VIOLÊNCIA

"Nada justifica o que fizeram com meu neto", diz avó de menino estrangulado

Luiz César Ferreira foi assassinado em meados de fevereiro. Em março, a polícia encontrou o corpo do menino em uma fossa e, esta semana, prendeu o suspeito de ter assassinado o garoto, Everaldo Cordeiro de Neves, 21

Darcianne Diogo
Samara Schwingel
postado em 26/09/2020 07:00 / atualizado em 26/09/2020 19:15
 (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press                )
(crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press )

“Nada justifica o que fizeram com meu neto. Sinto muita falta dele e espero que a justiça seja feita”. A declaração é da avó de Luiz César Ferreira, de 12 anos, morto estrangulado com fio de energia elétrica. O crime ocorreu em meados de fevereiro, mas só veio à tona ontem, com a divulgação da prisão do suspeito, identificado como Everaldo Cordeiro de Neves, 21. Investigadores da 8ª Delegacia de Polícia (SIA) o prenderam na quinta-feira, no Recanto das Emas.

Luiz César entrou para a triste estatística de crianças assassinadas — de janeiro a agosto, o DF registrou quatro homicídios de menores de 14 anos, segundo a Secretaria de Segurança Pública. O Correio conversou com a avó da criança, que preferiu não revelar a identidade. A senhora, de 55 anos, morava com o neto desde o começo do ano, na Chácara Santa Luzia, região de construções irregulares na Estrutural. A mulher ficou sabendo da prisão do suspeito pela reportagem. Ao relembrar do menino, ela se emocionou. “Ele era o único dos meus três netos que ainda tinha contato comigo. Vai fazer falta”, lamentou.

Quando Luiz chegou para morar com ela, a avó trabalhava como faxineira para uma produtora de festas. Em alguns dias, o neto a acompanhou no serviço. “Meus chefes conversavam bastante com ele e deram vários conselhos para o futuro de Luiz”, explicou. Após ser vítima de um acidente vascular cerebral (AVC), a mulher deixou o emprego. Nessa época, ela passou a se dedicar inteiramente ao menino. “Fiz planos para ele. Queria mudá-lo de escola, quem sabe até conseguir um lugar melhor para morarmos. Porém, esses sonhos foram interrompidos quando ele sumiu”, disse. A mãe do menino é usuária de drogas, segundo relatou a avó, e não participava da criação da criança. O pai é desconhecido.

Luiz César desapareceu em 16 de fevereiro. A avó conta que o garoto saiu de casa e não voltou mais. À época, ela registrou boletim de ocorrência na delegacia sobre o sumiço do menino. “Cheguei a procurar por ele em Santa Luzia. Perguntei para todo mundo que o conhecia, mas nada”, afirmou.

A polícia acredita que Luiz tenha sido assassinado em meados de fevereiro. Não se sabe, no entanto, a data exata da morte. O corpo da criança foi encontrado em 26 de março, após os investigadores receberem uma denúncia anônima. Ao chegarem no endereço, na Rua SL 50, Quadra 55, próximo ao Lote 8, os policiais se depararam com um corpo, em que havia um fio de energia elétrica enrolado no pescoço.

De acordo com a apuração policial, após matá-la, o suspeito colocou a criança em um saco plástico, a jogou dentro de uma fossa de, aproximadamente, três metros de profundidade e, em seguida, cobriu com areia. O Corpo de Bombeiros do DF foi acionado para ajudar na retirada do corpo. “O cadáver estava em estado avançado de decomposição. A identidade da vítima somente pôde ser confirmada em razão do trabalho pericial do Departamento de Polícia Técnica do Instituto de Medicina Legal, com a produção do laudo cadavérico e de um elaborado laudo antropológico, a partir da arcada dentária da criança”, detalhou o delegado-chefe da 8ª DP, Rodrigo Bonach.

Prisão e motivação

Após monitoramento policial, os investigadores localizaram Everaldo Cordeiro em uma chácara, no Recanto das Emas. Segundo o delegado, o homem havia passado por diversos endereços para não ser capturado: Águas Lindas (GO), Santo Antônio do Descoberto (GO) e Planaltina.

As investigações revelaram que o acusado nunca morou na Chácara Santa Luzia e não conhecia a criança. “Ele tinha uma parente, que estava internada em um hospital público do DF. Essa mulher tem um terreno na chácara e teria pedido a ele para que vigiasse o local, enquanto ela não estava presente”, disse o delegado.

Everaldo ficou cerca de um mês na área, e foi nesse período em que cometeu o assassinato. “Provavelmente, ele atraiu o menino para dentro do barraco e o matou em seguida. Foi um assassinato que ninguém viu ou ouviu nada. Ficou ali, entre quatro paredes”, completou o investigador.

A vizinhança e a avó da criança contaram que o menino era usuário de drogas e cometia pequenos furtos na região, mas, segundo a polícia, não há evidências de que o assassinato teria ocorrido por esse motivo. “Não temos como dizer o que realmente aconteceu, até porque não houve testemunhas e, durante o interrogatório, o suspeito permaneceu em silêncio”, frisou Rodrigo Bonach.

Sem registro de antecedentes criminais, agora, ele responderá criminalmente por homicídio doloso triplamente qualificado, em razão de ter sido praticado por motivo fútil, asfixia e mediante recurso que impossibilitou defesa da vítima, além da ocultação de cadáver. Caso seja condenado, o acusado poderá receber penas que, somadas, alcançam 33 anos de reclusão.

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Região precária

A Chácara Santa Luzia é considerada uma área irregular, está localizada ao lado do Parque Nacional de Brasília e conta com cerca de 18 mil habitantes. Quem adentra o local, percebe a falta de apoio com que sofre a população. A dona de casa Maria Jarcilene da Silva, 42, vive há quatro anos no local e considera que o governo precisa olhar mais para os moradores de Santa Luzia. “A água que utilizo no meu dia a dia fede, porque fui obrigada a furar uma cisterna para mim e acertei a fossa do vizinho”, expõe. No entanto, a dona de casa afirma que não deseja sair da região. “O ideal seria que o governo apoiasse mais e realizasse obras para melhorar a vida de quem está aqui”, avalia.

O militar Micael Martins, 19, mora em Santa Luzia há poucos meses, mas, também, considera que é preciso mais apoio do governo local. “É complicado andar por aqui, pois, além da falta de asfalto, tem muito lixo na rua”, conta. O militar vive em um lote com os pais e a mulher. Apesar das dificuldades, ele não expressa desejos de deixar a região. “São só essas questões de estrutura e, às vezes, segurança. Ficamos sabendo de um caso ou outro de violência que, talvez, poderia ser evitado com maior fiscalização”, conclui.

A Administração Regional SCIA/Estrutural informou que, com apoio de outras pastas do Governo do Distrito Federal (GDF), além de colaboração da iniciativa privada, tem realizado ações de limpeza e recolhimento de entulhos e inservíveis. Por meio de nota oficial, o órgão acrescentou que ações sociais de entrega de cestas básicas, equipamentos de proteção contra a covid-19 e fornecimento de água por meio de carros-pipa e chafariz são realizados na região de Santa Luzia.

Em relação a possíveis melhorias, o GDF informou que, em função de uma ação pública civil, está impedido de realizar quaisquer obras de infraestrutura naquela região, até que haja uma decisão judicial.

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