A mastigação lenta é frequentemente subestimada no processo digestivo. Este hábito simples não afeta apenas a digestão, mas também envia sinais cruciais ao cérebro sobre a saciedade. Abordaremos como o ritmo da alimentação pode influenciar o controle do apetite e o metabolismo.
Por que a velocidade da alimentação impacta a saciedade?
O cérebro não registra a saciedade instantaneamente. Existe um atraso (cerca de 15 a 20 minutos) entre o início da refeição e a liberação dos hormônios que sinalizam “estou satisfeito”.
Hormônios como a leptina (saciedade) e a grelina (fome) são regulados por esse processo. Comer rápido “atropela” esse sistema de feedback, levando a um consumo excessivo de calorias antes que o cérebro perceba que o estômago está cheio.
Mastigar devagar dá ao corpo o tempo necessário para que esses sinais hormonais sejam enviados e recebidos. Isso permite que a sensação de saciedade se instale naturalmente, ajudando a regular o tamanho das porções sem esforço consciente.

Mastigar mais queima realmente mais calorias?
O ato de mastigar em si queima calorias, mas o efeito é mínimo e não deve ser visto como um exercício. A verdadeira vantagem metabólica da mastigação lenta vem da termogênese induzida pela dieta (TID).
A TID é a energia que o corpo gasta para digerir, absorver e metabolizar os nutrientes dos alimentos. Algumas pesquisas sugerem que comer mais devagar pode aumentar ligeiramente essa queima calórica pós-refeição, pois o processo digestivo se torna mais eficiente.
Um estudo publicado pelo National Institutes of Health (NIH) dos EUA explorou como a mastigação afeta o gasto energético. Embora o efeito na TID seja pequeno, ele se soma à principal vantagem, que é a melhora do controle do apetite, contribuindo indiretamente para o balanço energético.

Como a mastigação afeta a digestão inicial dos alimentos?
A digestão dos carboidratos começa na boca, não no estômago. A saliva contém uma enzima chamada amilase salivar (ptialina), que inicia a quebra de amidos complexos em açúcares mais simples.
Mastigar pouco significa que os alimentos chegam ao estômago em pedaços maiores e menos expostos à saliva. Isso força o estômago e o pâncreas a trabalharem mais para quebrar quimicamente o alimento, podendo levar a desconfortos como inchaço e má absorção de nutrientes.
@drpaulotramontin Coma devagar!!! 04 razões pra você mastigar 20x cada porção de comida que puser na boca!! #gastrite #saude #alimentacaosaudavel #hipertensão #viral@Isabela Sari ♬ som original – Dr. Paulo Tramontin Marques
Quais hormônios do intestino são ativados ao comer devagar?
Quando comemos devagar, permitimos que os alimentos cheguem ao intestino delgado de forma mais gradual. Isso otimiza a liberação de hormônios intestinais cruciais para a saciedade, como o GLP-1 e a colecistoquinina (CCK).
O GLP-1 e a CCK atuam de múltiplas formas: eles retardam o esvaziamento gástrico (mantendo a sensação de estômago cheio por mais tempo) e enviam sinais potentes de saciedade ao hipotálamo, no cérebro.
Comer rápido inunda o sistema, e esses sinais podem não ser liberados de forma tão eficaz. A tabela abaixo resume os principais hormônios envolvidos.
| Hormônio | Origem | Ação Principal na Saciedade |
| Grelina | Estômago | Aumenta a fome (diminui ao comer) |
| CCK | Intestino | Retarda o esvaziamento gástrico |
| Leptina | Células de gordura | Sinaliza saciedade (longo prazo) |
Como posso treinar o hábito de comer mais devagar?
Mudar um hábito automático como a velocidade da alimentação exige prática consciente. A atenção plena (mindfulness) durante as refeições é a ferramenta mais eficaz para essa reeducação.
Uma técnica simples é descansar os talheres na mesa entre uma garfada e outra. Isso cria uma pausa forçada, obrigando o cérebro a registrar o alimento e a respiração, em vez de focar apenas na próxima mordida.
Outras estratégias práticas incluem:
- Tentar mastigar cada garfada um número específico de vezes (ex: 15 a 20 vezes).
- Beber pequenos goles de água entre as garfadas (sem exagerar).
- Evitar distrações, como assistir TV ou usar o celular durante as refeições. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda uma alimentação saudável, e a forma como comemos é parte integrante disso.
Desafio prático: o exercício de 1 minuto para treinar sua mastigação
Seu cérebro está acostumado a comer no “piloto automático”. Para quebrar esse hábito, o primeiro passo é forçar uma pausa consciente antes de a refeição começar de verdade. Existe um exercício clássico de mindful eating (alimentação consciente) que ajuda exatamente nisso, e ele dura menos de um minuto.
Embora muitas vezes seja feito com uma uva-passa (o “desafio da uva-passa”), ele funciona com qualquer alimento. O objetivo é usar apenas a primeira garfada da sua refeição para “acordar” o seu cérebro e ajustar o ritmo para o resto da refeição.

Como aplicar o exercício na sua próxima refeição
Pegue a primeira garfada do seu prato e, antes de mastigar e engolir em segundos, siga estes passos:
- Observe (10 segundos): Antes de levar a comida à boca, apenas olhe para ela. Repare nas cores, nas texturas e no vapor (se estiver quente).
- Cheire (5 segundos): Aproxime o garfo do nariz e cheire profundamente. Tente identificar os temperos. Grande parte da saciedade começa pelo aroma.
- Coloque na boca (sem morder): Coloque o alimento na boca, mas não mastigue ainda. Apenas sinta a textura e a temperatura dele contra sua língua.
- Mastigue (muito devagar): Agora sim, comece a mastigar. Conte quantas vezes você mastiga e preste atenção em como o sabor e a textura mudam. Tente chegar a 15 ou 20 mastigações.
- Engula conscientemente: Sinta o alimento descendo.
Pronto. Ao fazer isso apenas com o primeiro bocado, você quebra o padrão automático de velocidade e torna muito mais fácil manter um ritmo lento pelo resto da refeição.







