DISCRIMINAÇÃO

Caso Maria Luiza: após 20 anos, processo ainda tramita na Justiça

Considerada a primeira transexual das Forças Armadas, Maria Luiza Silva foi transferida compulsoriamente para a reserva depois de fazer a cirurgia de redesignação sexual e, agora, briga na Justiça para ter direito à aposentadoria do cargo de subtenente

Renata Nagashima
postado em 22/02/2022 22:00 / atualizado em 22/02/2022 22:08
Maria Luiza da Silva aguarda nova decisão sobre recurso apresentado pela União
 -  (crédito: Diego Bresani/Divulgação)
Maria Luiza da Silva aguarda nova decisão sobre recurso apresentado pela União - (crédito: Diego Bresani/Divulgação)

Depois de uma longa batalha que chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), Maria Luiza da Silva, 61 anos, considerada a primeira transexual das Forças Armadas, corre risco de perder esse reconhecimento. Isso porque, mais uma vez, a União recorreu da decisão que permitiu à militar se aposentar como subtenente. Há 20 anos, ela luta por um direito que lhe foi tomado: o de continuar a servir na Força Aérea Brasileira (FAB). No entanto, em 2000, acabou transferida compulsoriamente para a reserva, logo após passar pelo processo de redesignação sexual.

"Eu decidi libertar a Maria Luiza de dentro de mim, e a FAB não aceitou isso. Fui aposentada por discriminação. Não queriam deixar uma pessoa trans na ativa", relatou ao Correio. Afastada aos 39 anos, ela não aceitou a decisão e entrou na Justiça. "Sempre fui militar padrão e exemplar, no topo do ranking da graduação, de desempenho e comportamento. Eu queria voltar, mas, quando a decisão me autorizando a voltar para a ativa saiu, passei para a reforma novamente, porque tinha atingido a idade-limite. Isso me abalou muito, porque tenho muito amor pela profissão e pela aeronáutica", lamentou.

A última atualização do caso no STJ ocorreu em dezembro, quando a Corte ratificou uma decisão de abril em que a Segunda Turma, por unanimidade, confirmou a decisão que confirmou a entrada de Maria Luiza na reserva como subtenente, último posto assumido pela militar no quadro de praças.

Decisões

À época, o colegiado negou recurso da União, que tentava derrubar a decisão do relator, Herman Benjamin. Em junho de 2020, o ministro considerou legítimo que, na reserva após fazer a cirurgia de redesignação sexual, a militar recebesse vencimentos correspondentes à aposentadoria integral do cargo de subtenente. Para o magistrado, a FAB tirou de Maria Luiza o direito de progredir na carreira devido a um ato administrativo "ilegal, nulo e baseado em irrefutável discriminação".

Os demais integrantes da turma tiveram o mesmo entendimento e acrescentaram que a ex-militar tinha direito de permanecer no imóvel funcional da Força Aérea até que obtivesse os valores integrais dos depósitos da aposentadoria como subtenente. Além disso, o colegiado determinou que a União reembolsasse Maria Luiza por uma multa imposta em virtude de ocupação considerada irregular do imóvel.

"Agora, o processo está no STJ e aguarda definição do cargo pelo qual ela será aposentada. A Corte decidiu, mas a União entrou com novo recurso, que não foi julgado ainda. Só vamos conseguir colocar um fim nisso quando a União parar de recorrer", afirmou Max Telesca, advogado da militar.

Diante de um processo que se arrasta há décadas, Maria Luiza anseia pelo término da morosa disputa judicial. "Isso vai até quando? Eu não posso mais esperar. Vou fazer 62 anos. Falta tão pouco para colocar um ponto final nisso, e é necessário colocar. A transfobia tem de acabar no nosso mundo", completou a militar.

A reportagem aguarda posicionamento da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre o caso.

 

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