Mobilidade urbana

Reajuste das passagens de ônibus de Brasília para o Entorno chega a 26%

Portarias publicadas no Diário Oficial do DF estipulam reajustes de até 26% no transporte para cidades como Planaltina de Goiás, Luziânia, Cidade Ocidental, Valparaíso e Santo Antônio do Descoberto

Ana Maria Pol
Mila Ferreira
postado em 03/12/2022 06:00
 (crédito:  Carlos Vieira/CB                           )
(crédito: Carlos Vieira/CB )

O usuário de transporte público que se locomove diariamente do Entorno para Brasília deve se preparar para um aumento nos preços das passagens. Duas portarias publicadas no Diário Oficial do Distrito Federal, ontem, estabelecem reajuste de 25,12% nas tarifas das linhas operadas pelas empresas que atuam com autorizações especiais e de 26,45% nos ônibus da Taguatur, que possui contrato de permissão com regras específicas de reajuste. O serviço de transporte semiurbano abrange mais de 400 linhas de ônibus que fazem a ligação entre o Distrito Federal e as cidades do Entorno. O serviço responde pelo transporte diário de cerca de 175 mil passageiros.

A Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob) informou, em nota, que os estudos técnicos desenvolvidos pela pasta concluíram que os novos valores das passagens são necessários para evitar o colapso do transporte do Entorno. "O sistema é bancado somente pelos valores pagos pelos usuários, e as tarifas estão há quase dois anos sem reajustes. Nesse período, o custo operacional aumentou (as tarifas), conforme planilhas de despesas das operadoras (diesel, pneus, peças, manutenção, com pessoal, etc). Desde dezembro de 2020, o preço do combustível aumentou mais de 85%, por exemplo", disse o documento enviado pela Semob ao Correio.

Alguns dos novos valores de passagens para o Plano Piloto serão: de Planaltina de Goiás R$ 9,80; Luziânia R$ 9,25; Cidade Ocidental R$ 7,50; Valparaíso R$ 6,75, Santo Antônio do Descoberto R$ 9,15. Os preços para todas as localidades podem ser consultados na página da Semob na internet.

O economista e secretário executivo do Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Púbico de Qualidade para Todos (MDT), Wesley Ferro Nogueira, acredita que o modelo de transporte faz com que o ônus vá todo para o usuário. "É uma conta amarga para que o sistema continue em operação. Mostra a necessidade de o modelo ser repensado. O usuário não pode assumir essa conta sozinho para bancar os sistemas em operação. O modelo implantado no Entorno é muito perverso. A sociedade toda tem que bancar o custo", analisou Wesley. "A gente acha que quando o custo do transporte aumentar, ele vai procurar outra alternativa. Então, compra um carro barato e vai fazer outras viagens para compartilhar custo. Ou compra uma moto, ou começa a fazer o trecho a pé ou de bicicleta. É um modelo insustentável", finalizou o economista.

A auxiliar de serviços gerais Sônia da Silva Sousa, 38 anos, é moradora da Cidade Ocidental e trabalha no Plano Piloto. Todos os dias, pega dois ônibus, com passagens de R$ 6, cada. No dia, a auxiliar gasta R$ 12, o que equivale a uma média de R$ 360 no mês. Com o reajuste, a passagem deve aumentar para R$ 7,50, valor que causa indignação na passageira. "É um absurdo, né? A minha sorte é que a empresa paga a nossa passagem, então tenho um amparo. Mas nem todos têm essa ajuda. As pessoas não conseguem sustentar esse tipo de situação", lamenta. "No final do mês, esse valor pesa no bolso. E eles (empresas de transporte) nem oferecem condições melhores para gente, os ônibus estão sempre em condições péssimas", acrescenta.

A pensionista Marlene da Silva Gomes, 64, também moradora da Cidade Ocidental, conta que costuma pegar ônibus para o Plano Piloto apenas nos dias em que tem consultas médicas. Apesar de não ter um gasto fixo no mês com passagens, Marlene compartilha da indignação de Sônia. "Como usuária, é um absurdo ter que pagar mais, a passagem é muito cara. O ônibus anda sempre cheio, no meio de semana, em horários normais, é muito puxado. Tem vezes que se gasta quase quatro horas de translado", pontua. "Tinha que ter mais ônibus, principalmente para gente, que paga mais caro. Falta investimento", completa.

Marco Aurélio Guimarães, representante do Sindicato dos Trabalhadores Domésticos do DF, acredita que o aumento afetará diretamente na vida dos moradores do Entorno. "É um absurdo esse aumento. Isso só ocasionará desemprego para os trabalhadores do Entorno, evidentemente", afirmou.

 


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Palavra de especialista

O GDF assumiu a responsabilidade pelo transporte semiurbano interestadual. O que acontece no transporte do DF é um sistema diferente, de separação entre as tarifas técnica e usuária, e uma não sofre pressão quando a outra é reajustada.

Isso faz diferença quando tem variação no preço do diesel, no valor da mão de obra dos trabalhadores ou de qualquer outro custo. Uma vez que mexe só na tarifa técnica e não na usuária, quando houver algum tipo de deficit, o GDF insere recursos, que são os subsídios, para não afetar a tarifa usuária.

No Entorno, esse sistema não é aplicado. A remuneração do sistema é baseada no modelo antigo, que é aplicado em quase todas as cidades no Brasil, onde a empresa vai ser remunerada com o que é arrecadado na catraca. Ou seja, a única receita que a empresa tem é o pagamento da passagem pelo usuário. Então ela tira da receita tarifária o pagamento dos custos, investimentos do sistema. Tudo isso, ao contrário do GDF, depende dessa receita tarifária.

Então o que acontece para compensar o aumento dos custos? Um exemplo: o diesel sofreu muita variação de preço mas toda vez que há uma pressão sobre os custos, o contrato do Entorno só é revisado se houver aumento da tarifa do usuário. E não tem outra forma porque o contrato de operação é baseado nesse modelo.

Existe uma pressão que é feita há bastante tempo para que a tarifa no entorno fosse reajustada, e estava sendo segurada por conta desse modelo, de aumento na tarifa do usuário, para fazer a recomposição. Através dessas novas portarias, o GDF autoriza um reajuste na tarifa pública.

 

Wesley Ferro Nogueira, economista e secretário executivo do Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Púbico de Qualidade para Todos (MDT)

 

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