Na cidade de João Pessoa, na Paraíba, um incidente trágico ocorreu no Parque Zoobotânico Arruda Almeida, envolvendo a morte de um jovem de 19 anos, Gerson de Melo Machado. A morte foi resultado de um ataque de uma leoa, causando chocante repercussão na região. Segundo o Instituto Médico Legal (IML), Gerson morreu devido a um choque hemorrágico depois que vasos cervicais foram perfurados pela mordida do animal.
Embora o episódio tenha ganhado destaque pela violência do ataque, ele também chama atenção para um aspecto muitas vezes negligenciado: o impacto dos transtornos mentais graves, como a Esquizofrenia, na tomada de decisões e na percepção de risco. Em muitos casos, comportamentos que à primeira vista parecem irracionais ou imprudentes podem estar profundamente ligados a sintomas como delírios, alucinações auditivas ou visuais, desorganização do pensamento e forte alteração do juízo crítico, que compromete a capacidade de avaliar perigo e consequências.
Que investigações estão em curso?
As autoridades locais iniciaram uma investigação para compreender as circunstâncias que levaram ao incidente. Além da autópsia, um exame toxicológico complementar está sendo realizado para verificar se havia substâncias no organismo do jovem. Também são analisadas as gravações e testemunhos de pessoas presentes no local, evidências que podem esclarecer o que motivou o jovem a tomar tal decisão arriscada.
Em paralelo, é considerada pelas autoridades a hipótese de que transtornos mentais mais graves, como a Esquizofrenia, possam ter influenciado o julgamento e a percepção de risco do jovem, caso isso venha a ser confirmado pelo histórico médico e por laudos psiquiátricos. Nesses casos, a avaliação de prontuários, acompanhamento em serviços de saúde mental e a eventual existência de tratamentos interrompidos ou irregulares tornam-se elementos importantes para entender o contexto em que o ato foi praticado.
A Esquizofrenia é um transtorno mental crônico caracterizado por sintomas como delírios (crenças firmes que não correspondem à realidade), alucinações (principalmente auditivas, como vozes), pensamento desorganizado e, em alguns casos, comportamento desorganizado ou catatônico. Em momentos de crise ou descompensação — por exemplo, quando o tratamento medicamentoso é suspenso, feito de forma irregular ou quando há uso associado de álcool e outras drogas — a pessoa pode apresentar atitudes de alto risco, sem plena consciência do perigo. Por isso, a investigação também busca compreender se havia sinais de agravamento recente do quadro, como isolamento social extremo, discurso desconexo, aumento de comportamentos impulsivos ou relatos de “vozes” dando ordens (alucinações auditivas de comando).
O corpo do jovem, após a realização dos exames legais, será liberado para sua família. A administração do parque divulgou uma nota oficial destacando seu compromisso com a segurança dos visitantes e funcionários, além de assegurar total transparência durante o processo investigativo. Paralelamente, o caso reforça a importância de que laudos psiquiátricos, históricos de internações, uso de medicação antipsicótica e possíveis quebras de adesão ao tratamento sejam analisados com rigor, não com intuito de culpabilizar o indivíduo, mas para identificar falhas na rede de cuidado e oportunidades de prevenção que possam evitar tragédias semelhantes.
Qual o papel do parque e das autoridades?
O Parque Zoobotânico Arruda Almeida, gerido pela Secretaria de Meio Ambiente de João Pessoa, fechou suas portas temporariamente como medida de precaução. Essa decisão visa garantir a segurança enquanto a apuração dos fatos é realizada. O histórico do jovem foi revelado pelas autoridades, indicando que ele possuía transtornos mentais, com registros de múltiplas detenções, algumas ainda na adolescência.
Em situações em que se suspeita de transtornos como a Esquizofrenia, o papel dos serviços médicos e da rede de atenção psicossocial é fundamental. O acompanhamento psiquiátrico regular, o uso adequado de medicação, o apoio psicológico e a participação da família no tratamento podem reduzir comportamentos de risco, desorganização do pensamento e possíveis impulsos que levem a atitudes perigosas, como a invasão de áreas restritas. A articulação entre médicos, familiares e órgãos públicos é essencial para garantir que pessoas vulneráveis recebam cuidados contínuos e sejam protegidas de ambientes que possam representar ameaça à sua integridade.
Nesse contexto, ganha relevância a atuação dos CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) e serviços equivalentes, responsáveis pela oferta de cuidado territorializado, próximo da realidade de vida do paciente e de sua família. Planos terapêuticos singulares, visitas domiciliares, grupos terapêuticos, acompanhamento de uso de medicações antipsicóticas e o monitoramento de sinais de recaída — como insônia persistente, aumento da agitação, discurso persecutório ou religiosidade exacerbada e súbita — são ferramentas que ajudam a antecipar crises e a orientar a família sobre como agir. A comunicação entre equipes de saúde mental, serviços de urgência, rede de assistência social e órgãos de segurança pública também é central para construir estratégias de proteção que respeitem a dignidade da pessoa com Esquizofrenia, ao mesmo tempo em que consideram situações de potencial risco.
Como comportam-se leões em cativeiro?
Na natureza, leões têm instintos de caça e territorialidade, características que podem ser mantidas mesmo no cativeiro. A bióloga responsável pela leoa explicou que o ataque foi resultado desse comportamento natural, sem intenção predatória. A presença de visitantes muitas vezes não altera o comportamento dos animais, mas invasões inesperadas em seus territórios podem provocar reações defensivas.
Por esse motivo, zoológicos e parques implementam medidas de segurança, como altas cercas e barreiras, para evitar contatos perigosos entre visitantes e animais. Entretanto, quando essas medidas são transgredidas, situações de risco podem ocorrer.
Quando se considera o possível envolvimento de um transtorno como a Esquizofrenia, é importante compreender que a percepção da realidade do indivíduo pode estar profundamente alterada. Em um surto psicótico, por exemplo, ele pode interpretar o ambiente do zoológico de forma completamente distorcida — enxergando o animal como uma figura simbólica, uma entidade protetora ou até acreditando que possui algum tipo de missão espiritual relacionada àquele espaço. Nessas circunstâncias, o ato de ultrapassar barreiras de segurança pode não ser visto, pela própria pessoa, como risco real, mas como uma necessidade imposta por suas crenças delirantes ou pelas vozes que ouve.
Refletindo Sobre Segurança e Cuidados em Zoológicos
O incidente em João Pessoa nos relembra da importância de protocolos rígidos de segurança em locais que abrigam animais selvagens. Isto não só visa proteger os visitantes, mas também os próprios animais, que podem ser prejudicados por invasões não autorizadas a seu ambiente. As autoridades e administrações de zoológicos devem permanecer vigilantes e aplicar melhorias constantes nas medidas de segurança.
A trágica morte de Gerson de Melo Machado é um lembrete sobre as consequências de se ignorar tais normas de segurança. Além disso, levanta questões sobre a responsabilidade de supervisionar indivíduos com vulnerabilidades mentais em ambientes de risco, destacando a necessidade de um suporte adequado da comunidade e das autoridades pertinentes.

Nesse contexto, quadros como a Esquizofrenia — que podem envolver delírios, alucinações e alterações importantes na percepção da realidade — demandam atenção especial da equipe médica e da família. Um cuidado médico integral, com avaliação psiquiátrica periódica, acompanhamento em CAPS ou serviços equivalentes e planos de manejo para episódios de crise, contribui para prevenir situações de exposição indevida a perigo. O caso reforça o quanto é importante identificar precocemente sinais de agravamento do quadro, ajustar o tratamento conforme orientação médica e evitar que pessoas em sofrimento psíquico circulem sozinhas em locais potencialmente arriscados, sempre em respeito à sua dignidade e aos seus direitos.
Também é crucial combater o estigma em torno da Esquizofrenia. A maioria das pessoas com esse diagnóstico não é violenta e pode levar uma vida estável quando recebe tratamento adequado, apoio familiar e inclusão social. Incidentes extremos, como o ocorrido, não devem servir para reforçar preconceitos, mas para evidenciar falhas na rede de cuidado, na continuidade do tratamento e na proteção a pessoas em crise. Investir em políticas públicas de saúde mental, ampliar o acesso a psiquiatras, psicólogos, enfermagem especializada e serviços comunitários, bem como promover campanhas educativas sobre sinais de alerta e caminhos de ajuda, são medidas fundamentais para que tragédias semelhantes sejam prevenidas e para que pessoas com Esquizofrenia sejam vistas não como ameaça, mas como sujeitos de direitos que necessitam de cuidado, acolhimento e acompanhamento constante.
Entre em contato:
Dra. Anna Luísa Barbosa Fernandes
CRM-GO 33.271










