Jornal Correio Braziliense

Homicídio

Regiane Silva: As 12 horas nas garras de um monstro

Por 12 horas, Regiane da Silva ficou sob o poder de um criminoso, condenado e que deveria estar preso, mas fugiu após o saidão. A jovem foi estuprada, esfaqueada e enterrada depois de passar momentos de terror

Doze horas de terror e um final trágico. Aos 21 anos, Regiane da Silva teve a juventude e os sonhos interrompidos ao ser vítima de um crime bárbaro. A jovem foi sequestrada, abusada sexualmente, assassinada e enterrada em Planaltina por um criminoso conhecido da polícia e da Justiça, que manteve a garota como refém durante toda a madrugada antes de matá-la a sangue frio. Sérgio Alves, 42, estava foragido do sistema penitenciário desde o começo de abril, ao não retornar de um "saidão", e acumulava condenações pelos crimes de roubo e estupro. Ele foi capturado pelos policiais da Guarda Civil Municipal de Planaltina de Goiás e deve ser transferido ao Complexo Penitenciário da Papuda nos próximos dias.

Em coletiva de imprensa, promovida ontem, os delegados à frente do caso, Thiago Oliveira e Marcelo Gaia, da 16ª Delegacia de Polícia (Planaltina), deram os detalhes do crime que comoveu todo o DF. Os policiais começaram a investigar o caso na terça-feira passada, quando tomaram ciência do desaparecimento da jovem. Regiane estudava no Centro de Ensino Médio 1 (CEM 1), o Centrão, em Planaltina. Ela sumiu ao sair da escola, na noite de 17 de abril. Naquele dia em específico, como a estudante não iria ter aula no último horário, foi liberada mais cedo, às 20h30.

De bicicleta, a jovem seguiu por um caminho que era acostumada a fazer com frequência e passou por uma ponte que dá acesso a um córrego, no Bairro Nossa Senhora de Fátima. Foi neste momento que uma câmera de segurança flagrou Sérgio abordando a garota. As imagens ainda não foram divulgadas pela polícia, mas a cena foi detalhada durante a coletiva. "Dá para perceber que ele (Sérgio) a abordou aleatoriamente. De imediato, o autor empurra a vítima com a bicicleta para dentro do matagal", afirmou o delegado Marcelo.

Armado com uma faca, Sérgio ameaçava a jovem a todo instante. Pelos objetos da estudante encontrados no matagal — como a pulseira, o tufo de cabelo e a calcinha —, a polícia acredita que houve luta corporal entre os dois. "Ele a abordou na intenção de estuprá-la. Segundo ele, a vítima tentou fugir, momento em que ele cortou pedaço do cabelo dela com a faca", disse o investigador.

Doze horas

Foram doze horas em poder do assassino. Regiane, depois de ser abusada, foi obrigada a acompanhar o homem até uma outra região de mata, próximo ao Rio São Bartolomeu, a cerca de 6km de distância de onde eles estavam. Para a estudante, Sérgio disse que, caso ela o obedecesse, iria liberá-la. "Outras imagens que tivemos acesso mostram ela caminhando ao lado dele. A vítima acompanhou o autor durante toda a madrugada acreditando que seria solta posteriormente. Um outro vídeo captou a jovem sentada no varão da bicicleta", frisou o delegado Thiago.

No segundo local, para onde Sérgio levou Regiane, o homem a estuprou novamente. As investigações apontaram que o criminoso conhecia bem a região e sabia todos os pontos das áreas de mata e vales e onde iria desovar o corpo. Ao longo de 10 dias, equipes do Corpo de Bombeiros (CBMDF) fizeram buscas nas regiões próximas com o auxílio de cães farejadores e drones, mas sem sucesso.

No final da manhã de ontem, Sérgio confessou à polícia onde tinha enterrado Regiane. No hospital, ele desenhou um mapa e indicou o local do cadáver. Os policiais civis junto aos bombeiros foram ao ponto e encontraram o corpo de Regiane seminu, parcialmente enterrado e envolto em um tapete. Ao lado, estava a mochila que ela usava na escola.

Depois do assassinato, Sérgio pegou a bicicleta da jovem e pedalou até uma boca de fumo de Planaltina-DF, onde vendeu o objeto por R$ 30 para comprar pedras de crack. À polícia, ele contou que caminhou, durante a madrugada do dia 18, até Planaltina de Goiás e ficou escondido em uma casa abandonada. Ao tomar conhecimento de que os policiais estavam no encalço dele, tentou fugir para o distrito de São Gabriel.

Prisão

Em fuga, Sérgio cometeu um novo crime. Ele abordou um homem dentro de um carro e roubou a carteira e o celular. A vítima acionou a Guarda Civil Municipal de Planaltina (GO) de imediato e denunciou o ocorrido. Os policiais da guarda intensificaram as buscas pelo suspeito e o encontraram em um povoado do distrito.

O comandante-geral da Guarda, Rosinaldo Rodrigues, contou que o criminoso, ao perceber a chegada dos policiais, tentou se matar com uma facada no pescoço. "Ele dizia que preferia ceifar a vida a ter que voltar para o sistema penitenciário. Só tivemos ciência de que tratava-se de Sérgio quando ele foi socorrido e levado ao hospital", detalhou.

Sérgio chegou a dizer que só falaria sobre o caso da Regiane em juízo, mas confessou o homicídio na delegacia. Ele vai responder por sequestro, roubo, estupro, homicídio e ocultação de cadáver. Caso condenado, as penas podem ultrapassar 80 anos de prisão.

Nesse primeiro momento da investigação, a polícia acredita que o homicida tenha agido sozinho, mas não descarta nenhuma outra possibilidade. "Até o momento, não temos informações que indiquem envolvimento de terceiros. Seguimos com as apurações para confirmar todos os pontos do depoimento prestado pelo autor", frisou o delegado Thiago.

Revolta

Familiares da estudante choraram quando o corpo da jovem foi recolhido pelos bombeiros. A indignação tomou conta dos parentes. A prima de terceiro grau da vítima Brenda da Silva Souza, 24, se mostrou indignada com mais uma mulher assassinada no DF.

"Quando uma mulher sofre, todas sofrem juntas", As mulheres não estão tendo um dia de paz, porque isso é noticiado quase todos dias, e a Regiane foi mais uma vítima, infelizmente. Espero justiça", desabafa a
técnica de enfermagem.

Brenda questionou a Justiça pelo fato de Sérgio ser um preso com extensa ficha criminal e foragido do saidão. "O cara saiu para fazer outras vítimas e a gente se sente mal por ser mulher e porque nada é feito para combater isso", disse.

Regiane morava em Angico dos Dias (BA) e veio para Brasília há cerca de seis meses para trabalhar e estudar. O sonho era ser policial, segundo os familiares. Até o fechamento desta edição, o dia do sepultamento da jovem não havia sido divulgado.

Ontem, alunos do CEM 1 de Planaltina organizaram uma passeata em homenagem à Regiane. No texto, a comunidade escolar lamenta a morte de Regiane e espera que Deus consiga consolar a família e os amigos dela. "Os colegas de sala estão muito chocados. Era uma menina com muitos sonhos a realizar: ajudar sua mãe era uma meta", diz um trecho da mensagem, ao se referir ao apoio financeiro que a jovem tentava prestar à mãe.

A escola, em luto pela perda de uma aluna, convida alunos de outros colégios, principalmente do período noturno, a refletirem em relação à segurança dos alunos e sobre o transporte público que dizem ser deficitário. "No caso da Regiane, a forçava vir e voltar sozinha por um caminho perigoso. E quantos dos nossos alunos, alunas, em especial, correm esse risco para virem para escola? Todos estão convidados a se unir a nós. Regiane: PRESENTE!", finaliza o texto.

À noite, período no qual a aluna cursava Educação de Jovens e Adultos (EJA) no Centrão, são mais de 300 alunos e alunas matriculados. Juntando todos os turnos são 2,3 mil estudantes na unidade de ensino.

Emocionada com o caso, a diretora da instituição, Nedma Guimarães, conta com carinho que Regiane era uma aluna comunicativa e gostava de se sentar no fundo da sala com as amigas. "Ela não era uma aluna que dava problemas. Pelo contrário, era comunicativa e falava com todo mundo", afirmou.

 

Marcelo Ferreira/CB/D.A Press - Delegados à frente da investigação deram entrevista
Redes sociais - A sonhadora estudante estava desaparecida desde 17 de abril
Material cedido ao Correio - Sérgio Alves foi preso no distrito de São Gabriel (GO)
PCDF e arquivo pessoal - Sérgio Alves da Silva e Regiane da Silva

Frase

"A vítima acompanhou o autor durante toda a madrugada acreditando que seria solta posteriormente", delegado Thiago Oliveira, da 16ª DP.