Feminicídio

Violência de gênero coloca a vida de mulheres em risco

O Distrito Federal registrou oito feminicídios e 23 tentativas em 2021. Karla Pucci, 47 anos, é a vítima mais recente da violência de gênero. Ela foi assassinada por Valdemar Sobreiro Nogueira, 46. O homem foi encontrado morto em um hotel em São Paulo

Darcianne Diogo
'Jéssica Moura
postado em 25/05/2021 06:00
 (crédito: Pacífico/CB/D.A Press)
(crédito: Pacífico/CB/D.A Press)

Oito mulheres foram assassinadas, em 2021, em razão do gênero no Distrito Federal. De janeiro a abril de 2020, houve seis ocorrências. Quanto às tentativas de feminicídio, a Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF) registrou 23 casos, nos quatro primeiros meses deste ano, enquanto em 2020, foram 16 ocorrências, no mesmo período. Ontem, o governador Ibaneis Rocha (MDB) assinou um acordo com a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, para a criação do aplicativo Proteja-se, uma medida que pretende agilizar a solução das denúncias de violação de direitos humanos contra grupos vulneráveis que chegam à pasta. O DF é a primeira unidade da federação a receber o app.

No último domingo, a capital do país se chocou com mais um episódio de violência contra a mulher, que resultou em feminicídio. Karla Pucci, 47 anos, foi brutalmente assassinada com uma pedrada pelo namorado, Valdemar Sobreiro Nogueira, 46, dentro da funerária da qual era dona, no Paranoá. O crime aconteceu no sábado, mas o corpo da empresária foi encontrado no dia seguinte, quando o filho estranhou a ausência da mãe e abriu a loja para procurá-la, já que era dia de plantão. Imagens do circuito interno de segurança registraram os últimos momentos de Karla.

Fuga

A filmagem mostra o homem e a mulher no interior da funerária. Minutos depois, Valdemar sai sem camisa, veste um casaco e foge em um Honda Civic. Radares da rodovia captaram o veículo do homem em Uberaba (MG). Na manhã de ontem, a Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMSP) recebeu um chamado para atender uma ocorrência de localização de cadáver em um quarto de hotel, no bairro Santa Ifigênia, na capital paulista. Segundo as investigações, o advogado de Valdemar teria ido visitá-lo no prédio, quando se deparou com o corpo do homem suspenso por um cobertor. “Ao que tudo indica, o hotel pertencia a parentes do acusado”, afirmou o delegado-chefe da 6ª Delegacia de Polícia (Paranoá), Ricardo Viana. Corporação trabalha com a hipótese de suicídio.


Abalada, a família da empresária preferiu não conversar com a imprensa. Nas redes sociais, a filha de Karla postou uma homenagem: “Mãe, eu te falei, mãe. Por que você não me escutou? Eu te amo tanto. Quem vai brigar comigo? Quem vai me chamar de encrenca? O pai, que dor, pai. Mãenzinha”, lamentou a jovem. O corpo de Karla foi velado ontem, na Primeira Igreja Batista do Paranoá e será sepultado, hoje, em Uruaçu (GO) — cerca de 191km de Brasília.
Combate

Em entrevista ao Correio, Thiago Pierobom, promotor do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e pesquisador sobre violência contra a mulher, fala sobre o aumento no número de casos em decorrência da pandemia do novo coronavírus.


A cada hora, ao menos, duas mulheres são vítimas de violência doméstica no DF. Entre janeiro e março deste ano, a SSP-DF registrou 3.777 ocorrências desse tipo. Enquanto no mesmo período de 2020, o número foi de 4.158. Apesar da redução de quase 10%, o promotor observa que é preciso se atentar ao aumento das autuações em flagrante. “O registro feito em delegacias, por exemplo, realmente diminuiu, e podemos atribuir isso à pandemia. Essa estatística parece sinalizar que a violência está diminuindo, mas muitas das vítimas podem estar com dificuldades em sair de casa para registrar boletim. A pandemia gerou isolamento, problemas financeiros, e tudo isso cria um conjunto de oportunidades e diminui a probabilidade da mulher em pedir socorro”, frisou.


Ontem, o chefe do Executivo local assinou um acordo para o aplicativo Proteja-se. A ferramenta integra em um mesmo espaço o Disque 100 e o Ligue 180, e também recebe queixas de agressão à comunidade LGBT e pessoas com deficiência, por exemplo. Com isso, em vez de esperar a comunicação, por e-mail, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (da Família e dos Direitos Humanos ), que era recepcionada pela Polícia Civil e, depois, encaminhada aos órgãos para investigação, agora, o governo poderá acessar diretamente o banco de dados das denúncias para dar seguimento ao atendimento. O programa funciona 24h, todos os dias da semana, e as denúncias, feitas por meio de mensagem, inclusive anônimas, podem ser registradas a qualquer momento.


O DF recebe cerca de 20 denúncias diárias de violações de direitos humanos. Em 2021, até 19 de maio, o da Família e dos Direitos Humanos recebeu 2.735 denúncias de 10.234 violações de Direitos Humanos no DF. Durante o evento na manhã de ontem, a secretária de Justiça e Cidadania, Marcela Passamani, reconheceu que os casos aumentaram durante a pandemia de covid-19. Uma das medidas judiciais que tentam coibir esses crimes é a concessão de medidas protetivas, quando uma determinação judicial impede que os agressores se aproximem das vítimas. Nesses casos, o acusado pode ser monitorado por tornozeleira eletrônica. Segundo balanço do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), neste ano, houve 2.258 pedidos da medida, até março. Dessas, 1.838 foram concedidas total ou parcialmente.

Denúncia

Para a secretária da Mulher do DF, Éricka Filippelli, ações como o aplicativo Proteja-se ajudam nesse monitoramento, mas não é possível controlar, totalmente, a violação das medidas protetivas de afastamento. “A tornozeleira em si, em tese, proíbe que ele alcance o espaço da casa e do trabalho dela (a vítima). São locais fixos. O vácuo, a gente conseguiu cobrir com o lançamento dessa política do dispositivo (de segurança) com a tornozeleira. Mais do que isso, a gente não tem, é o máximo que a gente pode chegar no índice de proteção e controle. Eu controlo quem já denunciou, mas preciso criar canais para que denunciem”, destacou.


O secretário de Segurança Pública, Júlio Danilo, explicou que cerca de 100 agressores usam tornozeleira eletrônica no DF, por conta de agressão a mulheres. Contudo, 11 estão incluídos no Dispositivo de Monitoramento de Pessoas Protegidas (DMPP), que rastreia as vítimas e emite um alerta se o agressor estiver por perto. “A gente começou como um projeto-piloto, com número reduzido de tornozeleiras e protegidas, a intenção é que a gente abarque todos os casos de forma progressiva até o meio do ano”, finalizou.

Peça Ajuda

» Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência; Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. Telefone: 180 (disque-denúncia)
» Centro de Atendimento à Mulher (Ceam): De segunda a sexta-feira, das 8h às 18h. Locais: 102 Sul (Estação do Metrô), Ceilândia, Planaltina
» Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam): Entrequadra 204/205 Sul, Asa Sul. Telefone: (61) 3207-6172
» Ministério dos Direitos Humanos. Telefone: 100 (Disque 100)
» Programa de Prevenção à Violência Doméstica (Provid) da Polícia Militar. Telefones: (61) 3910-1349 e 3910-1350

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