ENTREVISTA

Economia do DF dá sinais de recuperação, diz secretário

Governo trabalha com previsão de crescimento em 2021, e a retomada, após os piores momentos da pandemia do novo coronavírus, está acontecendo, segundo o chefe da pasta, em entrevista ao CB.Poder. Aprovação do Refis deve injetar R$ 500 milhões ainda neste ano

Alan Rios
postado em 20/10/2020 06:00
 (crédito: Ana Rayssa/CB/D.A Press)
(crédito: Ana Rayssa/CB/D.A Press)

A recuperação econômica do Distrito Federal, após os períodos mais críticos da pandemia do novo coronavírus, já começou, segundo o secretário de Economia, André Clemente. O responsável pela pasta concedeu entrevista, ontem, ao CB.Poder — parceria do Correio com a TV Brasília —, e comentou sobre o cenário atual e futuro da capital quanto aos números dos cofres públicos. Clemente anunciou a convocação de policiais militares e bombeiros aprovados em concurso, comentou sobre o proposta de enxugar o Estado, analisou a questão das privatizações e explicou o novo Programa de Incentivo à Regularização Fiscal do Distrito Federal (Refis-DF 2020). O secretário avaliou que o texto atual, que voltou à Câmara Legislativa na última semana, é mais adequado a realidade atual, com um teto de dívidas de R$ 100 milhões e uma previsão de R$ 500 milhões a mais em arrecadação do DF ainda este ano. Clemente também calculou uma economia de R$ 7 milhões por mês com o teletrabalho dos servidores, que deve ser cada vez mais parte da realidade do serviço público.

Projeto do Refis voltou para a Câmara Legislativa, por que ele é tão importante nesse momento?

Porque saneia empresas e aumenta a arrecadação. No momento em que estamos, ainda enfrentando a pandemia, com efeitos na saúde, sociais e econômicos é fundamental fazer esse resgate da capacidade fiscal das empresas e arrecadar mais impostos para fechar o ano com equilíbrio fiscal. A estimativa da secretaria com essa arrecadação é em torno de R$ 500 milhões. Essa é uma inovação. É um Refis muito agressivo e adequado às necessidades atuais da população. Inclusive, esses parâmetros foram até utilizados pela União para descontos no principal de impostos.

Qual o modelo desse novo Refis?

Esses programas de recuperação fiscal geralmente têm descontos nas multas e nos juros, mas percebemos que, ao longo dos anos, em face da burocracia que é a legislação tributária no país inteiro, as dívidas tributárias continuam crescendo e precisamos dar vazão a isso. O imposto uma vez sonegado é muito difícil recolher. Para isso, os programas de recuperação. As empresas ficam saneadas. Esse Refis é diferente dos outros, porque inova ao dar desconto no principal para os débitos muito antigos. Temos na dívida ativa débitos desde 1966, que não são arrecadados. Esses recursos fazem falta no caixa público. A Câmara Legislativa tem prestado grande serviço ao Distrito Federal, melhorando os projetos do governo, e está antenada às necessidades da população, dos empresários. Os devedores são mais de 300 mil contribuintes — pessoas físicas em torno de 250 mil, umas 70 mil pessoas jurídicas. Então, eles (os distritais) estão atentos às necessidades de Brasília e sabem que esses recursos são importantes para alimentar as políticas públicas locais

O projeto foi para a Câmara no primeiro semestre e acabou rejeitado, mas agora houve um diálogo com os deputados, com o setor produtivo também para fazer alterações e mandar novamente. Quais as principais diferenças desse projeto atual?

Esse projeto quando foi encaminhado no primeiro momento era uma outra realidade. A gente estava no início da pandemia, felizmente estava com o convênio do Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária ) aprovado, já prevendo esse Refis de uma forma muito agressiva, todos os parâmetros previstos nesse convênio Confaz, que é um colegiado presidido pelo ministro da Economia, procurador nacional da fazenda nacional, todos os secretários de estado de fazenda do Brasil inteiro olharam o projeto e aprovaram por unanimidade. Esse modelo serviu para que a gente fizesse o projeto de lei. Naquele momento, começava o combate à pandemia, a preocupação de manter a economia aquecida. Agora, já estamos chegando perto do fim do ano com as inovações. Antes havia uma carência do pagamento da primeira parcela de 90 dias, hoje não é mais possível, porque o Refis tem data final para adesão em dezembro. Outro diferencial é um limitador para os débitos muito grandes, acima de R$ 100 milhões, que não podem se beneficiar da redução do principal. São só essas duas mudanças. O restante, os descontos no principal para débitos antigos de até 50%, os descontos dos juros e multas de até 95%, a compensação como precatória, ainda estão previstos. É um Refis inédito, inovador e vai fazer esse governo virar a página de uma realidade econômica do DF.

Como fazer um programa desse tipo sem que passe a mensagem ao contribuinte de que vale a pena não pagar, fazer a sonegação de imposto?

Com ações como melhorar a legislação tributária, melhorar a legislação fiscal. Houve tributos em que nós reduzimos a alíquota e aumentamos a arrecadação. Então, aumentar a alíquota, aumentar a carga tributária, não significa aumento de arrecadação. A outra mensagem vem através dos programas de cidadania fiscal, como o Nota Legal, por exemplo. Esse foi um programa criado por volta de 2007, que estava desacreditado, e nós resgatamos, investimos em tecnologia, ficou mais rápido acessar as informações que lá estão. Colocamos aqueles créditos que deveriam ter sido repassados ao cidadão comum em dia, estamos fazendo sorteios. Ou seja, com essas sistemáticas, legislação, tecnologia, Nota Legal, estamos mostrando para Brasília que vale a pena pagar imposto e fiscalizar a aplicação desses recursos.

O projeto da Lei Orçamentária Anual para o ano está na Câmara também para avaliação. Qual foi o impacto da pandemia na elaboração desse projeto? O que mudou na hora de pensar a lei do ano que vem?

Quando assumimos o governo no ano passado, abandonamos a peça de planejamento, o orçamento público, como uma peça de ficção. Começamos a trabalhar em bases reais. Como isso é feito? Se faz uma estimativa de receita, mas com pé no chão. Assim foi feito. Não colocamos gordura, consideramos a série histórica, as projeções econômicas e com isso conseguimos fazer um orçamento enxuto no ano passado e acomodar as políticas públicas, as despesas de saúde, educação, segurança, obras, nessa realidade. Com isso, conseguimos fechar o ano passado, que previa deficit de menos R$ 150 milhões, aproximadamente, conseguimos fechar com mais de R$ 300 milhões de superavit. Então em 2021 vai se repetir também, porque, com orçamento justo, conseguimos ter equilíbrio fiscal, estimar melhor as receitas e gastar melhor. Mesmo na pandemia, conseguimos um aumento de arrecadação local porque nos adaptamos. Sabíamos que o ICMS teria uma queda, pois várias atividades tiveram um esfriamento no desenvolvimento. Sabíamos também que as atividades relacionadas com vendas de mercadorias e serviços teriam esfriamento. Então, fomos em outras fontes de arrecadação, como o imposto de renda retido na fonte dos servidores e de prestadores de serviços. No global, conseguimos manter a arrecadação, inclusive com ganho real, e com isso pagar as contas. Quando pagamos os servidores e fornecedores, a economia fica aquecida.

O orçamento para o ano que vem tem uma previsão de uma pequena redução nos gastos com pessoal, isso é uma estratégia do governo?

Temos muita preocupação com o atingimento de resultado fiscal, com metas, com equilíbrio e com cumprimento de leis de responsabilidade fiscal. É assim que damos segurança jurídica e que efetivamente conseguimos cumprir nossas políticas públicas. O gasto com pessoal tem se ajustado para aquilo que a população precisa. O DF cresceu muito, hoje somos 3 milhões de habitantes, com mais 3 milhões no Entorno, o que poderia chegar à 6 milhões de pessoas utilizando a infraestrutura e os serviços do DF. Então, precisamos olhar a nova realidade, precisamos de um Estado mais enxuto. A pandemia antecipou uma série de ações que seriam feitas, como, inclusive, o teletrabalho, que vai permitir redução de custos. Verificamos nesse momento de pandemia uma redução de, em torno, R$ 7 milhões por mês com o teletrabalho. Agora, muitas atividades voltarão a ser presenciais, mas vamos investir naquelas áreas que deram certo e têm potencial para o teletrabalho.

As discussões sobre privatização foram acentuadas esse ano, a CEB está com um processo bem adiantado. Esse é o caminho, tirar do Estado essas empresas públicas? O Estado realmente não consegue cuidar delas?

O Estado tem de se reinventar, temos de sair das caixinhas. Assim como o Refis, que tivemos de nos adaptar. Quem sobrevive não é mais forte, é o mais adaptável. Temos de pensar assim. Obviamente, reduzir o tamanho do Estado é uma missão, mas não podemos reduzir e sacrificar o serviço público. As entregas têm de acontecer. Essas privatizações, abertura de capital, o que for acontecer, tem de acontecer com muita responsabilidade. Não posso vender uma empresa para ter aumento de tarifa e piora de serviços, assim como observamos em outros estados. Como se faz isso? Com ações planejadas, controladas, que temos de saber o que estamos vendendo, o porquê de estarmos vendendo e o que vamos exigir de quem vai prestar esses serviços. Seja energia, saneamento, o que for que seja privatizado ou sofra aumento de capital, tem de ser pensado na população. O DF é um estado novo, merece ter uma infraestrutura adequada. Temos condições de ser um modelo ao país inteiro de uma administração pública e de uma prestação de serviços essenciais.

Tem-se falado muito na recuperação da economia no pós-pandemia. O que o GDF tem feito nesse sentido?

O que temos feito foi trabalhado pela segurança jurídica. O que é um ambiente favorável à economia? Segurança jurídica, redução de burocracia, ajuste de carga tributária e incentivo aos investimentos. O DF não pode só viver de administração pública. Temos de incentivar os empreendedores. Isso tem sido feito. Quando nós fizemos, ano passado, o ajuste do ambiente fiscal, não sabíamos que íamos encarar uma pandemia, só que essa antecipação que fizemos foi suficiente para gerar segurança jurídica aos investidores. Grandes empresas do Brasil inteiro vieram para cá e continuam investindo, mesmo no período de pandemia. Alugaram galpões, adquiriram terrenos e instalaram as indústrias, inclusive trazendo o e-commerce para o DF. A recuperação já está acontecendo. Quando temos a condição de manter folha de pagamento em dia, fornecedores em dia, obras em andamento e planejar 2021, acho que a economia está se preservando. Ao contrário do restante do país, nossa economia demora mais a cair e recupera-se mais rápido. Isso porque temos o funcionalismo federal e do DF que alimenta o consumo, a economia. Por vários outros aspectos, temos um ambiente muito favorável ao desenvolvimento econômico.

Apesar de todos os problemas desse ano, é possível ter um crescimento na economia local no ano que vem?

Vamos ter crescimento na economia e isso está, inclusive, previsto na lei orçamentária do ano que vem. Nosso orçamento está saindo de R$ 43 bilhões para R$ 44 bilhões, o Fundo Constitucional está ficando mais ou menos no mesmo tamanho, R$ 15 bilhões, não teve grandes variações, porque a situação na União não foi muito boa e isso influencia o cálculo, e nosso orçamento local está crescendo apenas R$ 1 bilhão. Então, a receita não cresceu muito, mas cresceu. Vários estados estão com situações muito complicadas. Diante disso, vamos ter de fazer uma locação adequada das despesas, estabelecer prioridades e buscar muitos recursos.

Um dos problemas mais sérios do DF é o desemprego, ainda são quase 300 mil pessoas desempregadas, situação que é mais preocupante na pandemia. Qual o caminho para se resolver esse problema? O que o GDF tem feito e vai fazer?

O governo Ibaneis, já na transição, fez um diagnóstico. Uma vez feito isso, o governo sabe que precisa de pessoas para cuidar dessa pauta. Por isso, criou a Secretaria do Trabalho, Secretaria do Empreendedorismo, Secretaria de Economia também tem essa função e a Secretaria do Desenvolvimento Econômico. Todas as outras também têm um viés de desenvolvimento, como a de Cultura, de Turismo e de Esporte, por exemplo. Todas elas estão integradas na geração de emprego. Para que isso aconteça, temos de ter empreendedores, empresas. Várias já vieram para o DF, com investimentos bilionários que estão acontecendo, gerando imposto e emprego.

Muitos órgãos estão com deficit no quadro de pessoal, precisando de recomposição. Há previsão de se fazer concurso?

A máquina precisa funcionar. Ela tem uma estrutura física, administrativa, tem sistemas, computadores, tecnologias, que ajudam a reduzir a quantidade necessária de mão de obra. Mas têm áreas em que são imprescindíveis o trabalho humano. Para isso, temos os concursos públicos. Apesar de todo o projeto de redução de tamanho do Estado, temos de recompor as forças de trabalho e ampliar outras. A população cresceu e o Estado diminuiu sem ser de forma planejada. Temos áreas há mais de 20 anos sem concurso, a categoria da receita tributária, por exemplo, os auditores da receita, estamos há cerca de 20 anos sem concurso. Há um em andamento agora. Você vê que é uma atividade típica, que vai buscar recursos. E estava comprometida a eficácia pela falta dessa mão de obra. Assim como policiais militares também. Até o final do ano chamaremos mais 500, bombeiros também, cerca de 370 novos serão chamados até o fim do ano, ou seja, o Estado tem de estar preparado para atender as necessidades da população.

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