A proteína é um macronutriente essencial, fundamental para a construção de músculos, a reparação de tecidos e a produção de enzimas e hormônios. Com a popularização de dietas hiperproteicas para emagrecimento e ganho de massa muscular, surge uma dúvida recorrente e importante: qual é o limite? O consumo excessivo de proteína pode, de fato, sobrecarregar órgãos vitais como os rins e o fígado?
A resposta para essa pergunta é complexa e depende crucialmente do estado de saúde de cada indivíduo. Este artigo irá explorar, com base em evidências científicas, como o corpo lida com o excesso de proteína e quais os potenciais impactos sobre esses dois órgãos vitais, diferenciando os riscos para pessoas saudáveis e para aquelas com condições preexistentes.
Como o corpo processa a proteína e o que acontece com o excesso?

Quando consumimos proteínas, nosso sistema digestivo as quebra em suas unidades básicas, os aminoácidos. Esses aminoácidos são usados para as diversas funções construtoras no corpo. No entanto, ao contrário dos carboidratos e das gorduras, o corpo não possui um sistema para armazenar aminoácidos em excesso para uso futuro.
O excedente precisa ser processado. Essa tarefa cabe principalmente ao fígado, que remove o grupo de nitrogênio dos aminoácidos em um processo chamado deaminação. A remoção desse nitrogênio gera amônia, uma substância tóxica que o fígado rapidamente converte em ureia, um composto muito menos tóxico. Essa ureia é então liberada na corrente sanguínea para ser eliminada pelo corpo.
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Qual é a verdadeira carga do excesso de proteína sobre os rins?
É aqui que os rins entram em cena. Sua principal função é filtrar os resíduos do sangue, e a ureia é um dos principais compostos que eles precisam remover. Uma dieta rica em proteínas aumenta a quantidade de ureia no sangue, forçando os rins a trabalhar mais para filtrá-la e excretá-la na urina. Isso aumenta a taxa de filtração glomerular (TFG), uma medida do trabalho renal.
Para um indivíduo com rins saudáveis, essa carga de trabalho extra geralmente não representa um problema. Os rins são órgãos resilientes e capazes de se adaptar. Contudo, a situação é drasticamente diferente para pessoas com doença renal crônica (DRC) preexistente. Nesses casos, a sobrecarga pode acelerar a perda da função renal. Por isso, a National Kidney Foundation recomenda uma dieta com controle de proteína para pacientes renais, a fim de diminuir a progressão da doença.
De que maneira o fígado é impactado por uma dieta hiperproteica?

Como principal centro do metabolismo de proteínas, o fígado também sente o impacto de uma ingestão excessiva. O trabalho constante de converter o excesso de aminoácidos em ureia e outros substratos representa um aumento da carga metabólica sobre o órgão.
Em indivíduos com um fígado saudável, não há evidências claras de que uma dieta rica em proteínas cause danos diretos. No entanto, para pessoas com doenças hepáticas preexistentes, como cirrose ou a doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA), a situação é mais delicada. O metabolismo alterado nesses pacientes pode dificultar o processamento do excesso de proteína, sendo crucial um acompanhamento profissional para definir a ingestão adequada, que pode variar conforme o caso.
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Quais são os sinais de que a ingestão de proteína pode estar excessiva?

O corpo pode dar alguns sinais de que a ingestão de proteína está sobrecarregando o sistema. É importante estar atento a esses sintomas, que podem indicar a necessidade de reavaliar a dieta.
Desidratação e sede constante
O processo de excreção da ureia pelos rins requer uma quantidade significativa de água. Se a hidratação não for adequada, o risco de desidratação aumenta, o que se manifesta como sede constante e urina mais escura e concentrada.
Hálito desagradável
Um hálito com odor forte, às vezes descrito como frutado ou semelhante a amônia, pode ser um sinal. Isso pode ocorrer devido à produção de cetonas (em dietas muito baixas em carboidratos e altas em proteína) ou ao acúmulo de subprodutos do metabolismo proteico.
Alterações no hábito intestinal
Muitas dietas hiperproteicas, especialmente aquelas que restringem carboidratos, podem ser pobres em fibras. A falta de fibras é uma causa comum de constipação e outros desconfortos digestivos.
Cansaço inexplicável
Embora pareça contraintuitivo, o cansaço pode ser um sintoma. Uma sobrecarga nos rins e no fígado, juntamente com a desidratação, pode levar a uma sensação de fadiga e falta de energia.
Por que a avaliação profissional é fundamental antes de adotar uma dieta hiperproteica?
A quantidade “ideal” de proteína varia enormemente de pessoa para pessoa, dependendo da idade, sexo, peso, nível de atividade física e, mais importante, do estado de saúde geral. As recomendações da World Health Organization (WHO) para um adulto saudável médio são modestas, em torno de 0,83 gramas por quilo de peso corporal. Dietas que excedem significativamente esse valor devem ser tratadas com cautela.
Antes de iniciar qualquer dieta rica em proteínas, é indispensável consultar um médico para avaliar sua função renal e hepática através de exames de sangue. Com base nesses resultados, um nutricionista poderá calcular suas necessidades proteicas individuais de forma segura, garantindo que sua dieta seja equilibrada e não coloque sua saúde em risco. Autosuplementação ou a adoção de dietas extremas sem orientação profissional é uma prática perigosa.