Hipertensão

Hipertensão: metade dos pacientes não sabe que tem a doença, diz OMS

Relatório inédito mostra que aumentar o número de pacientes tratados evitaria 76 milhões de mortes até 2050

Aferições na Indonésia: em países de renda média e baixa, mais de 75% dos adultos são hipertensos, indica o estudo -  (crédito: JUNI KRISWANTO)
Aferições na Indonésia: em países de renda média e baixa, mais de 75% dos adultos são hipertensos, indica o estudo - (crédito: JUNI KRISWANTO)
postado em 20/09/2023 06:00

No primeiro relatório sobre o impacto da hipertensão arterial, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que quase metade dos pacientes desconhece sofrer da condição potencialmente letal. Sem tratamento adequado, o problema pode, entre outras coisas, levar a acidente vascular cerebral (AVC), infarto, insuficiência cardíaca e doença renal crônica. O trabalho também revela que mais de três quartos dos adultos hipertensos vivem em países de renda média e baixa.

Divulgado no dia da abertura da 78ª Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), o documento mostra que, no Brasil, há mais pacientes que a média global, que varia entre 30% e 40%. Aqui, 42% das pessoas entre 30 e 79 anos têm hipertensão. Dessas, 67% foram diagnosticadas, 62% recebem tratamento e 33% estão com a condição sob controle. Desde os anos 2000, o país registra queda nos casos descontrolados, embora o progresso não tenha sido suficiente, alerta o relatório. Em um cenário ideal, 365 mil mortes poderiam ser evitadas até 2040.

A OMS nota que o Brasil não tem uma meta nacional de controle da hipertensão, mas reconhece os esforços do país no combate ao consumo excessivo de sal e na produção de estatísticas sobre o problema. No país, o principal fator de risco é o sedentarismo, com 47% da população acima dos 18 anos inativa, seguido por obesidade, que afeta 22% na mesma faixa etária.

Segundo a OMS, o número de pessoas vivendo com hipertensão — pressão arterial igual/superior a 140/90 mmHg ou que tomam medicamentos para a condição — duplicou entre 1990 e 2019, passando de 650 milhões para 1,3 bilhão. "A idade avançada e a genética podem aumentar o risco de hipertensão, mas fatores de risco modificáveis, como uma dieta rica em sal, não ser fisicamente ativo e beber muito álcool, também podem aumentar o risco", destaca o relatório.

Mudanças no estilo de vida, como seguir uma dieta mais saudável e ser mais ativo, podem ajudar a reduzir a pressão arterial, destaca o texto. Parar de fumar também é uma medida importante, ressalta a médica intensivista Caroline Reigada. Segundo ela, todas as vezes em que se inala fumaça de cigarro, a pressão arterial e a frequência cardíaca aumentam. "Seu coração tem que bater mais forte e mais rápido do que o normal. Os níveis de colesterol também ficam fora de controle, já que a fumaça do cigarro aumenta os níveis de LDL, ou o colesterol 'ruim', e de uma gordura no sangue chamada triglicerídeos. Isso faz com que uma placa de gordura se acumule em suas artérias, aumentando o risco de ataques cardíacos", explica.

 Membro da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (Sbot), o médico Marcos Cortelazo afirma que a pressão alta também está associada à perda óssea, uma relação evidenciada por um estudo da Associação Norte-Americana do Coração. Na pesquisa, os cientistas descobriram que as inflamações provocadas pela hipertensão em animais levavam à osteoporose. "Quando comparados aos camundongos jovens sem hipertensão, aqueles com pressão alta induzida tiveram uma redução significativa de 24% na fração de volume ósseo e uma redução de 34% na força de falha estimada, que é a capacidade dos ossos de suportar diferentes tipos de força", conta o médico. "Em humanos, isso pode significar que devemos rastrear a osteoporose em pessoas com pressão alta."

Cuidados primários

O documento da OMS destaca que "a prevenção, a detecção precoce e a gestão eficaz da hipertensão estão entre as intervenções com melhor relação custo-eficácia nos cuidados de saúde e devem ser priorizadas ao nível dos cuidados primários". De acordo com o organismo da ONU, os benefícios econômicos dos melhores programas nacionais de tratamento da condição superam os custos em cerca de 18 vezes.

Um aumento no número de pacientes efetivamente tratados, diz o relatório, poderia prevenir 76 milhões de mortes, 120 milhões de AVCs, 79 milhões de ataques cardíacos e 17 milhões de casos de insuficiência cardíaca entre agora e 2050. "A hipertensão pode ser controlada eficazmente com regimes de medicação simples e de baixo custo. No entanto, apenas uma em cada cinco pessoas com hipertensão a tem sob controle", disse, em uma coletiva de imprensa on-line, Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS.

A cardiologista Lilian Cavalheiro, do Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim, em São Paulo, afirma que, além dos hábitos saudáveis, medicamentos são imprescindíveis em alguns casos. "Para ter uma boa qualidade de vida com o diagnóstico de hipertensão arterial, é preciso cultivar hábitos saudáveis, realizar acompanhamento médico e utilizar corretamente a medicação. O tratamento medicamentoso é fundamental para o controle da doença, principalmente por ela ser uma das causas de outras comorbidades", esclarece.

Palavra de especialista: Primeiro sinal pode ser grave

 "Como a hipertensão é silenciosa, nós temos a tendência de negligenciar o cuidado, adiando ou mesmo não dando importância por não acreditar que aquilo pode resultar em um problema. Infelizmente, muitas vezes, a primeira manifestação da hipertensão já pode ser uma manifestação crítica, como infarto, AVC, derrame cerebral ou dissecção de aorta. O relatório aponta que o número de pessoas que vivem com hipertensão dobrou entre os anos da década de 1990, ou seja, o fim do século passado, até agora, passando de aproximadamente 650 milhões de hipertensos para 1,3 bilhão. Estima-se como causa desse aumento brutal, principalmente, as mudanças de comportamento da humanidade nas últimas décadas. E aí, principalmente, chamamos atenção ao estresse da vida urbana; ao excesso de ingestão de sal, inclusive de sal presente em alimentos industrializados, em fast food e embutido, pizza, sanduíche etc.; ao consumo de álcool, de cigarro e, mais recentemente, do cigarro eletrônico; ao sedentarismo ou da falta de exercício físico; e, por fim, à outra pandemia que nos acomete, que é a pandemia da obesidade."

Maurício Prudente, cardiologista, responsável técnico do hospital Encore e do Instituto de Neurologia de Goiânia


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