VIOLÊNCIA

"Sangue indígena continua sendo derramado com conivência do Estado", diz MPF

O órgão manifestou preocupação com a escalada da violência no sul da Bahia. A líder indígena Maria de Fátima Muniz, do povo Pataxó Ha Ha Hãe, foi morta a tiros

O MPF, a DPU e a Defensoria da Bahia cobraram ações após o ataque contra o povo Pataxó Hã-Hã-Hãe e assassinato da liderança Nega Pataxó -  (crédito: Divulgação/Ministério dos Povos Indígenas)
O MPF, a DPU e a Defensoria da Bahia cobraram ações após o ataque contra o povo Pataxó Hã-Hã-Hãe e assassinato da liderança Nega Pataxó - (crédito: Divulgação/Ministério dos Povos Indígenas)
postado em 23/01/2024 14:07

O Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA) cobraram medidas dos governos federal e do estado da Bahia contra os ataques sofridos pelos povos indígenas. Em nota conjunta publicada na segunda-feira (22/1), os órgãos manifestaram preocupação com a escalada da violência no sul baiano. No domingo (21/1), a líder indígena Maria de Fátima Muniz, do povo Pataxó Ha Ha Hãe foi morta a tiros após confronto com fazendeiros.

"A proteção dos direitos indígenas é um dever do Estado através de todos seus entes federativos, conforme preconizado pela Constituição Federal e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. A postura governamental adotada até aqui viola os direitos humanos e perpetua um ciclo de violações e injustiça que faz com que o sangue indígena continue sendo derramado com a conivência do Estado brasileiro", afirmaram os três órgãos.

O ataque contra a indígena conhecida como Nega Pataxó ocorreu na Terra Indígena Caramuru-Catarina Paraguassu, localizada nos municípios de Pau Brasil, Camacan e Itaju do Colônia, no sul da Bahia. O irmão dela, cacique Nailton Muniz, foi atingido no rim e passou por cirurgia no Hospital Cristo Redentor, em Itapetinga. Além disso, entre os feridos também está uma mulher que teve o braço quebrado e outros que foram hospitalizados, mas não correm risco de morte.

O caso

Segundo o Ministério dos Povos Indígenas, cerca de 200 ruralistas se mobilizaram por meio de um chamado de WhatsApp, que convocava os fazendeiros e comerciantes para recuperarem, sem decisão judicial, a posse da Fazenda Inhuma, ocupada por indígenas no último sábado (20/1). Eles cercaram a área com dezenas de caminhonetes. Dois fazendeiros foram detidos, incluindo o autor dos disparos que vitimaram Nega, além de um indígena que portava uma arma artesanal. Segundo a Polícia Militar da Bahia, um fazendeiro foi ferido com uma flechada no braço, mas está estável.

O MPF lembrou que há um mês, outra liderança indígena foi assassinada na região, o Cacique Lucas Kariri-Sapuyá. Desde o início do ano passado, o MPF, a DPU e a DPE/BA  têm formulado diversos pedidos encaminhados aos entes estatais solicitando por um programa de segurança voltado às necessidades dos indígenas. Para os órgãos, a resposta estatal tem sido insuficiente. 

"Em resposta ao assassinato de três jovens indígenas pataxós – Gustavo Conceição (14 anos) em 4 de setembro de 2022, Nawir Brito de Jesus (17 anos) e Samuel Cristiano do Amor Divino (25 anos) em 18 de janeiro de 202 – o Ministério dos Povos Indígenas instituiu um gabinete de crise  para “acompanhar a situação de conflitos na região do extremo sul da Bahia”. Após apurações preliminares, constatou-se o envolvimento de uma milícia armada, composta por policiais militares, nos assassinatos", cita a nota.

De acordo com o MPF, o gabinete de crise promoveu um diálogo entre os atores políticos e sociais envolvidos, mas o governo da Bahia negou as diversas solicitações feitas por lideranças indígenas da região para utilização da Força Nacional, alegando que a violência poderia ser contida pela força de segurança local, mesmo ciente do envolvimento de policiais militares que atuam na área nos episódios de violência.

Os órgãos solicitaram, em caráter de urgência, uma reunião com o governador Jerônimo Rodrigues, para apresentar e explicar propostas "aptas a garantir efetividade à proteção e aos direitos das populações indígenas e demais povos e comunidades tradicionais, em busca da pacificação em território baiano". O governo local afirmou que instalou um grupo de trabalho para propor soluções para o conflito. "Nós não aceitaremos qualquer tipo de violência como a ocorrida recentemente no sul da Bahia. Já estamos mobilizados para apurar e punir os responsáveis", disse Jerônimo, pelas redes sociais.

Governo vai dialogar para promover segurança dos indígenas

Nesta terça-feira (23/1), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que vai discutir a questão com a ministra dos Povos Indígenas Sonia Guajajara e o governador Jerônimo. "Quero colocar o governo federal à disposição do Jerônimo e dos povos indígenas para encontrar uma solução de forma pacífica. Minha solidariedade aos familiares de Nega Pataxó", destacou Lula. 

Na segunda-feira (22/1), uma comitiva interministerial liderada pela ministra Sonia Guajajara visitou o povo Pataxó Hã Hã Hãe no sul Bahia. A ministra dos Povos Indígenas conversou com o cacique Nailton Muniz no hospital e com outros indígenas que estão internados. Ela também esteve no velório de Nega Pataxó, pajé e irmã do cacique.

"As lideranças da região reforçaram o pedido para a retirada de invasores não indígenas do território, especialmente em função da recente validação da tese do marco temporal pelo Congresso Nacional. Entre outras medidas acertadas nas reuniões que tivemos no território, o MPI se comprometeu com a elaboração de um plano de proteção territorial em conjunto com as comunidades para os 12 territórios indígenas da região", detalhou a ministra.

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