MÚSICA

Crônica da Cidade: Rita Lee para sempre

"Rita se foi com a mesma idade (ou quase a mesma) de Santa Rita, pertinho da data em que gostava de celebrar seu aniversário. Para a legião de fãs, todo o tempo do mundo seria insuficiente, mas ela deixou o brilho eterno de sua estrela por aqui"

Mariana Niederauer
postado em 22/05/2023 17:18 / atualizado em 22/05/2023 17:14
 (crédito: Reprodução/@ritalee_oficial)
(crédito: Reprodução/@ritalee_oficial)

Rita Lee imprimiu seu jeito único de ser até mesmo no aniversário. Como nasceu na virada do ano, escolheu outra data para completar novos ciclos em volta da terra: hoje, 22 de maio, dia da xará Santa Rita de Cássia. É também nesta segunda-feira que estreia a mais nova versão da autobiografia, em que ela compartilha o tratamento contra o câncer e novas reflexões sobre a vida e, consequentemente, sobre o envelhecimento.

O jeito fluido e “descolado” de escrever me cativou desde a primeira obra, lançada em 2016, também pela Globo Livros. Há uma espontaneidade e uma sinceridade nua e crua ali que transparecem igualmente em suas canções. Mesmo mantendo a discrição dos trechos da vida que ela preferia guardar na privacidade, Rita Lee Jones foi fiel aos seus sentimentos e aos seus amores. O livro é, no fim e também, uma declaração de amor a Roberto de Carvalho e aos filhos.

Fiz os cálculos e percebi que a crônica desta semana cairia justo no dia de Rita. Por isso, esperei para escrever apenas hoje sobre a sua partida. No dia em ela nos deixou, busquei em casa a autobiografia, anotei alguns trechos e emprestei a uma colega que ainda não havia lido e decidiu antecipar os planos, já que tinha reservado a nova versão para tentar recebê-la na estreia.

A devoção da artista à Santa das Causas Impossíveis até hoje me surpreende um pouco. Mas essa ligação com o transcendental fica clara em algumas canções. Ela chegou até mesmo a homenagear a própria Santa Rita, à la Lee, em Santa Rita de Sampa: “Bendita Rita da Lua cheia / Rogai por mim nesse começo de fim / O espinho nosso de cada testa / Milagrosa seja vossa festa / Sois o lazer de quem trampa / Bendita Santa Rita de Sampa / Santa Rita de Sampa / Santa Rita”.

As preces para Sampa poderiam se estender a Brasília, onde Rita viveu alguns momentos marcantes — mesmo aqueles que foram sem nunca terem sido. Durante a turnê de Entradas e Bandeiras, em 1976, teve apresentação cancelada pela ditadura militar. O show estava marcado para ocorrer no Ginásio de Esportes do Colégio Marista da 609 Sul, espaço onde, um ano antes, ele apresentou Fruto Proibido. No extinto Pelezão, em 1983, contestou a ditadura e bradou: “Para a censura, eu digo: é proibido proibir”.

Rita se foi com a mesma idade (ou quase a mesma) de Santa Rita, pertinho da data em que gostava de celebrar seu aniversário. Para a legião de fãs, todo o tempo do mundo seria insuficiente, mas ela deixou o brilho eterno de sua estrela por aqui. “Estranho ter sido o que fui sendo eu o que sou hoje. Parece que sempre tive a idade que tenho agora. Aos setenta tem-se a impressão de que a vida passou rápido demais, escrevendo a própria biografia, percebe-se que foi longa pra caramba. Vivi intensamente infância, juventude e maturidade, a fase velhice é novidade para mim, apesar de, claro, percebê-la mais familiar do que as anteriores.”

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