Na cultura moderna, que muitas vezes glorifica a produtividade em detrimento do descanso, dormir pouco é frequentemente visto como um mal necessário ou até mesmo uma virtude. No entanto, um corpo crescente de evidências científicas demonstra que a privação crônica de sono é um dos fatores de risco mais significativos para o ganho de peso e a obesidade. O hábito de dormir consistentemente seis horas ou menos por noite, embora comum, desencadeia uma cascata de desregulações hormonais e comportamentais que podem sabotar até mesmo a dieta e o plano de exercícios mais disciplinados.
Este artigo irá explorar os mecanismos fisiológicos que explicam por que a falta de sono e o ganho de peso andam de mãos dadas, ressaltando que a dificuldade persistente para dormir é uma questão de saúde que merece atenção médica.
Como a falta de sono desregula os hormônios da fome e da saciedade?

O nosso apetite não é apenas uma questão de força de vontade; ele é rigorosamente controlado por hormônios. Dois dos principais atores nesta regulação são a grelina e a leptina. A grelina, produzida no estômago, é o “hormônio da fome”, que sinaliza ao cérebro que é hora de comer. A leptina, produzida pelas células de gordura, é o “hormônio da saciedade”, que sinaliza que estamos satisfeitos.
Conforme demonstrado em inúmeros estudos, a privação de sono causa um desequilíbrio devastador nesta dupla. Pesquisas revisadas pelo National Institutes of Health (NIH) mostram que dormir pouco leva a um aumento nos níveis de grelina e a uma diminuição nos níveis de leptina. O resultado é um “cenário perfeito” para o ganho de peso: você sente mais fome, e ao mesmo tempo, precisa de mais comida para se sentir satisfeito.
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Qual o impacto da privação de sono nas nossas escolhas alimentares?
O impacto da falta de sono vai além da regulação hormonal e afeta diretamente a nossa capacidade de tomar decisões. A privação de sono prejudica a função do córtex pré-frontal, a área do cérebro responsável pelo julgamento, pelo controle de impulsos e pela tomada de decisões racionais.
Ao mesmo tempo, a falta de sono aumenta a atividade nos centros de recompensa do cérebro. Isso significa que, quando você está cansado, sua capacidade de dizer “não” está enfraquecida, enquanto o desejo por alimentos altamente palatáveis — ricos em açúcar, gordura e sal — está amplificado. É por isso que, após uma noite mal dormida, a tendência é buscar “comfort food” e alimentos de alta densidade calórica, em vez de opções mais saudáveis.
A resistência à insulina pode ser agravada por noites mal dormidas?
Sim, e este é um dos efeitos metabólicos mais perigosos da privação de sono. A insulina é o hormônio que ajuda as células a absorverem a glicose do sangue para usar como energia. A resistência à insulina ocorre quando as células não respondem bem à insulina, o que leva a um acúmulo de açúcar no sangue e força o corpo a armazenar esse excesso como gordura.
Estudos clínicos, incluindo alguns publicados em periódicos de alto impacto como The Lancet, mostraram que mesmo algumas noites de sono restrito podem diminuir significativamente a sensibilidade à insulina em indivíduos saudáveis, a um nível comparável ao de pessoas com pré-diabetes. A resistência à insulina crônica não só promove o ganho de peso, especialmente na região abdominal, como também é um precursor direto do diabetes tipo 2.
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O cansaço diurno afeta o gasto calórico de que maneira?
A falta de sono impacta negativamente os dois lados da equação do balanço energético: aumenta a ingestão de calorias e, ao mesmo tempo, pode diminuir o gasto.
Redução da atividade física espontânea
Quando estamos cansados, nossa tendência natural é nos movermos menos. Isso inclui a redução da termogênese por atividade não-exercício (NEAT), que engloba todos os movimentos que não são exercício formal, como caminhar até o carro, gesticular ou subir escadas. Essa redução no movimento diário pode diminuir significativamente o gasto calórico total.
Menor disposição e performance para o exercício formal
A fadiga diminui a motivação para se exercitar e, quando o exercício é realizado, a performance tende a ser pior. Isso resulta em treinos menos intensos e mais curtos, queimando menos calorias e gerando menos benefícios metabólicos.
Quando a dificuldade para dormir se torna um problema médico?
Sentir-se cansado de vez em quando é normal, mas a dificuldade crônica para dormir ou acordar consistentemente sem se sentir revigorado não é. A recomendação geral de agências de saúde como o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) é que adultos durmam de 7 a 9 horas por noite para uma saúde ótima.
Se você dorme menos de 7 horas por noite de forma rotineira, ou se dorme o suficiente mas ainda acorda cansado, é crucial procurar ajuda profissional. A insônia, a apneia do sono (uma condição grave em que a respiração para e recomeça várias vezes durante a noite) e outras desordens do sono são condições médicas tratáveis. Um médico ou um especialista em sono pode realizar o diagnóstico correto e indicar o tratamento adequado, o que é fundamental não apenas para o controle do peso, mas para a sua saúde geral.







