, barranqueiros e sertanejos. Mercedes Bustamante avalia que esses povos são os que mais sofrem com as mudanças climáticas, embora sejam os que menos contribuem para a devastação ambiental. 

"Povos indígenas e comunidades tradicionais do Cerrado têm uma longa história de convivência com o bioma e seus territórios representam uma parte significativa da vegetação nativa ainda conservada. Esse conhecimento acumulado por gerações sobre como conservar e usar de forma sustentável o Cerrado e seus recursos é hoje ainda mais necessário considerando o quadro agudo de desmatamento e degradação", frisa Mercedes.

No Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento, apresentado por um conjunto de ministérios do governo federal e lançado na Câmara dos Deputados na quarta-feira (13/9), há o apontamento de que a expansão das Unidades de Conservação, somada ao reconhecimento dos direitos das comunidades tradicionais, pode reduzir o desmatamento e proteger o modo de vida desses povos. 

"A baixa cobertura de áreas protegidas e a falta de mapeamento das áreas que compõem os territórios de povos e comunidades tradicionais se refletem na predominância de propriedades privadas no bioma com quase 80% da área. Esse quadro traz desafios importantes, seja para a conservação da biodiversidade, seja para reconhecimento dos direitos da povos indígenas e dos povos e comunidades tradicionais", aponta o relatório do Plano.

O texto do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento afirma, ainda, que as terras públicas do Cerrado são uma oportunidade para ampliar as áreas de conservação e delimitação de territórios tradicionais.  "Apesar de ser coberto principalmente por áreas privadas, o Cerrado ainda possui cerca de 7 milhões de hectares de terras públicas federais não destinadas, que corresponde a 3,4% do bioma. É possível que essa área seja significativamente maior por conta da falta de informações consolidadas sobre as terras públicas estaduais. Essas áreas apresentam uma ameaça e uma
oportunidade importante", ressalta o relatório.

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