Violência contra a mulher

20º feminicídio no primeiro semestre: covardia matou mais uma mulher

Em um intervalo de horas, Distrito Federal registra nova vítima de feminicídio. Nesta sexta-feira (30/6), a enfermeira do Hospital de Base Patrícia Pereira, 41, foi morta pelo marido, em casa e na presença de dois filhos. São 4 crimes do gênero nesta semana

Pablo Giovanni
Mariana Saraiva
postado em 01/07/2023 05:00 / atualizado em 03/07/2023 20:20
 (crédito:  Reprodução/Redes Sociais)
(crédito: Reprodução/Redes Sociais)

Um clima de terror e tensão tem tomado conta das mulheres do Distrito Federal. Nesta sexta-feira (30/6), um homem, identificado como Bruno Gomes Mares, assassinou a própria esposa, Patrícia Pereira, de 41 anos, dentro de casa, na Quadra 3 do Setor Leste do Gama. Patrícia é a quarta vítima em uma semana e a 20ª somente neste ano. No primeiro semestre, o Distrito Federal já superou em número de assassinatos de mulheres, por questão de gênero, todo o ano passado.

O crime ocorreu por volta de 19h, na presença do filho do casal, um menino de 14 anos, e de uma jovem de 22, fruto de um outro relacionamento da vítima. Os dois assustados e aos gritos correram para rua pedindo ajuda e se abrigaram na casa da vizinha ao lado.

O barulho do único disparo foi ouvido por vizinhos. Segundo o Corpo de Bombeiros, a vítima foi alvejada na região do pescoço, além de ter perdido muito sangue. A reportagem apurou que Patrícia era enfermeira do Hospital de Base e Bruno, serralheiro autônomo.

De acordo com a filha da vítima, Chaiane Pereira, Bruno sempre teve um perfil autoritário, além de um ciúme doentio. “Eram só brigas, traições. Eu nunca fui a favor da relação, porque ele sempre bateu na minha mãe e usava o meu irmão como uma proteção. Eu cheguei do estágio, a gente brincou, riu. Quando ele chegou, o clima ficou tenso e ele começou a discutir com a minha mãe. E matou”, disse a filha, ao Correio.

Ainda segundo ela, o casal já havia se separado diversas vezes, mas Patrícia sempre voltava por conta do filho adolescente e pelo apoio financeiro que tinha do parceiro.

Após cometer o crime, Bruno fugiu. Uma das vizinhas, que preferiu não ser identificada, contou que viu o suspeito abrir o portão da casa e fugir em uma Ranger Prata, após ter atacado Patrícia. “Nunca esperamos que isso acontecesse. Parecia ser uma família tranquila”, explicou.

O caso é investigado pela 14ª Delegacia de Polícia (Gama), tratado como feminicídio pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF). Com isso, o Distrito Federal totaliza 20 dessa natureza em 2023, sendo o quarto apenas nesta semana. Até o fechamento desta matéria, o suspeito não foi preso.

Sequência macabra

Cerca de 24 horas antes de Patrícia ser morta pelo marido, Cláudia Barbosa Melo, de 40 anos, se tornou a terceira vítima de feminicídio, em menos de uma semana, e a 19ª apenas em 2023. Ela foi assassinada pelo namorado João Paulo Sousa França, 26 anos, com uma facada pelas costas. 

O crime ocorreu na Quadra 508 do Recanto das Emas, na madrugada da última terça-feira (27/6). Na 12ª Delegacia de Polícia (Taguatinga Centro), o criminoso ficou calado perante aos agentes, declarando que apenas falaria para à Justiça. Segundo o delegado-chefe da delegacia, Josué Pinheiro, o casal havia ingerido bebida alcoólica. João não tem passagens pela polícia e eles teriam discutido no bar. "Estavam bastante embriagados e começaram a discutir pelo fato da vítima querer ir embora e o autor não. Eles ingeriram muita bebida alcóolica", explicou.

De acordo com a Polícia Militar do Distrito Federal (PCDF), o golpe da faca causou lesões na medula cervical, resultando na paralisia dos membros inferiores. Após cometer o crime, o assassino fugiu da cena do crime, mas foi preso na tarde de quarta, ao tentar entrar no hospital onde a vítima estava internada, no Hospital Regional de Taguatinga (HRT).

A direção do hospital informou à polícia que João estava tentando entrar no hospital pela entrada principal e pelo segundo acesso do prédio. Ele foi detido em frente ao Pronto-Socorro do HRT. A vítima não resistiu e veio a falecer anteontem. O Correio não conseguiu localizar os parentes de Cláudia.

Segurança

A Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF) informou que é uma das prioridades da atual gestão o combate à violência contra a mulher. A pasta detalhou que existem mecanismos de proteção às vítimas, como o serviço de proteção à mulher.

O mecanismo é oferecido às vítimas de violência doméstica com medidas protetivas em vigor. Criado em 2021, monitora, em tempo real, 48 mulheres e 52 homens. Todo o monitoramento ocorre no Centro Integrado de Operações de Brasília, coordenado pela Diretoria de Monitoramento de Pessoas Protegidas (DMPP).

"O serviço de proteção permite ainda ligações a números pré-cadastrados, mensagens prontas de texto, gravação de imagens, registro fotográfico e captação de áudio e vídeo do ambiente. O período de monitoramento é estipulado em juízo. Após o término do lapso temporal definido, a vítima é geralmente encaminhada pelo judiciário para o atendimento prioritário do programa Viva Flor", explicou a pasta.

A pasta contou que o Viva Flor, disponível desde 2017, já atendeu 370 pessoas, resultando em nove prisões em flagrante realizadas por descumprimento de medidas. Nenhuma mulher que utilizou o Viva Flor teve a integridade física violada pelos ex-companheiros.

Além desses programas oferecido às vítimas no momento em que a medida é aprovada pelo Justiça, a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) oferece atendimento por meio Programa de Prevenção Orientada à Violência Doméstica (Provid). Apenas em 2022, 19.383 visitas foram realizadas pelos policiais a famílias.

Já a PCDF conta com delegacias especiais de atendimento à mulher (Deam 1 e 2), além de possibilitar que as vítimas registrem boletim de ocorrência, por meio da Maria da Penha Online, além de representar contra o autor da violência, enviar provas com fotos e vídeos, requerer a acolhimento, entre outros. Em 2022, foram contabilizados 889 flagrantes relacionados à Lei Maria da Penha. 

A reportagem selecionou mecanismos onde mulheres vítimas de violência podem pedir ajuda, além das forças de segurança. Criado pelo governo federal, o botão de pânico é um dispositivo de emergência que, via QR code, leva a usuária a um formulário do projeto Justiceiras. Para ler o código, basta apontar a câmera do celular e clicar no link que aparecerá na tela do aparelho. Após o preenchimento dos dados requisitados, a vítima será direcionada à uma equipe voluntária, profissional e multidisciplinar.

O aplicativo Todas por Uma é um tipo de inteligência artificial. Ao entrar no app, surge uma tela com uma propaganda, de modo que esconde a real função do aplicativo. Quando simplesmente balançar o celular ou clicar no botão "cupons", no canto superior esquerdo da tela, um pedido de socorro será enviado aos intitulados "anjos" da vítima, pessoas de confiança que concordaram em serem contatadas diante de situações de emergência. Assim, os anjos recebem a localização da amiga ou parente em perigo. A solicitação é feita de uma maneira discreta.

Já o aplicativo IsaRobô oferece orientações gratuitas sobre o que fazer em casos de violência doméstica ou de maneira on-line. O app foi desenvolvido com o apoio do Facebook e do Google pelo Conexões que Salvam, da ONG Think Olga, e pelo Mapa do Acolhimento, do Nossas.org, projetos que apoiam mulheres que sofrem ou sofreram violência de gênero na internet. A ferramenta está disponível para todos que precisam de acolhimento e de informações sobre violência contra as mulheres na internet e sobre como tornar o meio tecnológico um ambiente mais seguro.

Ligue 180

Coordenado pelo governo federal, o Ligue 180 é um serviço de utilidade pública essencial para o enfrentamento à violência contra a mulher. Além de receber denúncias de violações contra as mulheres, a central encaminha o conteúdo dos relatos aos órgãos competentes e monitora o andamento dos processos. O serviço também tem a atribuição de orientar mulheres em situação de violência, direcionando-as para os serviços especializados da rede de atendimento.

 


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