Tragédia

Famílias de criança e adolescentes mortos por descarga elétrica pedem justiça

Corpos das vítimas que morreram eletrocutadas, em Ceilândia, foram enterrados na tarde desse domingo (11/12), em Planaltina. Irmão de um dos adolescentes atingidos disse que empresa responsável pelo serviço de energia elétrica será processada

Mila Ferreira
postado em 12/12/2022 05:52 / atualizado em 12/12/2022 11:48
 Sepultamento da criança e dos dois adolescentes que morreram eletrocutadas na sexta-feira (9/12) -  (crédito:   Correio Braziliense)
Sepultamento da criança e dos dois adolescentes que morreram eletrocutadas na sexta-feira (9/12) - (crédito: Correio Braziliense)

Emocionados e pedindo por justiça, os familiares de Karina Madureira da Silva, 17 anos, Kelvin Michel Madureira de Andrade, 14, e Sophia Emanuelly Batista Madureira, 5, sepultaram os corpos das vítimas, que morreram eletrocutadas ao serem atingidas por um fio de alta tensão, em Ceilândia, na sexta-feira (9/12). O enterro aconteceu na tarde desse domingo (11/12), no Cemitério Campo da Esperança, em Planaltina. Moradores da QNP 24, onde o acidente ocorreu, afirmam que haviam pedido a substituição do fio há seis meses, mas a empresa responsável só fez um reparo e, mesmo depois, o defeito persistiu. Na noite desse domingo, a Neoenergia divulgou uma nota, na qual afirma que o local passou por manutenção em agosto e que todos os problemas foram corrigidos.

A tia avó de Karina, Marlene Santos de Barros, 60, disse que a família está abalada e revoltada com a situação que levou os dois adolescentes e a criança a óbito. "Karina morreu com 17 anos, era muito nova. Caçula de quatro filhos, ela dava conselhos à mãe. Descer de um ônibus, dar poucos passos e morrer eletrocutado é uma tragédia", lamentou Marlene, com os olhos marejados. A aposentada contou ainda que Karina, Kelvin e Sophia eram muito unidos e faziam tudo juntos. 

"A gente quer justiça. Vamos processar a empresa", afirmou o auxiliar de serviços gerais Rafael Madureira, 42, um dos oito irmãos de Kelvin. "Ele sonhava em ser policial. Dos filhos da minha mãe, era o único que estudava", acrescentou Rafael, ao falar sobre os planos que o adolescente tinha para o futuro. Segundo ele, a mãe ficou sabendo do ocorrido ao ligar para o número do jovem e ser atendida por um socorrista do Corpo de Bombeiros (CBMDF). "Meu irmão estava demorando para chegar em casa, por isso, minha mãe ficou preocupada e telefonou", relatou Rafael. "Kelvin era um menino extrovertido, que gostava de ir à igreja", disse Michely Madureira, 30, também irmã do adolescente e cuidadora de crianças. 

Homenagem

O Centro de Ensino Fundamental 14, de Ceilândia, onde Kelvin estudava, manifestou consternação, em nota divulgada nas redes sociais: "O CEF14, por meio da direção, professores, demais servidores e estudantes, lamenta esta perda e deseja que os familiares, amigos e colegas sejam confortados neste momento. Sem dúvida, o Kelvin deixará uma grande saudade em nossos corações". Policiais civis da 16ª Delegacia de Polícia, de Planaltina, foram ao velório como forma de honrar o jovem, que queria fazer parte da corporação.

A Neoenergia pagou as despesas funerárias e disse que colocou à disposição da família profissionais de assistência social e psicológica, que, segundo a empresa, estariam prestando suporte aos parentes em todas as etapas do luto. Familiares confirmaram que a companhia arcou com os custos dos enterros, mas que não estão recebendo qualquer outro tipo de assistência.

Investigação

Na sexta-feira, Karina e Sophia foram juntas para Ceilândia, onde Kelvin morava com a mãe. O jovem tinha ido ao terminal para buscá-las e, quando os três seguiam em direção à casa dele, foram atingidos pela descarga elétrica e não resistiram. Kelvin era tio de Karina, moradora de Planaltina, e primo de Sophia, que vivia em Céu Azul (GO). 

Alex Pereira de Sousa, 41, que passava de carro na quadra, parou para tentar ajudar, mas também acabou atingido pela descarga elétrica. Segundo a Polícia Civil (PCDF), ele foi levado para o hospital e está fora de perigo.

A 23ª DP, do P Sul, investiga os fatos. De acordo com o delegado Luiz Gustavo Ferreira, a corporação aguarda os laudos oficiais da Seção de Engenharia Legal e Meio Ambiente (Selma), um setor especializado da PCDF que analisa o caso. "Ainda não temos resultados de perícia, que costumam demorar, no mínimo, 30 dias. Em relação aos familiares, durante a semana vamos agendar as oitivas. Eles estão em um momento de luto, enterrando as vítimas. Logo teremos as versões deles", antecipou.

Como parte da apuração, o delegado esteve, na tarde de sábado (10/12), na QNP 24. Ele relembrou que o local "virou uma praça de guerra" e que foi necessário chamar a Divisão de Operações Especiais (DOE) da Polícia Civil para isolar a área, porque os moradores ficaram muito revoltados e arremessaram pedras nos bombeiros que atendiam a ocorrência. 

Perigo recorrente

Moradores da QNP 24 afirmam que, há seis meses, procuraram a Neoenergia, empresa responsável pelo serviço de energia elétrica no DF, para pedir a troca do fio de alta tensão que despencou. Os relatos são de que a companhia foi posteriormente ao local, mas, em vez de substitui-lo, fizeram um "remendo" e a fiação continuava "fazendo barulho e soltando faíscas". Na manhã seguinte às mortes, a empresa fez a troca. Os moradores estavam sem energia elétrica desde a véspera, em decorrência do acidente.

Em nota enviada à imprensa, a Neoenergia rebateu as denúncias. De acordo com a companhia, neste ano, nas proximidades da região, houve "somente três chamados para manutenção em componentes da rede de média tensão". Todos, segundo a empresa, foram atendidos conforme os critérios de segurança, nos próprios dias em que foram feitos.

Conforme a nota, a rede elétrica da região foi inspecionada em agosto e que todos os pontos identificados como de risco foram corrigidos. A Neoenergia afirmou que está apurando as causas da ocorrência e que, até o momento, as  prováveis causas do acidente são "quedas de raio, ventos fortes, grande volume de chuvas e outros fatores externos".

Vidas interrompidas

Kelvin Michel Madureira de Andrade, 14 anos

Kelvin Michel Madureira de Andrade, 14 anos, vítima de descarga elétrica.
Kelvin Michel Madureira de Andrade, 14 anos, vítima de descarga elétrica. (foto: Fotos: reprodução/redes sociais.)

Um menino tranquilo e estudioso. Frequentava a Comunidade Cristã Ministério da Fé e, recentemente, tinha começado a ir à igreja Sara Nossa Terra. Dos nove irmãos, era o único que estudava e tinha acabado de concluir o 9º ano. A formatura seria no sábado, um dia depois da morte. Para a família, amigos e colegas do CEF 24, de Ceilândia, Kelvin era um jovem exemplar e não gostava de sair para festas. Seu grande sonho era ser delegado da Polícia Civil.

Sophia Emanuelly Batista Madureira, 5 anos

Sophia Emanuelly Batista Madureira
Sophia Emanuelly Batista Madureira (foto: Reprodução: redes sociais.)

Única filha da atendente Ana Cristina Batista Carvalho, de 26 anos, Sophia era prima de Kelvin e sobrinha de Karina. A menina é descrita por familiares como uma criança carinhosa, feliz e muito ligada emocionalmente a Kelvin e Karina.

Karina Madureira da Silva, 17 anos

Karina Madureira da Silva, 17 anos, vítima de descarga elétrica.
Karina Madureira da Silva, 17 anos, vítima de descarga elétrica. (foto: Reprodução: redes sociais.)

No Instagram, Karina se definia como "iluminada, abençoada e protegida". Caçula de quatro irmãos, Karina tinha acabado de concluir o ensino médio. A formatura aconteceria ainda este mês. A família a via como uma jovem extrovertida, que gostava de jogar bola e baralho e Uno.

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