Investigação

Instrutor e amigo de "04" vira réu após entrar na mira do MP e da PCDF

Ex-empresário de Jair Renan, Maciel Carvalho irá responder por mais 4 crimes, sob a suspeita de integrar uma associação criminosa que causou prejuízo de quase R$ 100 milhões aos cofres do DF

Maciel Carvalho é réu em mais um processo, por crimes como lavagem de dinheiro e uso de documento falso -  (crédito:  Instagram/Reprodução)
Maciel Carvalho é réu em mais um processo, por crimes como lavagem de dinheiro e uso de documento falso - (crédito: Instagram/Reprodução)
postado em 05/12/2023 19:12

Além de estar na mira de investigações por lavagem de dinheiro, comércio ilegal de armas de fogo e falsificação de documentos, o influenciador digital Maciel de Carvalho, ex-empresário do filho “04” do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Jair Renan, é alvo de uma investigação que culminou no prejuízo de quase R$ 100 milhões aos cofres do Distrito Federal, com empresas de fachadas.

É o que aponta o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), em denúncia oferecida contra o empresário, que também é instrutor de tiro e que está preso desde agosto deste ano, no Complexo Penitenciário da Papuda, após ser um dos alvos da Operação Nexum, deflagrada pela Delegacia de Repressão aos Crimes Contra a Ordem Tributária (DOT/Decor) da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF). Na investigação, o ex-empresário do “04” é alvo de uma denúncia que aponta crimes cometidos por Maciel — nenhum dos crimes apontados tem envolvimento com o filho do ex-presidente.

Segundo o MP, Maciel integrou uma organização criminosa que envolveu a criação de seis empresas de fachadas a fim de emitir notas fiscais para movimentação de mercadorias entre estados. As empresas intermediavam a compra, venda a transporte de grãos — farinhas, cereais, entre outros — com ganho fiscal, em função da supressão dos tributos devidos ao Distrito Federal e do repasse do crédito fiscal ao comprador da mercadoria.

Nesse cenário, é como se tivesse pago o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na venda da mercadoria no Distrito Federal, o que aumentou o ganho quando a mesma era feita entre os estados que têm alíquota interestadual maior do que a do DF — diferença de 5% no volume total.

Toda a trama, segundo investigação tocada pela Decor em dois inquéritos instaurados em 2022, mostram que o esquema durou 23 anos — de setembro de 2005 até o início de maio de 2023. A organização era dividida entre dois núcleos: o familiar e o operacional. De acordo com os promotores, os investigados do núcleo familiar, como o nome diz, eram de pessoas da mesma família. A quadrilha, segundo o MP, se articulavam com os operadores para a constituição de sociedades fraudulentas, como a criação de contas e a operacionalização delas por meio de procuração, a fim de perpetuar os ilícitos tributários.

No núcleo operacional, Maciel e outros denunciados são apontados como responsáveis de fornecer documentos falsificados para constituição e alteração das empresas criadas na Junta Comercial e na Receita do Distrito Federal, atuando por meio de procurações em nome das entidades, abrindo contas bancárias dessas empresas, numa espécie de sócios formais que, para o MP, são "laranjas".

De acordo com a investigação da PCDF, o grupo era chefiado pelo empresário Carlos Martins, conhecido como “Gordo”. O empresário comandava parte do esquema, que contava com a participação dele juntamente com a ex-esposa e filhos, os quais são donos de uma centena de veículos de transporte de grãos que, segundo o MP, foram adquiridos por meio do esquema criminoso com a emissão de notas fiscais de empresas de fachada.

Na área operacional, Maciel exercia a função de abrir contas por meio de documentos falsos, para que os beneficiários das notas fiscais pudessem movimentá-las, realizando pagamentos e transferências sem que fossem identificados.

Além de abrir contas, Maciel, considerado “especialista” na área, chegou a abrir uma empresa, em março de 2010, como parte do esquema. Segundo a denúncia do MP, a empresa levava o nome de Macieira Comercial de Alimentos. Maciel e outros dois denunciados, segundo o MP, suprimiram o ICMS devido aos cofres do Distrito Federal, com o intuito de fraudar a fiscalização tributária, omitindo operações em livros fiscais, exigidos por lei.

De julho a dezembro daquele ano, além de janeiro a fevereiro de 2011, por 8 vezes, o trio deixou de recolher o ICMS referente à operação não escriturada nos próprios livros, cujo documento foi emitido, suprimindo ICMS no valor de R$ 4,1 milhões. As condutas praticadas por Maciel nessa empresa, que leva o nome do próprio empresário, causaram prejuízos aos cofres públicos do DF. Os dados corrigidos e atualizados, de junho desse ano, apontam que esse valor hoje é de R$ 25,8 milhões.

As condutas do digital influencer, na Macieira Comercial, continuaram a ocorrer após Maciel passar a empresa para frente. Em junho de 2010, Maciel repassou a responsabilidade à sociedade para o nome de outras duas pessoas. A investigação da polícia constatou que os novos “responsáveis” eram um morador de rua e um homem falecido, de Chapada Gaúcha, em 2001.

Criação de CPFs

Conforme a reportagem apurou, uma prática considerada comum pelo ex-empresário de Jair Renan é a criação de CPFs, já que o mesmo possui nove CPFs e dois nomes diferentes para ocultar a coleção de infrações criminais que possui — o que culminou, também, em várias operações em que teve Maciel como alvo. A última, Nexum, que investiga falsificação de documentos, em que teve Jair Renan como um dos alvos de busca e apreensão, também levou o empresário à cadeia.

Em uma outra empresa, alvo da denúncia do MP, foi constatado que Maciel e Rudimar Tessaro — considerado o líder da ala operacional do esquema —, abriram uma empresa fantasma, chamada Ouro Negro Comercial, no nome de “laranjas”. Um dos supostos sócios nasceu em 1966, mas teve um novo CPF em 2009, ou seja, 43 anos após o nascimento.

Já o outro suposto sócio nasceu em 1968, mas a data de inscrição do documento ocorreu somente em 2008. Ou seja, o CPF foi criado mais de 40 anos depois do seu nascimento. Nessa empresa, o contador do esquema decidiu contribuir com as investigações. 

Mesmo com a empresa em nome de laranjas, a denúncia do MP cita que a Tessaro obtinha uma procuração lhe dando amplos poderes. Para os promotores, além dele, Maciel também foi responsável pela inserção de um documento falso para abrir a empresa.

“Maciel Alves de Carvalho e Rudimar Tessaro,responsáveis diretos pelo uso da documentação falsa da empresa Ouro Negro Comercial, agiram com o único propósito de ocultar as responsabilidades inerentes à função de administrador de fato da empresa, lesando interesses do Fisco Distrital e da Receita do Distrito Federal”, cita a denúncia.

Réu

O juiz da 8ª Vara Criminal de Brasília, Osvaldo Tovani, ao analisar a denúncia do MP, aceitou as justificativas apresentadas e tornou réu Maciel e outras 11 pessoas. O ex-empresário responderá pelos crimes de integrar organização criminosa; uso de documento falso; crime contra a ordem tributária; e lavagem de dinheiro. A decisão foi publicada na segunda-feira (1°/12).

A reportagem buscou a defesa do empresário, que respondeu que são fatos que supostamente ocorreram há 13 anos atrás. “Assim que a defesa tomar ciência, demonstrará não só a prescrição como sua inocência”, disse o advogado Pedrinho Villard.

O Correio procurou e localizou a defesa de outros três réus. Um preferiu não se manifestar, enquanto os outros dois não responderam as perguntas enviadas. Os advogados dos outros réus não foram encontrados.

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