Pandemia

Com 17.843 ocorrências, crimes cometidos pela internet sobem 87,1% em 2020

Aproveitando-se da crise sanitária, criminosos que atuam pela internet intensificaram as ações no ano passado. Em 2020, houve registro de 17.843 casos, aumento de 87,1% em comparação com 2019. Em relação a estelionatos, o crescimento foi de 209%

Darcianne Diogo
postado em 13/02/2021 06:00 / atualizado em 13/02/2021 15:21
 (crédito: Minervino Junior/CB/D.A Press)
(crédito: Minervino Junior/CB/D.A Press)

“Inspetores” do novo coronavírus, agendamento da vacina contra a covid-19 pelo “Ministério Público da Saúde”, pesquisas telefônicas fraudulentas. Essas e outras estratégias são utilizadas por criminosos que atuam na internet e usam a pandemia para aplicar golpes. Os crimes virtuais dispararam, no Distrito Federal. Em 2020, observou-se alta de 87,1 %, em comparação a 2019, de delitos praticados pela web, quando foram registradas 17.843 ocorrências — sendo 9.529 estelionatos —, segundo dados obtidos pelo Correio por meio da Polícia Civil (PCDF). No ano anterior, houve 9.539 registros. No primeiro mês de 2021, 836 crimes foram identificados.

Em 2019, o número de ocorrências de estelionato foi de 4.564, ou seja, houve crescimento de 108% em 12 meses. Em janeiro deste ano, mais 491 registros. O estudo abrange, ainda, as tentativas de estelionato, que apresentou aumento de 209%, entre 2019 e 2020 (742 contra 2.294, respectivamente).

Outra pesquisa produzida pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban) registrou aumento de 80% nas tentativas de phishing (que se inicia por meio de recebimento de e-mails que carregam vírus ou links e que direcionam o usuário a sites falsos, que, normalmente, possuem remetentes desconhecidos) em meio à crise sanitária.

Na semana passada, o anúncio de agendamento da vacina contra a covid-19 circulou via WhatsApp e deixou os brasilienses eufóricos. O remetente era o “Ministério Público da Saúde”,órgão inexistente. A notícia, no entanto, foi desmentida pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) que explicou que esse tipo de mensagem caracteriza golpe e pediu para que a população ficasse atenta e só confiasse em ações devidamente divulgadas nos canais oficiais das instituições públicas que atuam no enfrentamento à pandemia.

Em entrevista ao Correio, Rodrigo Fogagnolo, promotor e coordenador Núcleo Especial de Combate a Crimes Cibernéticos (Ncyber) do MPDFT, afirma que criminosos têm criado novas formas de agir durante a pandemia para atingir mais vítimas. Uma delas é o golpe pelo WhatsApp. “O criminoso manda mensagem para a pessoa fornecer o PIN, geralmente por interesse de um prêmio futuro. Ao enviar, a pessoa tem o aplicativo clonado, e o estelionatário passa a ter acesso aos contatos e começa a mandar mensagens, pedindo dinheiro emprestado, dizendo que está em crise devido à pandemia”, explica.

O promotor destaca que um dos golpes mais recorrentes continua sendo a clonagem de cartão, apesar de ser uma estratégia antiga. Nesse caso, a vítima é atraída por promoções, valores financeiros e prêmios e, durante a ligação, fornece dados pessoais e informações do cartão de crédito. Em outubro do ano passado, a 4ª Delegacia de Polícia (Guará) prendeu um dos maiores estelionatários do DF. Paulo Alexandre Amaral Raimundo, 48 anos, se passava por funcionário de banco para atrair as pessoas e chegava a ir à casa das vítimas para recolher o cartão de crédito ou de débito, afirmando que o item seria submetido à perícia para apurar uma suposta fraude. Ele era integrante de uma quadrilha que agia em diferentes regiões da capital, como Asas Sul e Norte, Lago Sul e Águas Claras e escolhia idosos como os alvos.

Na avaliação do delegado Giancarlos Zuliani, titular da Delegacia Especial de Repressão aos Crimes Cibernéticos, o fato de a população estar mais em casa, devido à pandemia, facilitou a ação dos estelionatários. “As pessoas estão utilizando mais a internet, seja para comprar, seja usar as redes sociais ou conversar por meio dos aplicativos de mensagens. Consequentemente, elas ficam mais sujeitas a esse tipo de crime. Essa quantidade de exposição diária da internet aumentou o número de golpes cibernéticos”, detalha.

O investigador alerta que a maioria dos golpes são praticados por meio de aplicativos, como o WhatsApp. Nessa plataforma, os criminosos podem usar de três formas distintas para garantir êxito na atividade ilícita. A primeira é clonagem da conta do usuário, em que o estelionatário cria um perfil falso, usa a mesma foto que a vítima utiliza e pede dinheiro emprestado aos contatos próximos da pessoa. Em segundo, aparece o golpe do boleto falso, no qual cria-se sites falsos capazes de emitir boletos. A vítima paga a fatura, mas o dinheiro cai na conta do criminoso. Por último e um dos mais recorrentes está o código por SMS. ”Nesse, a pessoa recebe alguns números no celular, como se fosse para atualizar o aplicativo ou algo do tipo. Ao digitar o código, a vítima autoriza a transferência do WhatsApp para o aparelho do criminoso. A partir daí, ele se passa pela pessoa e pede dinheiro aos conhecidos”, disse o delegado.

Monique Bianchi, 27, quase perdeu o carro, um Fiat Mobi, após anunciar o veículo em um aplicativo de vendas. A advogada anunciou o automóvel por R$ 32 mil, em outubro do ano passado. Ela conta que um criminoso clonou o anúncio e passou a oferecer o carro por um valor bem abaixo do mercado, R$ 25 mil. “Ele encontrou um comprador e, depois, entrou em contato comigo dizendo que mandaria uma pessoa ver o veículo”, lembra Monique.

A jovem acabou descobrindo que o cliente que o criminoso havia atraído era tanto vítima quanto ela. O comprador depositou R$ 25 mil na conta do estelionatário, antes de buscar o carro. “Eu comecei a achar a história muito estranha. Depois que a pessoa pagou, me mandaram um comprovante falso e pediram para eu ir no cartório. Mas desconfiei que se tratava de um golpe”, completa. A advogada registrou boletim de ocorrência na 4ª DP. “Hoje, estou respondendo um processo da pessoa que comprou o carro, mas qual culpa eu tive? Fui vítima do mesmo jeito. Eu ia perder meu carro”, argumenta.

Trabalho técnico

O estelionato está previsto no Art. n° 171 do Código Penal, sendo definido como “obter, para si ou para o outro, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento”. A pena para quem comete esse tipo de crime vai até cinco anos de prisão.

Uma série de mudanças na Lei nº 13.964 causou alterações no Art. n° 171. O estelionato passou de uma ação penal pública incondicionada — promovida por denúncia do Ministério Público — para ser uma ação penal pública condicionada — a qual inicia-se após representação ou requisição perante o MP.

A regra, no entanto, não vale para quem comete esse crime contra a administração pública, crianças, adolescentes, pessoas com deficiência mental ou idosos a partir de 70 anos de idade ou incapaz. “O trabalho para identificar um criminoso como esse é mais técnico e complexo. É preciso descobrir o endereço do IP, verificar a operadora, ver se o dono da conta usou o aparelho e, às vezes, atravessar fronteiras. Muito mais difícil do que pegar o retrato da pessoa e tentar encontrar”, ressalta o promotor Rodrigo Fogagnolo.

O delegado Giancarlos Zuliani considera o trabalho de investigação complexo. Isso porque, segundo ele, a maioria dos estelionatários vivem em outros estados, como São Paulo, Goiânia, Porto Alegre e Ceará. “É uma apuração mais técnica. Quando vamos atrás desses criminosos nesses outros lugares, muitas vezes encontramos um só e uma fraude. Para evitar situações como essas, é importante que a pessoa, quando for fazer algum empréstimo, ou doação, ligar para quem está pedindo para saber, de fato, quem está do outro lado da tela. Outra maneira é solicitar o PIX pelo CPF, pois, aí, você tem a certeza em qual conta o dinheiro vai cair”, orienta.

Golpes mais comuns

Conheça as fraudes mais cometidas por estelionatários


>> Falso funcionário do banco

Ação: o fraudador entra em contato passando por um funcionário do banco ou empresa com a qual a vítima tem um relacionamento ativo. O criminoso informa que há irregularidades na conta ou que dados cadastrados estão incorretos e solicita informações pessoais e financeiros da pessoa. Com os dados, o fraudador realiza transações em nome da vítima.

Como evitar: sempre verifique a origem das ligações e mensagens recebidas contendo solicitações de dados. Bancos nunca ligam para o cliente pedindo senha nem o número do cartão e jamais pedem para realizar uma transferência ou qualquer tipo de pagamento. Ao receber uma ligação suspeita, desligue, e, de outro aparelho, entre em contato com o seu banco para verificar o caso.

>> Phishing (pescaria digital)

Ação: o phishing, ou pescaria digital, é uma fraude eletrônica cometida por engenheiros sociais que visa obter dados pessoais do usuário. A forma mais comum de um ataque de phishing são mensagens e e-mails que induzem o usuário a clicar em links suspeitos. Também, existem páginas na internet que induzem a pessoa a revelar dados pessoais. Os casos mais comuns são e-mails recebidos de supostos bancos com mensagens que afirmam que: a conta do cliente está irregular, o cartão ultrapassou o limite, precisa revalidar seus pontos nos programas de fidelidade, atualizar token ou existe um novo software de segurança do banco que precisa ser instalado imediatamente pelo usuário.

Como evitar: sempre verifique se o endereço da página de internet é o correto. Para garantir, não clique em links: digite o endereço no navegador. Nunca acesse links ou anexos de e-mails suspeitos. Mantenha o sistema operacional e antivírus atualizados. Sempre prefira comprar em sites conhecidos e nunca use computadores públicos para adquirir algo no comércio virtual. Não repasse a outra pessoa nenhum código fornecido por SMS ou imagem de um QR Code enviado para autenticar alguma operação. Na dúvida, entre em contato com seu banco.

>> Falso motoboy

Ação: o golpe começa com uma ligação ao cliente, feita por alguém que se passa por funcionário do banco, em que ela diz que o cartão foi clonado, informando que é preciso bloqueá-lo. O golpista avisa à vítima que para isso ser feito basta cortá-lo ao meio e pedir um novo pelo atendimento eletrônico. O falso funcionário pede que a senha seja digitada no telefone e fala que, por segurança, um motoboy buscará o cartão para uma perícia. O que o cliente não sabe é que, com o cartão cortado ao meio, o chip permanece intacto e é possível realizar transações.

Como evitar: nenhum banco pede o cartão de volta ou envia qualquer pessoa para retirar o cartão na casa dos clientes. Então, desligue o telefone e ligue, de outro aparelho, para o banco, para verificar se realmente houve alguma irregularidade.

>>Falso leilão

Ação: o fraudador envia um link à vítima que simula um leilão. Para que possa ser dado um lance, a pessoa tem que preencher formulários com dados pessoais e financeiros ou depositar um valor na conta do criminoso. Com dados como senha, número do cartão e CPF, o fraudador consegue fazer transações em nome da vítima.

Como evitar: nunca deve enviar dados, senhas e acessos a ninguém. É necessário sempre verificar a origem dos links recebidos, antes de clicar neles. É importante verificar a veracidade do site de leilão e as avaliações de outros usuários.

>> Golpe do WhatsApp

Ação: os golpistas descobrem o número do celular e o nome da vítima. Com essas informações, eles cadastram o WhatsApp da pessoa nos aparelhos deles. Para concluir a operação, é preciso inserir o código de segurança que o aplicativo envia por SMS sempre que a conta é ativada em um novo dispositivo. Os fraudadores enviam uma mensagem pelo WhatsApp fingindo ser do Serviço de Atendimento ao Cliente de um site de vendas ou de uma empresa em que a vítima tem cadastro. Solicitam o código de segurança, que já foi enviado por SMS pelo aplicativo, afirmando se tratar de uma atualização, manutenção ou confirmação de cadastro. Com o código, os bandidos conseguem replicar a conta de WhatsApp em outro celular. A partir daí, eles enviam mensagens para os contatos da pessoa, fazendo-se passar por ela, pedindo dinheiro emprestado.

Como evitar: habilite, no WhatsApp, a opção “Verificação em duas etapas”. Dessa forma, é possível cadastrar uma senha que será solicitada periodicamente pelo aplicativo. Essa senha não deve ser enviada para outras pessoas ou digitadas em links recebidos.

>> Golpe do extravio do cartão

Ação: no trâmite de entrega do cartão até a vítima, os fraudadores furtam a correspondência. Depois, ligam para a vítima se passando por um funcionário do banco informando que houve problemas na entrega do cartão e, para solucionar o problema, solicitam à vítima a senha desse cartão. Com os dados, os criminosos realizam transações.

Como evitar: nunca envie dados, senhas e acessos a ninguém nem preencha formulários na internet com dados pessoais e financeiros sem verificar a origem. Caso o prazo de entrega do cartão se esgote, é preciso informar o gerente sobre o atraso.

>> Golpe do delivery

Ação: a pessoa faz um pedido via aplicativo. O entregador usa uma maquininha com o visor danificado ou que impossibilite a visualização do preço cobrado e coloca um valor acima do que deveria ser. Só depois, a vítima percebe que efetuou um pagamento elevado.

Como evitar: sempre cheque o preço cobrado no visor da maquininha e nunca aceite maquininhas nas quais os valores não estejam visíveis. De preferência, fazer o pagamento via aplicativo e não no momento da entrega.

Fonte: Febraban

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