Matéria escrita por Gabriella Collodetti, jornalista do CB Brands, estúdio de conteúdo do Correio Braziliense.
No enfrentamento do câncer de mama, o tempo pode ser um aliado precioso. Um estudo publicado no JCO Global Oncology — revista científica internacional da American Society of Clinical Oncology (ASCO), referência em pesquisas oncológicas — revelou que, enquanto pacientes da rede privada iniciam o tratamento em cerca de 41 dias após o diagnóstico, no sistema público essa espera pode chegar a 93 dias. Essa diferença é significativa, especialmente quando se sabe que, com a detecção precoce, as chances de cura ultrapassam 90%. Falar sobre diagnóstico antecipado é falar sobre tempo, equidade e oportunidade de cura — pilares que salvam vidas.
De acordo com Romualdo Barroso, oncologista do Hospital Brasília e líder de Câncer de Mama da Oncologia Américas, a discrepância entre os dois sistemas de saúde compromete o cumprimento da Lei dos 60 Dias — que determina que o Sistema Único de Saúde (SUS) deve iniciar o tratamento para pacientes com câncer em, no máximo, 60 dias após o diagnóstico. A pesquisa, assinada pelo médico, busca evidenciar as desigualdades no acesso ao tratamento e como isso impacta diretamente o resultado terapêutico e a sobrevida das pacientes.
"O estudo avaliou a etapa que vai do diagnóstico ao início do tratamento como apenas uma parte do problema. Antes disso, observamos atrasos significativos nos exames e encaminhamentos, que também interferem no desfecho das pacientes", explica Romualdo. O especialista destaca que o desafio está em toda a jornada do cuidado, e não apenas no início do tratamento.
Além da diferença nos prazos, os dados mostram que pacientes da rede pública frequentemente chegam com tumores em estágio mais avançado. Isso evidencia gargalos que se estendem desde a detecção até o início da terapia, comprometendo a efetividade dos tratamentos. “Essa é uma das etapas mais críticas do cuidado oncológico no Brasil, pois reflete a desigualdade de acesso e o impacto que ela tem na sobrevida das mulheres”, complementa o oncologista.
Para o médico, é fundamental a necessidade de políticas públicas mais eficazes para reduzir o tempo entre o diagnóstico e o tratamento. "O objetivo é garantir que toda mulher, independentemente da origem ou condição social, tenha acesso rápido e equitativo aos cuidados. É um chamado para repensar fluxos e priorizar a agilidade no atendimento oncológico", aponta.
Tempo significa vida
Quanto mais cedo o tratamento é iniciado, maiores serão as chances de cura e menores as complicações. “Esperar algumas semanas para o início do tratamento é aceitável e acontece em qualquer local do mundo, mas após quatro a seis semanas, alguns estudos já demonstraram que há comprometimento da eficácia terapêutica”, ressalta.
Na prática, o diagnóstico precoce permite tratamentos menos agressivos, com melhores resultados e mais qualidade de vida. O grande objetivo do rastreamento é justamente encontrar o tumor antes que ele avance ou se espalhe. No caso do câncer de mama, a mamografia é o principal exame de rastreamento e pode ser complementada pela ultrassonografia, principalmente em mamas densas, ou por ressonância magnética, em casos mais específicos, por isso a importância de se manter constância entres as consultas médicas e exames.
Outro aspecto de relevância diz respeito ao autocuidado e à atenção ao próprio corpo. "Observar as mamas regularmente, manter consultas em dia e adotar hábitos saudáveis – como alimentação equilibrada e atividade física – ajuda, não apenas a reduzir os riscos, mas também a favorecer o diagnóstico precoce", explica Romualdo. De acordo com o especialista, há evidências de que o exercício físico ajuda a controlar hormônios relacionados ao crescimento tumoral e que o manejo do estresse também favorece o equilíbrio do corpo.
Romualdo alerta ainda que, nos cuidados diários, é primordial ter atenção a sinais como carocinhos nas mamas, alterações na pele, retração do mamilo ou saída de secreção. "Qualquer mudança percebida deve ser avaliada, o quanto antes, por um médico especialista e, na Rede Américas, contamos com um corpo clínico focado na área de mama", indica. O médico reforça, porém, que o ideal é que o diagnóstico aconteça antes do aparecimento de qualquer sintoma — e é justamente por isso que as campanhas de rastreamento, com a realização regular da mamografia, são tão importantes para detectar alterações ainda invisíveis ao toque. Por essa razão, o autoconhecimento das mamas é fundamental.
"A mulher que se observa regularmente tem mais chances de identificar alterações em estágio inicial, mas é o rastreamento que permite o diagnóstico mesmo quando não há sinais aparentes. A prevenção deve ser um hábito, não uma campanha isolada. É fundamental reforçar a importância de consultas e exames durante todo o ano e não apenas nesse período em que muito se fala sobre a saúde feminina. Na Oncologia Américas, incentivamos o cuidado contínuo e a informação permanente – o Outubro Rosa é um lembrete, mas o compromisso com a saúde deve ser uma constante", complementa.
Rastreamento e prevenção
O diagnóstico do câncer de mama, realizado por meio de exames periódicos, tem papel essencial na identificação precoce da doença, mas não deve ser confundido com a prevenção. A explicação é de Natália Polidorio, líder nacional de Mastologia da Rede Américas, que destaca a importância de compreender a diferença entre esses dois conceitos.
"O rastreamento com mamografia anual — que deve ser feito a partir dos 40 anos em mulheres com risco habitual, ou antes disso em casos de maior predisposição — tem o objetivo de diagnosticar o tumor, antes que ele apresente sinais clínicos, e, também antes de ser palpável ou causar sintomas”, afirma. Segundo a médica, quando o tumor é identificado logo, “as chances de cura são maiores e, muitas vezes, o tratamento pode ser menos agressivo", diz.
A médica ressalta, porém, que o rastreamento não impede o surgimento da doença. “Prevenção é diminuir o risco ou a incidência do câncer de mama. E, para isso, o exame não se aplica, pois apenas identifica algo que já está lá”, explica.
A especialista também faz o alerta de que a verdadeira prevenção está ligada aos hábitos de vida. “É fundamental orientar a paciente sobre a prática de atividade física. Diversos estudos mostram que esse hábito pode diminuir até 20% o risco de desenvolver um tumor na pós-menopausa”, destaca. Além disso, manter uma dieta com baixo teor de gordura e evitar o sobrepeso e a obesidade também são atitudes fundamentais, já que esses são grandes fatores de risco para o câncer de mama”.
Detecção precoce
Aos 26 anos, a então estudante de medicina Alexia Gonçalves dos Santos recebeu um diagnóstico que mudaria sua vida: câncer de mama. Na época, cursava o quinto ano da faculdade quando, durante um autoexame, percebeu um nódulo na mama esquerda. Uma semana depois, veio a confirmação da doença. Em questão de semanas, o tumor dobrou de tamanho. “Eu palpava e percebia que estava crescendo. Suspeitei que fosse coisa da minha cabeça, mas o médico confirmou a minha impressão”, relembra.
Após a confirmação do diagnóstico inicial e avaliação da equipe médica, foi indicada uma cirurgia imediata. Alexia passou por uma mastectomia total da mama esquerda, com retirada de linfonodos, aréola e mamilo. Só após o procedimento veio a confirmação do diagnóstico: adenocarcinoma de pequenas células, um tipo raro de câncer que representa menos de 1% dos tumores de mama.
Após a cirurgia, enfrentou seis ciclos de quimioterapia e cinco sessões de radioterapia. Mesmo diante das dificuldades, manteve o foco e o otimismo. “Eu nunca pensei que fosse morrer. Sempre foquei no próximo passo: primeiro a cirurgia, depois a quimio, depois a rádio. Encarei tudo de forma racional. Mas confesso que, quando o PET-SCAN mostrou uma alteração no cérebro, eu surtei. Felizmente, uma ressonância revelou que não era nada”, conta.
Hoje, aos 29 anos, Alexia é médica, trabalha em um pronto-socorro e se prepara para a residência em clínica médica. Inspirada pela própria trajetória, ela planeja se especializar em oncologia ou cuidados paliativos. A experiência a transformou profundamente e mudou também sua forma de cuidar dos outros. "Quando vejo alguém enjoado ou exausto depois da quimio, eu lembro como era. Eu teria empatia de qualquer jeito, mas agora é muito maior. Procuro ouvir e acolher os pacientes da melhor maneira que eu posso", reflete.
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Sobre a Rede Américas A Rede Américas é a segunda maior rede de hospitais privados do Brasil, com atuação em oito estados (SP, RJ, PR, BA, PE, MA, SE, RN) e no DF. São 27 hospitais e 42 unidades oncológicas, resultado da joint venture entre Dasa e Amil. |
