NATUREZA

Temperaturas extremas causaram impactos sem precedentes nos oceanos

As temperaturas extremas causam impactos sem precedentes nos biomas de água salgada, mostra relatório internacional

Paloma Oliveto
postado em 23/09/2021 06:00
 (crédito: Ekaterina Anisimova/AFP)
(crédito: Ekaterina Anisimova/AFP)

Se o relatório sobre mudanças climáticas divulgado em agosto pela Organização das Nações Unidas (ONU) trouxe dados alarmantes sobre as consequências do aquecimento no planeta, um estudo não menos preocupante revelou, ontem, que os oceanos sofrem tantos impactos negativos quanto a atmosfera. Na avaliação dos 120 especialistas de mais de 30 instituições europeias que elaboraram o Copernicus Ocean State Report, os impactos verificados nas águas salgadas, que cobrem três terços da superfície da Terra, não encontram precedentes históricos.

O relatório, publicado no Journal of Operational Oceanography e presidido pela Mercator Ocean International, foi divulgado a pouco mais de dois meses da conferência do clima, a COP26, quando líderes mundiais serão chamados a adotar políticas de enfrentamento e mitigação das mudanças climáticas. Segundo o documento, o aquecimento do oceano Ártico — provocado por uma atmosfera cada vez mais quente — está contribuindo para cerca de 4% de toda a elevação da temperatura global oceânica.

Os níveis de degelo ártico registrados nos últimos dois anos atingiram patamares recordes, enquanto por década, entre 1979 e 2020, caíram quase 13%. Os cientistas apontaram que uma redução de quase 90% da espessura média do gelo marinho já foi testemunhada no Mar de Barents — uma pequena parte do Ártico —, o que levou à diminuição na importação de gelo marinho da bacia polar, fenômeno importante para resfriar a temperatura oceânica.

No Mar do Norte, no oceano Atlântico, entre a Noruega e a Dinamarca, a variabilidade extrema de períodos de frio e ondas de calor marinha foi associada a mudanças relatadas nas capturas de linguado, lagosta europeia, robalo, salmonete e caranguejos comestíveis, diz o documento. Já no Mar Mediterrâneo, ocorreram quatro inundações recordes consecutivas em Veneza (novembro de 2019), além de terem sido registradas alturas de ondas acima da média na porção sul.

“Essa variabilidade em curto prazo nas temperaturas do oceano, na forma de ondas de calor ou períodos de frio, durando de dias a algumas semanas, é uma questão de preocupação crescente no ambiente marinho porque pode afetar muitos aspectos desses ecossistemas”, explica Sarah Wakelin, um dos coautores do relatório e pesquisadora do Centro Nacional de Oceanografia (CNO), no Reino Unido.

“O documento destaca como as temperaturas extremas no Mar do Norte causaram uma mudança nas capturas de espécies comercialmente importantes de peixes e crustáceos. Aspectos mais amplos, como migração para águas mais quentes ou mais frias, mudanças na desova e no crescimento, bem como mortalidade e mudanças comportamentais significam que, em resposta aos extremos de temperatura, os desembarques pesqueiros de algumas espécies aumentam, enquanto de outras serão reduzidos.”

Monitoramento

Os cientistas documentaram que, globalmente, a temperatura média do mar subiu a uma taxa de 0,015 grau Celsius por ano, de 1993 a 2019, e os níveis de oxigênio (estoque de O2) no Mar Negro caíram a uma taxa de -0,16mol/ m2 por ano, entre 1955 e 2019. Em nota, a presidente do relatório, Darina von Schuckmann, da Mercator Ocean International, destacou a necessidade urgente de medidas de monitoramento e proteção.

“Mudanças climáticas, poluição e superexploração colocaram pressões sem precedentes sobre o oceano, exigindo, com urgência, medidas sustentáveis de governança, adaptação e gestão, a fim de garantir os vários papéis de suporte de vida que esse ecossistema oferece para o bem-estar humano”, disse. “Considerar o oceano como um fator fundamental no sistema terrestre e abraçar a sua natureza multidimensional e interconectada é a base para um futuro sustentável.”

Nas 185 páginas do relatório, que investiga as condições e as variações em curso no oceano global e nos mares europeus, os cientistas apresentam diversos outros cenários preocupantes, como migrações de peixes-leões invasivos para o Mar Báltico, precipitações e secas extremas no Dipolo do Oceano Índico, aumento incomum do nível do mar no Mar Báltico e condições extremas de ondas no Golfo de Bótnia.

“Como o recentemente publicado IPCC (painel de especialistas em mudanças climáticas da ONU), o Ocean State Report indica que as taxas anuais de aumento médio do nível do mar global ultrapassaram os 3mm por ano, o que é maior do que o observado no século 20 e sugere uma aceleração nas taxas de aumento do nível do mar”, diz Angela Hibbert, chefe de Nível do Mar e Clima Oceânico do CNO.

Segundo a especialista, quando as marés altas e as grandes ondas de tempestade coincidem, é mais provável que resultem em inundações costeiras prejudiciais, especialmente se o nível médio do oceano também estiver elevado. “O aquecimento crescente e a perda de massa de gelo das geleiras e mantos de gelo na Groenlândia e na Antártica também farão com que esses aumentos continuem. Portanto, eventos como o Venetian ‘Acqua Alta’ destacado nesse relatório (as inundações em Veneza em 2019) devem se tornar cada vez mais comuns, à medida que o nível do mar continua a subir.”

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Poluição do ar causa 7 milhões de mortes prematuras, diz OMS

 (crédito: Atta Kenare/AFP - 13/1/21)
crédito: Atta Kenare/AFP - 13/1/21


A Organização Mundial da Saúde (OMS) atualizou, ontem, os limites da poluição do ar, ressaltando que essa é uma das maiores ameaças à saúde humana, causadora de 7 milhões de mortes prematuras anualmente. Em um documento apresentado durante uma coletiva de imprensa pelo diretor-geral da agência, Tedros Adhanom Ghebreyesus, as Nações Unidas se dirigem aos maiores poluidores do mundo pedindo que protejam o meio ambiente para “reduzir o sofrimento e salvar vidas”.

“Não há nada mais essencial para a vida do que o ar. No entanto, por causa da poluição atmosférica, a simples ação de respirar provoca 7 milhões de mortes por ano, principalmente por doenças não transmissíveis”, disse Ghebreyesus. “Novos dados mostram como a poluição atmosférica afeta todas as partes do corpo, do cérebro até o bebê em crescimento no ventre materno, e em concentrações ainda mais baixas que as observadas anteriormente”, acrescentou.

A OMS reduziu os limites tolerados para poluentes considerados clássicos: partículas em suspensão, ozônio, dióxido de nitrogênio, dióxido de enxofre e monóxido de carbono. As novas regras não são de cumprimento obrigatório, mas fornecem aos países uma estrutura para proteger melhor suas populações.

Segundo Hans Henri Kluge, diretor da OMS para a Europa, “o ar puro deve ser um direito humano fundamental e uma condição necessária para a saúde e a produtividade das sociedades”. Em um comunicado, ele lamentou que “embora a qualidade do ar tenha melhorado um pouco nas últimas três décadas, milhões de pessoas continuam a morrer prematuramente. Muitas vezes, em populações mais vulneráveis ou marginalizadas”.

Da asma ao AVC

Com as mudanças climáticas, a poluição do ar é, segundo as Nações Unidas, uma das principais ameaças ambientais à saúde. No caso das crianças, pode impedir o desenvolvimento adequado dos pulmões, causar infecções respiratórias e agravar a asma. Em adultos, as mortes prematuras relacionadas à poluição do ar estão associadas a doenças cardíacas e acidentes vasculares. No documento, a OMS afirma que pesquisas recentes mostram que esses poluentes também podem levar ao diabetes e a doenças neurodegenerativas.

Em 2019, mais de 90% da população mundial vivia em regiões em que a poluição ultrapassava os níveis estabelecidos pela OMS em 2005 com relação à exposição prolongada a partículas finas PM2,5 (cujo diâmetro é inferior a 2,5 micrômetros). Naquele ano, as regiões do Sudeste Asiático e do Mediterrâneo Oriental eram os locais do mundo com as maiores concentrações anuais de PM2,5 em relação ao número de habitantes. Provenientes essencialmente da queima de combustíveis fósseis, essas micropartículas podem penetrar profundamente nos pulmões e também no sistema circulatório.

 

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