Delegado experiente da Polícia Federal, Sandro Torres Avelar foi escolhido por colegas de todos os estados o porta-voz das demandas no combate à criminalidade. Foi eleito presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Segurança (Consesp), que tem como missão representar todas as unidades da federação no diálogo com o Ministério da Justiça e Segurança Pública na formulação de políticas em prol de interesses comuns. O enfrentamento ao crime organizado, como diz Avelar, chefe da pasta da segurança no Distrito Federal, é uma das principais preocupações. O primeiro tema a ser debatido com o governo federal está relacionado à liberação de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública para projetos nos estados que, muitas vezes, ficam retidos por conta da burocracia, enquanto os crimes se sofisticam e avançam.
Qual é o principal foco de sua gestão como presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Segurança Pública?
Ser um interlocutor para representar os demais secretários de Segurança Pública perante o governo federal, até porque o conselho é órgão consultivo do Ministério da Justiça. Precisamos identificar os principais pontos de preocupação. Também tentar ajudar aqueles que têm os seus problemas peculiares, que são questões locais, mas trazendo essa discussão para o âmbito federal.
Facilita a integração?
Sim. Essa integração é extremamente necessária. E temos o Fundo de Segurança, para subsidiar as ações dos estados. O diálogo pode facilitar esses convênios. Às vezes, os recursos existem, mas não são liberados diante da dificuldade na execução dos recursos e na prestação de contas. E é preciso que a gente facilite isso. O governo federal tem mais de R$ 3 bilhões à disposição dos governos estaduais. Já estamos em contato com o Ministério da Justiça que demonstrou essa preocupação e interesse em melhorar essa interlocução.
O crime organizado parece estar totalmente infiltrado nas instituições, como acontece no Rio de Janeiro e também na Amazônia. É um problema que se repete em todos os estados?
É problema que se repete em todos os estados. Pode ser que, com distinção de graduações, mas todos os estados hoje se preocupam com o crime organizado. Eventualmente você tem grupos diferentes, predominando em regiões diferentes, mas não há nenhum estado hoje que não se preocupe com o crime organizado.
O crime organizado está avançando muito? O Estado está perdendo a força no combate diante do crescimento dessas organizações, com tecnologia, recursos e infiltração no Poder Público? O Estado dá conta?
O Estado dá conta, sim. A gente tem tido respostas muito positivas no combate ao crime organizado. Agora, é preciso que os esforços sejam somados. É preciso que haja um grande pacto, com os Poderes Legislativo e Judiciário também, para que as polícias possam trabalhar. A gente tem que se ajudar porque o crime organizado tem uma capilaridade muito grande. Atua em camadas. O governo federal tem que liderar esse processo.
A segurança muitas vezes é tratada como um problema dos estados, mas hoje sabe-se que o crime não tem fronteiras...
Acredito muito na necessidade de uma política nacional. Nós queremos, nós secretários de segurança pública, essa integração. É preciso que o governo federal nos ajude na execução dos recursos.
O que o senhor acha de mudar as audiências de custódia para permitir a decretação da prisão preventiva mesmo sem condenação, quando houver provas de reiterada prática de crimes por um cidadão?
Acho importantíssimo. Basta ver os índices: a imensa maioria dos crimes se dá por pessoas que têm antecedentes criminais. Às vezes, ainda não tiveram condenação, mas têm antecedentes vastos, inclusive com os crimes mais graves, como homicídio, latrocínio, feminicídio. Você vê que na maior parte das vezes, a pessoa que comete aquele crime tem diversas passagens, e muitas vezes nunca cumpriu um dia de pena.
Tornar homicídio qualificado o praticado a mando de uma facção criminosa, portanto, com penas mais duras é uma boa ideia?
Também acho importante. É uma medida também que visa a combater essas organizações que, muitas vezes, emanam as suas ordens de dentro dos presídios. É uma maneira de tentar enfraquecer essas organizações criminosas aumentando a pena desses crimes graves.
Qual é a sua opinião sobre o projeto aprovado pelo Congresso, que está nas mãos do presidente Lula para sancionar ou vetar, sobre as chamadas saidinhas?
A saidinha, do jeito que vem sendo feita hoje, é indevida. Este tipo de benefício, que dentro do sistema penitenciário se chama regalia — mas não com sentido pejorativo — faz com que o sistema penitenciário fique mais calmo. Quando você sinaliza para o preso que se ele tiver bom comportamento vai fazer jus a algumas regalias, você está tentando manter o sistema em paz. É um sistema em que há reconhecidamente uma superpopulação. Mas por outro lado você, por falta de possibilidade de se fazer um teste criminológico, como a lei prevê, libera todo mundo sem nenhum tipo de controle? Isso aí é entreguismo. Você deixa de lutar, para solucionar uma situação e permitir o benefício para quem realmente merece. E coloca todo o sistema em colapso, coloca a população em risco... O número de assaltos e de outros crimes mais graves praticados pela população carcerária que está fazendo jus às saidinhas é enorme.
O número de pessoas que não retornam ou praticam crimes é proporcionalmente alto?
Quando se fala só 3%, isso representa milhares de presos. É um número elevado.
O STF discute qual é a quantidade de maconha permitida para consumo pessoal. Esse é um debate que deve ser feito pela Justiça ou pelo Congresso?
Esse é um tema do Legislativo. No que diz respeito ao tráfico ou ao consumo, temos a chamada teoria finalista da ação em que vale muito a intenção. É preciso avaliar se a intenção é para tráfico ou para consumo. Criar uma regra a respeito de quantidades é passo importante. Mas não deve ser o único porque se isso for criado como o único critério para se se definir você está colocando a perder o princípio finalista da ação. Não sendo assim alguém pode fazer diversas viagens transportando pequenas quantidades de droga com a proteção legal. Não é isso que resolve.
Qual que é a sua opinião sobre o desfecho do caso Marielle, envolvendo um delegado que foi chefe da Polícia Civil, um deputado e um conselheiro do Tribunal de Contas do Rio?
Lamento muitíssimo que alguém na posição que aquele delegado estava ocupando à época pudesse estar participando de crime com essa gravidade e ainda ajudando a acobertar. Mas temos que parabenizar a Polícia Federal que finalmente colocou tudo em pratos limpos. Esse crime estava incomodando a todos nós.
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