Os modelos que tentaram prever pandemias até hoje falharam — e a ciência precisa rever as estratégias. A avaliação é da pesquisadora Felicia Keesing, professora do Bard College, nos Estados Unidos, que defende uma abordagem pouco considerada nas políticas de saúde pública: a conservação e a restauração da biodiversidade como forma de prevenir a disseminação de novas doenças.
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Keesing apresentou as ideias durante o primeiro dia da Escola Interdisciplinar FAPESP: Ciências Exatas e Naturais, Engenharia e Medicina em São Paulo. Segundo ela, 75% das doenças infecciosas emergentes em humanos têm origem em animais, o que mostra que a relação entre espécies pode ser decisiva para o surgimento de pandemias.
“Precisamos ampliar nossa busca para além de alguns poucos lugares como potenciais iniciadores de pandemias, de apenas vírus como patógenos que podem causá-las e de alguns poucos animais como os mais prováveis reservatórios”, afirmou.
Para a pesquisadora, é necessário repensar a forma como as previsões são feitas e testar modelos anteriores que não funcionaram, entendendo suas falhas. Além disso, ela alerta para a necessidade de olhar além dos coronavírus, que dominaram o foco científico após a COVID-19.
Keesing acredita que o próximo grande patógeno global pode ser uma bactéria resistente aos antibióticos atuais. “Temos nos concentrado em vírus, mas a ameaça das bactérias está crescendo e pode ser ainda mais perigosa”, disse.
Biodiversidade como escudo natural
Um ponto central da fala da pesquisadora foi o papel dos animais na transmissão de doenças. De acordo com Keesing, muitos microrganismos que causam enfermidades não têm apenas um hospedeiro, o que torna essencial entender quais espécies realmente atuam como reservatórios.
Ela questiona, por exemplo, a supervalorização de alguns grupos, como os morcegos, e a subestimação de outros, como os roedores. Em seus estudos no Quênia, a cientista observou que áreas que perderam grandes mamíferos, como girafas e leões, apresentaram aumento na população de ratos e serpentes venenosas — animais mais propensos a carregar patógenos perigosos para humanos.
- Leia também: Pacto contra pandemias precisa avançar
Keesing também destacou que os animais mais abundantes e menos ameaçados de extinção são os que mais transmitem doenças. Isso ocorre por características biológicas, como reprodução acelerada e alta adaptabilidade, o oposto de espécies ameaçadas, como rinocerontes. Para ela, proteger ecossistemas e restaurar áreas degradadas pode ser uma ferramenta poderosa de prevenção. “A conservação da natureza precisa ser vista como parte da estratégia global de saúde”, defendeu.
Além disso, a pesquisadora reforça que essa visão deve vir acompanhada de avanços na ciência, como o desenvolvimento de antivirais e antibacterianos de amplo espectro, vacinas eficazes e políticas públicas robustas.
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